O mês de setembro é para nós o “mês da Bíblia”, e no último domingo deste mês celebramos o seu dia. E, para levarmos a sério a Palavra, Jesus nos conta a parábola do pobre Lázaro e do rico avarento. O rico se veste com roupas finas e faz festas todos os dias, enquanto que o pobre Lázaro tem a pele coberta de feridas. De um lado a ostentação agressiva do rico, do outro, o pobre sem recursos, sem direitos, coberto de úlceras, impuro, sem ninguém que o acolha, a não ser os cachorros que lambem suas chagas. Cães eram os pagãos, apelido dado aos pecadores que não cumpriam a lei divina. Eles estavam cuidando melhor dos pobres que alguns ricos religiosos.
Deus olha como se vestem seus filhos: o rico com roupas de púrpura e linho fino, o pobre coberto de feridas. Deus olha como se alimentam seus filhos: o rico dava banquete todos os dias, o pobre queria matar a fome com o que caía da mesa do rico, isto é, “não as migalhas que caíam no chão, mas pedaços de pão que se usavam para limpar os pratos e enxugar as mãos e que depois atiravam sob a mesa. Como Lázaro queria saciar a fome com aquilo” (Joachim Jeremias, As Parábolas de Jesus, p.185). Lázaro tinha uma enfermidade exposta na pele, tinha feridas; o rico também tinha uma enfermidade terrível: era cego, não conseguia olhar para além do seu mundo feito de banquetes, festas e roupas finas. Não via além da porta da sua casa, não tinha interesse por aquilo que estava acontecendo lá fora onde Lázaro estava à espera de um pouco de pão e atenção.
O pobre morre e é levado pelos anjos para o seio de Abraão. Ferido no corpo e na dignidade, encontra solidariedade em Deus. O rico que se diz ser filho de Abraão também morre e é enterrado. Demonstra ser um homem muito piedoso, pois reconhece Abraão e o chama de Pai. Em vida, o rico nunca quis saber da existência de Lázaro, somente na hora do tormento eterno é que enxerga Lázaro e suplica que amenize seu sofrimento molhando a ponta do seu dedo para refrescar sua língua. Quer também que Lázaro seja ressuscitado para dar um susto nos seus irmãos, para que se convertam e não tenham o inferno como morada eterna. É a primeira vez que vê além da porta de sua casa, e mesmo assim quer usar do pobre Lázaro para salvar tão somente seus irmãos e amigos. Ele é como o irmão mais velho da parábola do pai com os dois filhos. O mais velho reclama do pai e quer uma festa só com os amigos, e não com os excluídos. A resposta de Abraão é esclarecedora: “Eles têm Moisés e os profetas: que os ouçam”, ou seja, entendam que a chave para compreender a Sagrada Escritura é o pobre sentado à porta. E nisto adverte o profeta Amós: “Ai dos que vivem comodamente em Sião… Os que dormem em camas de marfim, deitam-se em almofadas, comendo cordeiros do rebanho… dos que bebem vinhos em taças, e se perfumam com os mais finos unguentos e não se preocupam com a ruína de José”.
E, quando se distorce a verdade da Palavra, falseando a sua mensagem, a religião se torna fonte de riqueza. Paulo faz referência a pessoas que, idolatrando o dinheiro, caíram na tentação, abandonaram a verdadeira fé, fazendo da pregação do Evangelho fonte de lucro. Ele os aconselha: “Fuja das coisas perversas… guarda o teu mandato íntegro e sem mancha até a manifestação gloriosa de Nosso Senhor Jesus Cristo”.
Por fim, vale lembrar o conselho já conhecido do Cardeal Cláudio Hummes ao Papa Francisco por ocasião de sua eleição: “Por favor, não se esqueça dos pobres”.