A busca pela verdade e a tristeza pelas desgraças do mundo

Bento XVI fala à universidade laica: o que um papa católico pode dizer a todos, tenham ou não fé em Cristo (Discurso para o encontro, que não se realizou, na Universidade de Roma “La Sapienza, 17/01/2008)

Outrora a “Sapienza” era a universidade do Papa, mas hoje é uma universidade laica com aquela autonomia que, na base do seu próprio conceito constituinte, sempre fez parte da natureza da universidade, que deve estar vinculada exclusivamente à autoridade da verdade. Na sua liberdade de autoridades políticas e eclesiásticas, a universidade encontra a sua função particular, nomeadamente na sociedade moderna, que tem necessidade de uma instituição desse gênero […]

O que é que pode e deve dizer o Papa no encontro com a universidade da sua cidade? […] O Papa fala como representante de uma comunidade crente, na qual, durante os séculos da sua existência, amadureceu uma determinada sabedoria da vida; fala como representante de uma comunidade que guarda em si um tesouro de conhecimento e de experiência ética, que se revela importante para toda a humanidade: nesse sentido, fala como representante de uma razão ética.

[Os cristãos dos primeiros séculos acolheram] a sua fé não de forma positivista, ou como a via de fuga de desejos não realizados; compreenderam-na como uma diluição da neblina da religião mitológica para deixar espaço à descoberta daquele Deus que é Razão criadora e, ao mesmo tempo, Razão-Amor. Por isso, o interrogar-se da razão sobre o Deus maior e sobre a verdadeira natureza e o autêntico sentido do ser humano era, para eles, não uma forma problemática de falta de religiosidade, mas parte da essência do seu modo de ser religiosos. Por conseguinte, […] podiam, aliás deviam, acolhê-lo e reconhecer como parte da sua própria identidade a árdua busca da razão para alcançar o conhecimento da verdade inteira […]

A verdade, porém, nunca é apenas teórica. Agostinho, ao estabelecer uma correlação entre as Bem-Aventuranças do Sermão da Montanha e os dons do Espírito mencionados no capítulo 11 de Isaías, notou uma reciprocidade entre scientia e tristitia: o simples saber deixa-nos tristes. E, realmente, quem se limita a ver e apreender tudo aquilo que acontece no mundo, acaba por ficar triste. Verdade, contudo, significa mais do que saber: o conhecimento da verdade tem como finalidade o conhecimento do bem. Este é também o sentido do questionamento socrático: Qual é o bem que nos torna verdadeiros? A verdade torna-nos bons, e a bondade é verdadeira: tal é o otimismo que vive na fé cristã, porque a esta foi concedida a visão do Logos, da Razão criadora que, na encarnação de Deus, se revelou conjuntamente como o Bem, como a própria Bondade […]

O que é que o Papa tem a fazer ou a dizer na universidade? Seguramente, não deve procurar impor de modo autoritário aos outros a fé, a qual pode ser dada somente em liberdade. Para além do seu ministério de Pastor na Igreja e com base na natureza intrínseca desse ministério pastoral, é sua missão manter desperta a sensibilidade pela verdade; convidar sempre de novo a razão a pôr-se à procura da verdade, do bem, de Deus e, neste caminho, estimulá-la a entrever as luzes úteis que foram surgindo ao longo da história da fé cristã e, assim, sentir Jesus Cristo como a Luz que ilumina a história e ajuda a encontrar o caminho rumo ao futuro.

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