A publicação dos dados sobre a religiosidade dos brasileiros, levantados pelo Censo de 2022, mostra que o quadro religioso do Brasil está em constante evolução: um pouco menos católico, um pouco mais evangélico, menos espírita, mais voltado para religiões de origem africana, continuando sincrético, um tanto mais ateu e indiferente diante das religiões e instituições religiosas. Até aqui, não há grandes novidades.
A percepção muda um pouco quando se entra nos detalhes e se fazem comparações. Pelo Censo de 2022, os católicos seriam 56,7% dos brasileiros, enquanto eram praticamente 100% da população até a Proclamação da República (1889), quando se fez a separação entre Estado e Igreja. No entanto, é preciso observar que ser católico naquela época era questão de cidadania; a maioria dos católicos eram apenas nominais, mas não de convicção católica. E as outras religiões eram praticamente proibidas. Além disso, a população indígena nunca foi inteiramente católica, menos ainda durante o período colonial e imperial.
Outra reflexão a se fazer é sobre os “evangélicos”: os dados publicados reúnem em um único conjunto todos os chamados evangélicos, que podem pertencer a mais de mil denominações diversas. Enquanto a Igreja Católica é uma e tem um mesmo credo e uma mesma instituição. Isso não acontece com os evangélicos, que podem ser os protestantes históricos (luteranos e reformados), originários da Reforma, como também os numerosos pequenos grupos autônomos surgidos recentemente. Entre eles, como instituição religiosa, pouco ou nada existe em comum. Essa observação precisa ser levada em conta quando se fazem as comparações entre católicos e evangélicos.
O número dos católicos diminuiu ulteriormente entre os Censos de 2010 e 2022. Mas com menor intensidade. O que se observa na prática pastoral é que já existe uma renovada procura da Igreja Católica por jovens e adultos e isso pode explicar por que a queda foi menor do que era esperado. O número de evangélicos cresceu, mas também com menor intensidade. Os jovens, em geral, são menos católicos e mais evangélicos ou indiferentes à religião. O Brasil atual mostra a sua diversidade religiosa, sem que haja uma religião oficial no país. Cada um faz a sua escolha religiosa. E mostra que continua sendo um país com religiosidades exuberantes.
Certamente, os dados religiosos do Censo de 2022 nos impõem, como Igreja Católica, algumas reflexões importantes. Eles, de fato, vão explicitando aquilo que, mais ou menos, sabíamos, ou podíamos saber: os católicos brasileiros, em sua imensa maioria, são apenas batizados, mas não frequentam a Igreja ou o fazem apenas raramente; isso faz pensar em uma religiosidade sem convicções formadas e superficial que, dia mais, dia menos, pode mudar, ser conquistada para outra religiosidade, ou ser abandonada de vez. Parece que é isso que está acontecendo: os católicos sem convicção formada e com fraco senso de pertencimento à Igreja vão deixando de ser católicos.
Por outro lado, nossa prática pastoral, que contempla pouca pregação e pouca catequese, não consegue inflamar nem sustentar a fé nos corações. Algo precisa ser revisto nesse sentido, favorecendo uma formação religiosa mais aprofundada e generalizada. Mais uma vez, coloca-se a questão: quando e onde teremos a possibilidade de formar o nosso povo católico, se continuamos tendo uma frequência baixíssima na Igreja? Temos a possibilidade de apertar a mão, olhos nos olhos, ouvir e dizer uma palavra pessoal às pessoas que vão à missa dominical ou frequentam outros momentos comunitários de nossas organizações eclesiais. E talvez o fazemos. Mas para a imensa maioria anônima que não comparece nesses momentos, não há outras ocasiões para fazer isso. E sabemos que é importante fazê-lo, pois a experiência religiosa acontece também nas relações interpessoais. Como ser mais essa Igreja do encontro e da acolhida de pessoas para uma experiência religiosa profunda?
Alguém poderá dizer que não devemos ficar preocupados com o número, mas com a qualidade dos membros da Igreja Católica. Certamente, não se trata de um campeonato, em que é preciso fazer de tudo para suplantar e vencer o outro. Porém, não podemos ficar indiferentes quando um irmão católico deixa a Igreja ou abandona a fé. E não podemos esquecer que Jesus enviou os apóstolos “a todos os povos”, e não apenas a algumas pessoas. Por isso, o empenho missionário para levar a Boa Nova a todos e para ajudar a todos a encontrarem “o caminho, a verdade e a vida”, não pode se acomodar por nenhum motivo. Não nos cabe contabilizar os êxitos, pois a aceitação do Evangelho e a conversão dos corações acontece pela ação do Espírito Santo no diálogo da consciência de cada um. Mas a nossa parte precisa ser feita.
Gostei muito desta reflexão.
Gostei da reflexão feita! Acredito que, atualmente, essa acolhida ao outro e evangelização está muito mais na “responsabilidade pessoal” de cada batizado. Onde a igreja-ecclesia não chega, chega aquele batizado que vai à missa, que participa de uma comunidade, é ativo numa pastoral. Daí e aí está a suma importância de promover momentos de verdadeiro encontro com o Senhor na oração, na formação e no sentido da missionariedade: todos são chamados a anunciar e testemunhar o Cristo vivo! Mas, hoje, creio eu, em muitas realidades, a evangelização não é de massas, e sim no encontro pessoal, na escuta, na acolhida pessoal e singular de cada pessoa ou de pequenos grupos que cada batizado católico encontra e partilha sua experiência de humana e religiosa.
Muito boa essa reflexão. Obrigado e parabéns.
Excelente reflexão, Dom Odilo!