A palavra fanático vem do latim fanum: templo, lugar sagrado, santuário, e se referia àquele que frequentava um destes locais, sem nenhuma outra conotação. A partir do século XVIII, esse termo passa a expressar o excesso de zelo que beira a obsessão e desencadeia atitudes extremistas. É a adesão cega a uma doutrina, a um sistema, a um partido político, em que o sentimento pesa mais que a razão, gerando intolerância, preconceito, irracionalidade, ou seja, o reverso do que é o diálogo.
A pessoa é levada a considerar que existe somente a sua verdade, confundindo as relações e se colocando como “dono desta verdade única”, como sendo a maneira correta de interpretar e de agir. Não leva em conta o pensamento e a fundamentação do outro, considerando como “inimigos” a serem combatidos todos os que possuam outra religião ou convicção política.
O fanático perde o sentido de suas capacidades críticas e vê, em um objeto, pessoa ou ideia – foco de sua opção – qualidades que não existem ou são superestimadas. Combate o “outro lado” com ódio, dispondo-se até mesmo a arriscar a própria vida e negando as evidências que são contrárias à sua causa.
Uma pessoa pode possuir personalidade com tendência a esta “entrega” sem maiores questionamentos ou a escolha da religião ou do partido político pode ocorrer de forma natural, baseada na tradição familiar mas, depois, se tornar uma participação fanática. Existem também os grupos que induzem seus membros ao fanatismo.
O fanatismo pode emergir da área pessoal e se transformar em fenômeno coletivo, atingindo uma dimensão social de larga proporção, conduzindo grupos ou até parte da população a atitudes impensáveis. Representa, no aspecto político, constante perigo à democracia, quando a massa humana é manipulada por organismos poderosos para lutar por ideais colocados por esses agentes.
O fanático acredita em tudo que é divulgado a favor do tema que defende, sem checar fonte, autoria ou veracidade. A aceitação das fakes news, sobretudo distribuídas em larga escala no WhatsApp, é um exemplo contundente. As mensagens anônimas, sem qualquer credibilidade, sem pesquisa sobre a fundamentação, são repassadas como verdadeiras.
O fanático tem total desprezo e desconsideração pela opinião alheia contrária à sua crença e ou posição, o que traz em relevo um aspecto crucial e fundamental: o diálogo ou a falta do diálogo, pois não há disposição para ouvir o outro em seus argumentos.
Na área política com elementos religiosos, os líderes são considerados escolhidos e enviados por Deus, e isso pontecializa de forma exponencial o fanatismo e leva a tomar decisões de forma irracional, com adesão passional, impedindo o diálogo e criando uma ruptura aparentemente insuperável.
Na realidade, em nenhuma situação, a verdade, ainda que parcial, está na posse de alguém ou de um grupo, pois esta possui muitas facetas e é muito mais complexa do que possamos imaginar ou alcançar num debate caloroso e apaixonado.
De outro lado, deixar de abordar assuntos polêmicos, para manter uma aparente situação de harmonia, é omissão grave, pois podemos ignorar questões de urgência e importância para a sociedade.
É possível e salutar dialogar sobre ideias, possibilitando a coexistência harmônica entre pessoas que tenham pensamentos diferentes; com isso se evita discutir sobre as paixões, o que, na maioria das vezes, leva a resultados destrutivos e desagregadores.
Ouvir com atenção, aprender com o outro, agir com humildade e grandeza, colocando-se no lugar do outro, até conseguir pensar, analisar e interpretar um tema, levando em conta os sentimentos e as experiências do interlocutor.
Indispensável manter a pluralidade de opiniões, de pontos de vista, de opções, de escolhas, e isso se consegue tendo como base o diálogo entre as muitas tendências e posições pessoais e de grupos. Assim, é possível contribuir com a construção de uma sociedade participativa, plural, democrática e justa.
Luiz Antonio Araujo Pierre é membro do Movimento dos Focolares, advogado e professor.