Ética da igualdade e meritocracia

Meritocracia, um termo pouco usado numa conversa entre amigos, mas cujo conceito faz parte da ideologia das pessoas que conduzem o pensamento da sociedade, estimuladas pela grande mídia. A meritocracia é um sistema de premiação baseado nos méritos pessoais. A origem etimológica: latim meritum = “mérito” + sufixo grego cracía = “poder” = “O poder do mérito”.

Nada mais positivista, capitalista e consumista acreditar que só o mérito basta para justificar o que se pode possuir e comprar, a partir da sua posição econômica e social. Construir uma sociedade com esta visão desconsidera que todos são iguais respeitadas as suas diferenças. As oportunidades e condições de vida não são iguais na alimentação, educação, saúde, lazer. O mérito, portanto, não é o único elemento de análise. Não se pode negar o respeito à dignidade do ser humano, seja esta pessoa de qual origem e caminhada. A responsabilidade deve ser compartilhada com a sociedade, com a comunidade inteira.

O poder e o direito à subsistência não podem ficar nas mãos dos privilegiados, deixando à beira do caminho os demais, que, por questões históricas, não tiveram as mesmas oportunidades e foram barrados pela falta de condições. Se sente ainda presentes a “casa-grande” e a “senzala”, realidades que pesam na sociedade, deixando desigual a disputa sócio/econômica/cultural, entre o filho do “sinhô” e o filho do escravo.  

A cultura da meritocracia, que favorece poucos pelos motivos históricos, exalta as riquezas conquistadas por jogadores de futebol e dos cantores sertanejos, que são exceção. Não se leva em conta a multidão dos que tentaram o mesmo caminho e não chegaram a lugar nenhum. “Buscar seus sonhos”, se diz, e isto é bom, prevenindo-se de como lidar com o insucesso. Nem sempre é possível conciliar a “busca pelos seus sonhos” com a vida cotidiana, o dia a dia, a sobrevivência, sobretudo para aquelas pessoas que não tiveram “berço”, que não tiveram onde morar, comer ou estudar nas escolas mais requisitadas. 

O Papa Francisco, falando a trabalhadores(as) em Gênova, na Itália, considera que “é um desvalor a tão elogiada ‘meritocracia’, que fascina muito porque usa uma palavra bonita: o ‘mérito’, mas, como a instrumentaliza e a usa de modo ideológico, ela a desnaturaliza e a perverte. A meritocracia, para além da boa-fé dos tantos que a invocam, está se tornando uma legitimação ética da desigualdade”. Francisco lembra que o pobre não pode ser considerado um desmerecido, fazendo com que a sua pobreza, que é resultado de uma injusta estrutura social e econômica, se volte ainda mais contra ele, colocando-o como culpado da desordem do sistema. Esta não é a lógica do Evangelho e também não é a lógica da vida.

O mérito deve ser avaliado conforme as oportunidades que cada um teve, para corrigir os desvios da conjuntura que prioriza exaltar o sucesso de poucos, fazendo parecer que os que vivem à margem são culpados porque não lutaram o suficiente. É desumano assim pensar.

Devemos lutar, sim, todos juntos, para que possa haver mais respeito ao ser humano, mais oportunidades com igualdade de condições para todos e com a sincera convicção de que cada pessoa tem direito a um trabalho com salário que lhe possibilite atender às suas necessidades vitais básicas e às de sua família, com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social, conforme prescreve a Constituição Federal do Brasil, em seu artigo 7º, inciso IV.

1 comentário em “Ética da igualdade e meritocracia”

Deixe um comentário