Felizes os santos, pois, apesar de todas as provações, vivem a alegria da companhia e da proteção do Senhor. Na Gaudete et Exsultate (GE), O Papa Francisco apresenta “um programa de vida”, a própria identidade dos que encontraram Cristo e querem viver em Sua companhia

Tudo se joga na confiança. “C’EST LA CONFIANCE et rien que la confiance qui doit nous conduire à l’Amour – ‘Só a confiança e nada mais do que a confiança tem de conduzir-nos ao Amor’ (Carta 197). Estas palavras tão incisivas de Santa Teresa do Menino Jesus e da Santa Face dizem tudo, sintetizam a genialidade da sua espiritualidade e seriam suficientes para justificar o fato de ter sido declarada Doutora da Igreja. Só a confiança e ‘nada mais’… Não há outra via que devamos percorrer para ser conduzidos ao Amor que tudo dá. Com a confiança, a fonte da graça transborda na nossa vida, o Evangelho faz-se carne em nós e transforma-nos em canais de misericórdia para os irmãos. É a confiança que nos sustenta a cada dia e nos manterá de pé diante do olhar do Senhor, quando nos chamar para junto de Si” (C’est la confiance, CC 1-3).
“Jesus explicou, com toda a simplicidade, o que é ser santo; fê-lo quando nos deixou as bem-aventuranças (cf. Mt 5,3-12; Lc 6,20-23) […] Nelas está delineado o rosto do Mestre, que somos chamados a deixar transparecer no dia a dia da nossa vida. A palavra ‘feliz’ ou ‘bem-aventurado’ torna-se sinônimo de ‘santo’, porque expressa que a pessoa fiel a Deus e que vive a sua Palavra alcança, na doação de si mesma, a verdadeira felicidade” (GE 63-64).
Felizes os pobres em espírito, porque deles é o Reino do Céu. “Quando o coração se sente rico, fica tão satisfeito de si mesmo que não tem espaço para a Palavra de Deus, para amar os irmãos, nem para gozar das coisas mais importantes da vida […] Por isso, Jesus chama felizes os pobres em espírito, que têm o coração pobre, no qual pode entrar o Senhor com a sua incessante novidade. […] Lucas não fala de uma pobreza ‘em espírito’, mas simplesmente de ser ‘pobre’ (cf. Lc 6,20), convidando-nos, assim, a uma vida também austera e essencial. Dessa forma, chama-nos a compartilhar a vida dos mais necessitados, a vida que levaram os Apóstolos e, em última análise, a configurar-nos a Jesus, que, ‘sendo rico, Se fez pobre’ (2 Cor 8,9)” (GE 67-70).
Felizes os mansos, porque possuirão a terra. “Uma frase forte, neste mundo que, desde o início, é um lugar de inimizade […] reino do orgulho e da vaidade, onde cada um se julga no direito de elevar-se acima dos outros […Mas Jesus proclama] ‘Aprendei de Mim, porque sou manso e humilde de coração e encontrareis descanso para o vosso espírito’ (Mt 11,29). Se vivemos tensos, arrogantes diante dos outros, acabamos cansados e exaustos […] Se nos preocuparem as más ações do irmão, [São Paulo] propõe que o abordemos para corrigi-lo, mas ‘com espírito de mansidão’ (Gal 6,1) […] Os próprios adversários devem ser tratados com mansidão” (cf. 2 Tm 2,25)” (GE 71-73)
Felizes os que choram, porque serão consolados. “O mundo não quer chorar: prefere ignorar as situações dolorosas, cobri-las, escondê-las. Gastam-se muitas energias para escapar das situações de sofrimento, julgando que é possível dissimular a realidade, onde nunca pode faltar a cruz. A pessoa que, vendo as coisas como realmente estão, companhia
se deixa trespassar pela aflição e chora no seu coração, é capaz de alcançar as profundezas da vida e ser autenticamente feliz. Esta pessoa é consolada, mas com a consolação de Jesus e não com a do mundo […] descobre que a vida tem sentido socorrendo o outro na sua aflição, compreendendo a angústia alheia, aliviando os outros” (GE 75-76).
Felizes os que têm fome e sede de justiça, porque serão saciados. “Jesus diz que [as pessoas que buscam justiça] serão saciadas, porque a justiça, mais cedo ou mais tarde, chega; e nós podemos colaborar para torná-la possível, embora nem sempre a vejamos acontecer […] É verdade que a palavra ‘justiça’ pode ser sinônimo de fidelidade à vontade de Deus com toda a nossa vida, mas, se lhe dermos um sentido muito geral, esquecemo-nos que se manifesta especialmente na justiça com os fracos: ‘Procurai o que é justo, socorrei os oprimidos, fazei justiça aos órfãos, defendei as viúvas’ (Is 1,17)” (GE 77-79).
Felizes os misericordiosos, porque alcançarão misericórdia. “Dar e perdoar é tentar reproduzir na nossa vida um pequeno reflexo da perfeição de Deus, que dá e perdoa superabundantemente. Por esta razão, no Evangelho de Lucas, já não encontramos ‘sede perfeitos’ (Mt 5,48), mas ‘sede misericordiosos como o vosso Pai é misericordioso. Não julgueis e não sereis julgados; não condeneis e não sereis condenados; perdoai e sereis perdoados. Dai e ser-vos-á dado’ (6,36-38)” (GE 81).
Felizes os puros de coração, porque verão a Deus. “Quem tem um coração simples, puro, sem imundície […] sabe amar e não deixa entrar na sua vida algo que atente contra esse amor, algo que o enfraqueça ou coloque em risco [… O Senhor] procura falar-nos ao coração (cf. Os 2,16) e nele deseja gravar a sua Lei (cf. Jer 31,33) […] É verdade que não há amor sem obras de amor, mas esta bem-aventurança lembra-nos que o Senhor espera uma dedicação ao irmão que brote do coração” (GE 83-85).
Felizes os pacificadores, porque serão chamados filhos de Deus. “Os pacíficos são fonte de paz, constroem paz e amizade social. Àqueles que cuidam de semear a paz, Jesus faz uma promessa maravilhosa: ‘serão chamados filhos de Deus’ (Mt 5,9). Aos discípulos, pedia-lhes que, ao chegar a uma casa, dissessem: ‘A paz esteja nesta casa!’ (Lc 10,5). A Palavra de Deus exorta cada crente a procurar, juntamente ‘com todos’, a paz (cf. 2 Tim 2,22), pois ‘é com a paz que uma colheita de justiça é semeada pelos obreiros da paz’ (Tg 3,18)” (GE 88).
Felizes os que sofrem perseguição por causa da justiça, porque deles é o Reino do Céu. “Para viver o Evangelho, não podemos esperar que tudo à nossa volta seja favorável, porque muitas vezes as ambições de poder e os interesses mundanos jogam contra nós. São João Paulo II declarava ‘alienada é a sociedade que, nas suas formas de organização social, de produção e de consumo, torna mais difícil a realização deste dom e a constituição dessa solidariedade’ (Centesimus annus, CA 41). Em uma tal sociedade alienada, enredada em uma trama política, mediática, econômica, cultural e mesmo religiosa, que estorva o autêntico desenvolvimento humano e social, torna-se difícil viver as bem-aventuranças, podendo até a sua vivência ser mal-vista, suspeita, ridicularizada” (GE 91).
A grande regra de comportamento. “No Evangelho segundo Mateus, Jesus volta a deter-se em uma destas bem-aventuranças: a que declara felizes os misericordiosos […] Neste texto, encontramos precisamente uma regra de comportamento com base na qual seremos julgados: ‘Tive fome e destes-Me de comer, tive sede e destes-Me de beber, era peregrino e recolhestes-Me, estava nu e destes-Me que vestir, adoeci e visitastes-Me, estive na prisão e fostes ter comigo’ (Mt 25,35-36) […] O Senhor deixou-nos bem claro que a santidade não se pode compreender nem viver prescindindo destas suas exigências, porque a misericórdia é o ‘coração pulsante do Evangelho’ (Misericordiae Vultus, MV 12)” (GE 95-97).