Talentos, esperança e política

São Mateus escreve: “De fato, sucede como um homem que, ao partir em viagem, chamou os seus servos e lhes confiou seus bens. A um entregou cinco talentos, a outro, dois, a outro, um só, cada um de acordo com suas capacidades; depois partiu” (Mt 25, 14-15).

Deus dá talentos às pessoas para que possam colaborar com Ele na obra da Criação, segundo suas singulares condições. Com palavras, gestos e ações criativas, respondemos ao amor de Deus fazendo coisas boas, belas e verdadeiras com vistas ao bem comum.

O Criador se afastou da Criação dando autonomia às criaturas, mas logo enviou Seu Filho Jesus Cristo como redentor e mestre para corrigir nossos desvios. O carpinteiro Emanuel, Deus conosco, nos ensina a trabalhar no cotidiano ordinário da vida.

Com a fecundidade do Espírito Santo, multiplicamos os bens por dois, três, cinco ou mil. Uma criança faz seu desenho, uma mãe um prato saboroso, um jovem uma bela poesia, uma avó um interessante relato da história.

O convite irrecusável do Criador para que sejamos coautores da Criação vem carregado da esperança que Ele mesmo repousa em nós. Graças ao dom do amor e do perdão, podemos, também nós, lançar um olhar de esperança sobre os demais, em qualquer âmbito de nossa existência.

Na última semana de junho, pude vivenciar duas situações muito especiais e cheias dessa esperança. A inauguração da Escola de Prefeitos da Oficina Municipal e da Fundação Konrad Adenauer e o Seminário sobre Esperança e Política, da Companhia das Obras, ligada ao Movimento Comunhão e Libertação.

Nos dois eventos, as análises se voltaram, de modo especial, às pessoas e às comunidades locais. Nas comunidades surgem inovações organizacionais, superam-se hábitos da antiga política e se faz bom uso da técnica gerencial.

A combinação desses ingredientes na medida justa se dá por meio do diálogo e da conciliação entre interesses. A dinâmica da vida política comunitária conduz à justiça e à paz entre as pessoas e os grupos sociais.

Na encíclica Caritas in Veritate (CV), Bento XVI nos ensina, que em todas as culturas existem “singulares e variadas convergências éticas, expressão de uma mesma natureza humana querida pelo Criador, que a sabedoria ética da humanidade chama lei natural” (CV 59).

Prossegue o Papa Emérito afirmando que “esta lei moral universal é um fundamento firme de todo o diálogo cultural, religioso e político” (grifo nosso). Há, portanto, uma base na qual todos podemos nos apoiar como fundamento da política, independentemente de nossas crenças ou ideologias.

O Papa Bento XVI ensina, ainda, que essa base existe e permite que o “multiforme pluralismo das várias culturas não se desvie da busca comum da verdade, do bem e de Deus. Por isso, a adesão a esta lei escrita nos corações é o pressuposto de qualquer colaboração social construtiva.” (CV 59)

Nessa perspectiva, poderíamos dizer que os talentos, a esperança e a política podem ser vistos como três fios que se entrelaçam nas mãos dos filhos de Deus. Uma corda com a densidade necessária para nos arrancar do fosso da crise política em que nos encontramos.

Na outra ponta da corda está aquele Senhor que partiu em viagem mas nunca nos abandonou. Ao atravessar as sombras da falsidade e da crise institucional, o amor na verdade irá prevalecer, também em âmbito político.

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