“Consola-te. Não me buscarias se não me tivesses encontrado”. A reflexão de Pascal, cujos trechos apresentamos a seguir, retratam de forma eloquente sua espiritualidade e seu relacionamento com Cristo.
Jesus está num horto, não de delícias como o primeiro Adão, onde este se perdeu e a todo o gênero humano, mas de suplícios, onde Ele se salvou e a todo o gênero humano.
Ele sofre esta dor e esse abandono no horror da noite.
Creio que Jesus nunca se queixou, a não ser esta única vez. Mas então Ele se queixa como se não mais pudesse suportar sua dor excessiva. Minha alma está triste até a morte.
Jesus procura companhia e alívio da parte dos homens.
Isso é único em toda a sua vida, parece-me, mas nada recebe, pois os discípulos estão dormindo.
Jesus ficará em agonia até o fim do mundo. Não se deve dormir durante esse tempo […]
Jesus pediu aos homens e não foi atendido.
Jesus, enquanto os discípulos dormiam, operou a sua salvação. Fez deles justos enquanto dormiam, quer no nada de antes de seu nascimento, quer nos pecados desde o seu nascimento.
Só pede uma vez que o cálice seja afastado, e mesmo assim com submissão, e duas vezes que ele venha se for necessário [….]
Jesus, vendo todos os seus amigos dormindo e todos os seus inimigos vigilantes, se entrega inteiramente ao Pai. […]
Consola-te. Não me buscarias se não me tivesses encontrado. […] Deixa-te conduzir por minhas regras. Vê como conduzi bem a Virgem e os santos que me deixaram agir neles. O Pai ama tudo que faço. Queres que me custe sempre sangue de minha humanidade sem que me dês nenhuma lágrima? […]*
Vejo o meu abismo de orgulho, de curiosidade, de concupiscência. Não há nenhum ponto de relação entre mim e Deus, nem entre mim e Jesus Cristo justo. Mas Ele foi feito pecado por mim. Todos os vossos flagelos caíram sobre Ele. Ele é mais abominável do que eu e, longe de me detestar, sente-se honrado de que eu vá a Ele e o socorra. Mas Ele curou-se a si mesmo e me curará com mais forte razão. É preciso acrescentar as minhas chagas à suas e juntar-me a Ele, e Ele, salvando-se, me salvará. […]
Fazer as pequenas coisas como grandes por causa da majestade de Jesus Cristo, que as faz em nós e que vive nossa vida, e as grandes como pequenas e fáceis por causa de sua onipotência.
Pensamentos, Laf. 919
*Como fica claro da leitura completa do fragmento, Pascal atribui as palavras deste parágrafo a Jesus