O livro do Gênesis, em seu primeiro capítulo, faz uma construção teológica muito bonita sobre a criação do Universo: “No princípio, Deus criou o céu e a terra. A terra estava deserta e vazia, as trevas cobriam o abismo e o Espírito de Deus pairava sobre as águas”. Deus continuou a sua criação e, no sexto dia, “disse: ‘Eis que vos dou, sobre toda a terra, todas as plantas que dão semente e todas as árvores que produzem seu fruto com sua semente, para vos servirem de alimento. E a todos os animais da terra, a todas as aves do céu e a todos os animais que se movem pelo chão eu lhes dou todos os vegetais para alimento’. E assim se fez. E Deus viu tudo quanto havia feito, e era muito bom”.
Deus nos deu domínio sobre a terra e todas as coisas que permitem a nossa sobrevivência. Na mitologia grega, a Terra era chamada de Gaia, a Mãe-Terra, a segunda divindade primordial de Hesíodo, que permitiu o ordenamento do Cosmo, para ser capaz de receber o Humano.
No entanto, até quando Gaia suportará a ação humana?
Talvez as melhores perguntas sejam: Qual o futuro da humanidade? Haverá futuro para nós?
Ainda em 2015, a revista Science publicou um artigo que reunia 18 pesquisadores que constataram que quatro dos nove limites do planeta já foram ultrapassados. Esses quatro limites são: a mudança climática, a mudança na integridade da biosfera (perda de biodiversidade e extinção de espécies), a mudança no sistema de solos e a mudança nos fluxos biogeoquímicos (ciclos de nitrogênio e fósforo). Os dois primeiros são chamados de limites centrais e podem determinar a alteração definitiva de nosso planeta. Hoje, há riscos efetivos de mudança ambiental abrupta e, pior, trata-se de uma situação irreversível. Isso mostra que não temos cuidado com o planeta, com a nossa casa. A atual crise mundial, porém, nos coloca ainda mais em xeque. Isso tudo nos mostra que somos incapazes, até mesmo, de reconhecer a raiz humana da crise ecológica. Algo que o Papa Francisco, em sua Encíclica Laudato si’ (LS), sobre o cuidado da casa comum, nos ensina:
“Para nada serviria descrever os sintomas, se não reconhecêssemos a raiz humana da crise ecológica. Há um modo desordenado de conceber a vida e a ação do ser humano, que contradiz a realidade até o ponto de a arruinar. Não poderemos nos deter a pensar nisto mesmo? Proponho, pois, que nos concentremos no paradigma tecnocrático dominante e no lugar que ocupa nele o ser humano e a sua ação no mundo” (LS 101).
O fato é que, mesmo conhecendo todos os riscos, ainda nos mostramos incompetentes para mudar o nosso rumo. Não temos sido capazes de construir algo distinto do que temos hoje e que nos permita a convivência pacífica com a Mãe-Terra. E mais, a nossa prepotência nos faz acreditar que somos capazes de dominar as forças da natureza. Quando, contudo, olhamos acontecimentos como os furacões, queimadas intensas, florestas em chamas, tsunâmis destruidores e, agora, uma pandemia trazida por um vírus, está na hora de pararmos, pensarmos e agirmos de forma diferente.
Podemos começar atendendo ao apelo do Papa Francisco: “O urgente desafio de proteger a nossa casa comum inclui a preocupação de unir toda a família humana na busca de um desenvolvimento sustentável e integral, pois sabemos que as coisas podem mudar. O Criador não nos abandona, nunca recua no seu projeto de amor, nem se arrepende de nos ter criado. A humanidade possui ainda a capacidade de colaborar na construção da nossa casa comum” (LS 13).