Muitos diálogos sempre estão acontecendo na sociedade. É verdade que, frequentemente, o que denominamos “diálogo” é apenas uma conversa entre pessoas que pensam as mesmas coisas, e o diálogo é muito mais um monólogo compartilhado. Nem por isso, porém, deixa de haver muitos diálogos em nosso meio.
Contudo, mesmo esses diálogos ainda são, na maior parte das vezes, realizados entre pessoas que estão, por assim dizer, numa mesma grande frente. Compartilham os posicionamentos mais relevantes com relação à política, à moral, à família e à vida social. Não coincidem em tudo, mas – quando procuram dialogar – desenvolvem temas para os quais existe uma grande concordância.
Esse não é o diálogo que faz a diferença na sociedade, ao qual o Papa Francisco fez questão de convidar os brasileiros ao insistir “diálogo, diálogo, diálogo” (no Encontro com a classe dirigente do Brasil), em 27 de julho de 2013), aquele ao qual os cristãos estão sendo convidados na Campanha da Fraternidade deste ano – não importa aqui seus erros e acertos.
Um diálogo que não nos incomoda, nem nos obriga a mudar, pelo menos um pouco, não é o diálogo com o qual os cristãos são chamados a contribuir para a construção de um mundo melhor. O diálogo que os cristãos deveriam ter entre si e com todos os demais é aquele que exige a nossa adesão cada vez maior ao amor e à verdade. Incomoda-nos, porque nos chama à conversão (nem que seja apenas para nos tornarmos mais pacientes e tolerantes com os que pensam diferente).
Tornou-se muito falado, nestes tempos, o “Paradoxo da tolerância” de Karl Popper: “Se tolerarmos os intolerantes, eles criarão uma sociedade intolerante – aos seus moldes – e eliminarão a nós, os tolerantes”. Esse raciocínio é justo, ao menos em termos, mas não é válido para o diálogo.
A tolerância pertence ao terreno da negociação e do pacto, da convivência pacífica – sem dúvida necessária – entre diferentes. O diálogo pertence ao terreno do encontro e da partilha, de uma convivência na qual os diferentes não apenas convivem, mas conseguem construir algo juntos.
Dialogar com os sectários pode parecer igual a tolerar os intolerantes. No entanto, não é. Tolerar os intolerantes leva a uma sociedade dominada pela intolerância. Não procurar dialogar com os sectários tornará a nós mesmos mais sectários e construirá uma sociedade mais fechada e que acabará se tornando intolerante e sectária – com sofrimentos para todos, mais cedo ou mais tarde.
Por tudo isso, existe um diálogo particularmente significativo ao qual nós, cristãos, estamos sendo chamados nesta Campanha da Fraternidade Ecumênica: o diálogo entre posições ideológicas opostas. “Dialogar” com pessoas que estão no nosso mesmo lado do espectro ideológico é bom, mas não faz a diferença, uma vez que essa não é a contribuição específica dos cristãos em um momento de crise, confusão e conflitos sociais.
Temos a ilusão de que mudamos o mundo quando nos tornamos, nós e nossos correligionários, mais convictos de nossas posições – mesmo que isso nos torne mais sectários. Os cristãos, porém, ajudam a mudar o mundo quando, por amor a Cristo e aos irmãos, conseguem entender e acolher um pouco melhor as razões do outro (naquilo que têm de verdadeiro).
Assim como existem os sectários que se recusam a mudar, sempre haverá aqueles que, no diálogo, mudam para melhor – por pouco que seja.
São essas pequenas mudanças – que podem parecer insignificantes para os que estão obcecados pelo poder –, que criam a possibilidade de novas sínteses que superam as polêmicas e abrem a possibilidade de verdadeiras soluções para temas controversos.
Francisco Borba Ribeiro Neto é coordenador do Núcleo Fé e Cultura da PUC-SP