Os Jogos Olímpicos sempre nos ensinam sobre superação, vitórias, derrotas, virtudes, desafios, beleza. No entanto, as Olímpiadas 2020 trouxeram, além de todas essas coisas, uma nova perspectiva sobre nós mesmos.
Primeiramente, porque os Jogos foram realizados somente em 2021 por causa da pandemia. Sem público, com diversas restrições, rostos cobertos, preocupação com a higiene, sem abraços. Mas também mostrou o quanto somos resilientes e, mesmo neste ambiente que a COVID-19 nos impõe, insistimos e foi possível realizar os Jogos.
Isso consagra as origens dos Jogos Olímpicos que ocorriam na Grécia Antiga, nos períodos de trégua entre guerras, sendo associada a rituais religiosos. Nos tempos modernos, o Barão de Coubertin, no século XIX, resgata essa prática trazendo o seu espírito de celebração da paz entre povos.
Além dessa celebração, assistimos durante os Jogos deste ano a alguns fatos diferentes e que não notávamos anteriormente. Com o alto nível das competições ao longo da história dos Jogos, com recordes sendo batidos, parecia-nos que os atletas eram super-homens. Principalmente os ganhadores dos louros olímpicos, eram pessoas que não sentiam dor, inabaláveis, verdadeiras máquinas. A história das Olimpíadas 2020, porém, permitiu a visão de que isso não é totalmente verdade. Esses atletas não deixam de ser pessoas como todas as outras. Seres com todas as virtudes e fragilidades de todo humano.
A mostra muito clara disso foi a ginasta norte-americana Simone Biles, que, antes dos Jogos, era vista como a atleta que deveria conquistar o maior número de ouros e ser o destaque deste ano. No entanto, surpreendendo a todos, ela desistiu de competir na maior parte das provas em razão de problemas emocionais. De potencial destaque no quadro de medalhas, tornou-se um grande ser humano ao mostrar as fragilidades a que todos somos sujeitos.
A atitude dessa atleta entra na história como um ato nobre e que encontra as palavras do Papa Francisco por ocasião do lançamento do documento “Dar o melhor de si”, do Dicastério para os Leigos, a Família e a Vida, acerca da perspectiva cristã do esporte e da pessoa humana. Francisco diz que, em uma cultura dominada pelo individualismo e pelo descarte das jovens gerações e dos idosos, “o esporte é um âmbito privilegiado, no qual as pessoas se encontram, sem distinção de raça, sexo, religião ou ideologia; em que também podem experimentar a alegria de competir e atingir uma meta em equipe”.
O Papa continua sua manifestação: “Sabemos que as novas gerações se inspiram nos atletas e desportistas, que, por sua vez, devem dar exemplo de virtudes, como a generosidade, humildade, sacrifício, constância e alegria; devem ainda contribuir para o espírito de equipe, o respeito, a saudável competição e solidariedade com os outros”.
O Santo Padre evidenciou, ainda, que a “Igreja é chamada a ser sinal de Jesus Cristo no mundo, também mediante o esporte nos oratórios, nas paróquias, escolas e associações”. As palavras de Francisco nos levam a entender a íntima relação existente entre esporte e vida quando acrescenta que “tal busca nos conduz, com a graça de Deus, a atingirmos a plenitude da vida, que se chama ‘santidade’”.
Quando Francisco diz que o “esporte é uma riquíssima fonte de valores e virtudes, que nos ajuda a melhorar”, ele nos traz maior compreensão do que ocorreu com a atleta e nos permite perceber a nossa própria realidade como pessoas, com nossos vícios e virtudes.
Fabio Gallo é professor da Fundação Getulio Vargas (FGV-SP) e ex-docente da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).