A beleza de Cristo

PASTRO, CLÁUDIO. Crucifixo vazado (detalhe). Santuário Nacional de Aparecida. Foto de Roberto Parizzi

Se a beleza da criação é, segundo Santo Agostinho, uma confessio e nos convida a contemplar a beleza em sua fonte, o “Criador do céu e da terra, do universo visível e invisível”; e se a beleza das obras de arte revela algo da beleza da figura do Filho que se fez carne, “o mais belo dos filhos do homem”; há um terceiro caminho fundamental – o primeiro em importância – que leva à descoberta da beleza no ícone de santidade, obra do Espírito que plasma a Igreja à imagem de Cristo, modelo de perfeição: é, para os batizados, a beleza do testemunho dado por meio de uma vida transformada em graça e, para a Igreja, a beleza da liturgia que permite experimentar Deus, vivo no meio do seu povo, e que atrai a si a quem se deixa abraçar, cheio de alegria e amor […]

O vértice, o arquétipo da beleza, se manifesta no rosto do Filho do homem crucificado na Cruz das dores, revelação do amor infinito de Deus que, em sua misericórdia para com suas criaturas, restitui a beleza perdida com o pecado original. “A beleza salvará o mundo”, porque esta beleza é Cristo, a única beleza que desafia o mal e triunfa sobre a morte. Por amor, o “mais belo dos filhos do homem” tornou-se um “homem de dores”, “sem aparência nem beleza para atrair os nossos olhos” (Is 53, 2), e, assim, devolveu plenamente ao ser humano, a cada ser humano, a sua beleza, a sua dignidade e a sua verdadeira grandeza. Em Cristo, e somente Nele, a nossa via crucis (caminho da cruz) se transforma na sua via lucis (caminho da luz) e via pulchritudinis (caminho da beleza) […]

Pavel Florensky [considerado um dos principais representantes do pensamento religioso russo do século XX, nde.] assim comenta a passagem do Evangelho segundo São Mateus (5, 16): “As tuas ‘boas obras’ [que devem brilhar para que, sendo vistas, levem as pessoas a glorificar a Deus, nde.] não significam de forma alguma ‘boas obras’ num sentido filantrópico e moralista. τὰ καλὰ ἔργα significa ‘belas obras’, revelações luminosas e harmoniosas da personalidade espiritual – sobretudo, um rosto luminoso e belo, de uma beleza pela qual a ‘luz interior’ do ser humano se expande para fora, e então, superados pela irresistibilidade dessa luz, os seres humanos louvam o Pai celeste, cuja imagem na terra tanto resplandece”. A vida cristã é chamada a tornar-se, com a força da graça dada por Cristo ressuscitado, um acontecimento de beleza capaz de suscitar admiração, suscitar reflexão e provocar conversão […] A beleza é o esplendor da Verdade e o florescimento do Amor.

CONSELHO PONTIFÍCIO PARA A CULTURA. Via pulchritudinis, caminho privilegiado de evangelização e diálogo. Vaticano, 2006

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