Quaresma: tempo de preparar a Páscoa

Com os ritos da Quarta-feira de Cinzas, a Igreja inicia a celebração da Quaresma, em preparação à Páscoa deste ano. É bom ter bem claro isto: a Quaresma não é um conjunto de práticas isoladas e fechadas sobre si mesmas, mas a preparação à Páscoa, a celebração mais importante na Liturgia cristã ao longo de todo o ano. No “mistério pascal” está fundamentada toda a nossa fé e a vida cristã.

Mediante os exercícios quaresmais, nos dispomos a renovar as promessas do nosso Batismo e a viver a busca mais intensa de Deus, purificados pela penitência e a conversão. Em cada celebração da Páscoa, somos chamados a “morrer com Cristo para os nossos pecados e a ressuscitar com Ele para a vida nova, recebida no Batismo (cf.Rm 6,1-5), “buscando as coisas do alto” (cf. Cl 3,1).

A Quaresma é, portanto, um tempo de penitência para a purificação dos pecados, a conversão e a renovação das nossas disposições interiores para vivermos como bons cristãos. A penitência pode significar renúncia àquilo que não vai bem em nossa vida, correção dos nossos erros e superação da passividade e estagnação na vida cristã. A penitência pode requerer o esforço sincero para a superação de vícios e condutas erradas. Penitência não é castigo, mas busca ativa de conversão, crescimento na fé, esperança e caridade, de correspondência aos mandamentos de Deus e de fidelidade aos nossos deveres. A penitência tem por finalidade ajudar-nos a voltar para Deus e a ser fiéis a Ele.

Este tempo litúrgico também é de oração mais intensa, escuta atenta e prática da Palavra de Deus. “Hoje, não fecheis os vossos corações, mas ouvi a voz do Senhor” (Sl 95,8). Ser cristão é viver uma relação fiel e filial com Deus, que não pode ser um estranho em nossa vida, de quem nos lembramos apenas nos momentos difíceis. Pelo Batismo, nos tornamos filhos e filhas de Deus, que passamos a chamar de Pai (cf. Gl 3,26; 4,6). Nossa vida não pode ser uma vida sem Deus, nem pode relegar Deus a ser o “grande desconhecido” em nossa vida. Por isso, os exercícios quaresmais têm a finalidade de aprofundar nossa comunhão filial com Deus. A revisão da vida e a busca do perdão de Deus mediante uma boa Confissão sacramental fazem parte desse caminho de conversão, em preparação à Páscoa.

O terceiro conjunto de exercícios quaresmais é indicado pelo nome “esmola” e se refere à prática da caridade nas suas mais diversas dimensões. Amor a Deus e amor ao próximo sempre andam juntos na vida cristã e, por isso, nossa preparação à Páscoa passa pela intensificação da prática da caridade e das obras de misericórdia. A caridade pode ser pessoal e social, envolvendo os diversos aspectos da vida em comum. Por isso,além da prática pessoal da caridade, a Quaresma traz sempre as implicações sociais do nosso modo de viver. A justiça e a solidariedade, a superação dos modos violentos e agressivos de se relacionar, a edificação da convivência social em base aos valores humanos e evangélicos, a responsabilidade de cada um pela edificação do bem comum, o respeito à vida e à dignidade de cada ser humano fazem parte da vivência da caridade cristã.

No início da Quaresma, há um apelo que deve nos acompanhar ao longo de toda a nossa vida: “Lembra-te de que és pó e ao pó hás de voltar” (cf. Gn 3,19). Parece humilhante dizer isso a alguém, mas a Palavra de Deus – e da Igreja – nos alerta para não perdermos isso de vista. Não é uma palavra pessimista, mas realista, que nos faz cair na realidade e acordar para a vida. A vida é uma só e passa depressa! Que fazemos de nossa vida? Para onde orientamos nossa existência? Que valores referenciais temos? A Bíblia fala da “soberba da vida”, e isso significa a pretensão de viver sem limites e sem precisar prestar contas a ninguém daquilo que fazemos (cf. Pv 16,18; Is 13,11; 1Jo 2,16). A soberba da vida leva ao não reconhecimento de Deus, à impiedade, à soberba e à perdição. Na Quaresma, somos confrontados conosco mesmos, para nos tornarmos humildes, realistas, tementes a Deus e voltados à prática do bem.

No Brasil, a Campanha da Fraternidade, sempre com um tema relacionado com a caridade social, nos ajuda a viver a Quaresma. A Campanha insere-se na proposta devivência do tempo quaresmal e traz um apelo forte à conversão. Neste ano, a Campanha trata da Ecologia Integral, lembrando que, no princípio, o Criador viu que “tudo era muito bom” (cf. Gn 1,31). A convivência do homem com a natureza, essa maravilha que é nossa “casa comum” (Papa Francisco), requer nossa atenção especial, em vista dos sérios desequilíbrios ambientais decorrentes da ação humana. O tema mexe com nossa fé em Deus Criador e, também, com nossa moral. Os desequilíbrios ambientais estão causando problemas a muitas pessoas. Quem responde pelos problemas causados? Como solucionar esses problemas? À luz da fé e da moral cristãs, somos chamados adar respostas a esses questionamentos.

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