Todos estamos tristes com o que consideramos o pior efeito do distanciamento social: a suspensão das missas presenciais. Lamentamos a impossibilidade de encontrar pessoalmente o Senhor, verdadeiramente presente na hóstia e no vinho consagrados. Participar das santas missas a distância pode até ser alguma coisa, mas não é tudo.
Meu objetivo aqui, porém, não é tecer lamentações. Nem discutir se cabe ou não ao Estado suspender missas. Muito menos questionar se haveria outra forma de conciliar a prevenção orientada pelas autoridades médicas e o exercício da fé. A essa altura, todo mundo tem sua opinião formada, boa ou ruim, certa ou errada. Meu objetivo é simples: peço um pouco mais de compreensão, carinho e respeito ao nosso clero.
Vejo muita gente acusar o clero de omissão em relação ao comando estatal de fechamento de igrejas e suspensão de atividades, incluindo as santas missas. Se fosse gente sem fé, gente má, aventureira ou oportunista, eu me limitaria a rezar. Ou, se a misericórdia me fugisse do coração, a praguejar. Confesso-o, sem muito constrangimento. Preocupa-me, no entanto, ver enxurradas de críticas vindas de gente boa, de fé, que ajuda a Igreja a se manter fiel à fé e à sua missão maior: salvar almas. O quepoderiam fazer os bispos e padres? Enfrentar o Estado e colocar os fiéis em risco?
Hoje, o fechamento provisório das igrejas e a suspensão das missas se deram por questões bem claras de saúde pública. Se foi a melhor opção, o tempo dirá. As autoridades não me parecem ter agido por ódio à fé, mas por receio da explosão de contágios. Por enquanto, parte significativa da comunidade científica ampara essas posições. Se acertaram ou erraram, insisto, o tempo dirá. Se exageraram na dose, insisto novamente, o futuro, talvez não muito distante, os julgará. O objetivo não é neste momento tratar do assunto.
Agindo diferentemente, o clero não testemunharia a fé, amiga da razão. Criaria apenas uma zona de atritos, fornecendo aos inimigos da Igreja argumentos para atacá-la, falaciosos que sejam. Obscurantista seria a palavra mais frequente na boca dos que não a suportam. F oi o próprio Senhor, porém, quem ensinou aos apóstolos a ter a mansidão das pombas e a astúcia das serpentes. A Igreja agiu estrategicamente, sem dar razão, no meu entender, a que sua ação fosse encarada como contratestemunho na fé. Existem momentos de enfrentamento; existem os de resiliência. Estou seguro de que a circunstância pede resiliência.
Não são poucos os inimigos da Igreja no mundo. Muito provavelmente, sob as cortinas da saúde popular, muita gente sentiu algum prazer com o fechamento de igrejas (e de templos, sinagogas, mesquitas, terreiros, centros etc.). Fosse esta a posição predominante, tivesse o Estado o vil desejo de sufocar a Igreja, eu não pensaria duas vezes em defender a fé. O desafio às autoridades seria a resposta justa ao abuso. Não quero crer, contudo, que esta tenha sido a intenção da maioria dos agentes políticos.
Precisamos ser mais compreensíveis com as circunstâncias e confiantes na hierarquia da Igreja. Cada um de nós, antes de apontar sem justa razão o dedo para algum sacerdote, deve perguntar a si mesmo: sou um católico minimamente decente, coerente com a fé e com o dever de buscar a santidade?
Em vez de destilar todas as críticas de que somos capazes, por que não orar? Sobrou tempo? Ore pelos que perderam o emprego, pelos que viram seu negócio derreter e, sobretudo, pelas vítimas fatais em todo o mundo, por suas almas e pelo consolo de seus familiares. E, com a bênção de Deus, atravessemos este momento tão estranho, tendo em memória as palavras de Santa Teresa D’Ávila: “Tudo passa, só Deus fica”.