Cristãos vivenciam a centralidade do mistério pascal ao longo do ano seguindo um calendário próprio para as celebrações
Ao contrário do ano civil, que começa em 1º de janeiro e termina em 31 dezembro, as celebrações da Igreja Católica seguem o calendário litúrgico, que começa no 1º Domingo do Advento, este ano celebrado no dia 28 de novembro, e termina no último sábado do Tempo Comum.
O ano litúrgico se desenvolve a partir dos acontecimentos marcantes da história da salvação, tendo como ápice a celebração da Páscoa – Paixão, Morte e Ressurreição do Senhor. Se o ano civil é determinado pelo período em que a terra gira em torno do sol, o ano litúrgico tem como “sol” o Cristo ressuscitado.
Portanto, é da celebração da Páscoa que derivam todas as celebrações do ano. “Com esta recordação dos mistérios da redenção, a Igreja oferece aos fiéis as riquezas das obras e merecimentos do seu Senhor, a ponto de os tornar como que presentes a todo o tempo, para que os fiéis, em contato com eles, se encham de graça”, ressalta a constituição sobre a liturgia Sacrosanctum concilium, do Concílio Vaticano II.
Domingo
No ano litúrgico, o domingo tem um destaque especial, pois é a “Páscoa semanal”. “Neste dia, os fiéis devem se reunir para participar na Eucaristia e ouvir a Palavra de Deus, e, assim, recordar a Paixão, Ressurreição e glória do Senhor Jesus e dar graças a Deus que os ‘regenerou para uma esperança viva pela Ressurreição de Jesus Cristo de entre os mortos’ (1Pd 1,3)”, também sublinha o documento conciliar.
Os santos padres, primeiros teólogos da Igreja, ensinaram que, com a ressurreição de Jesus, o dia santo de guarda, que até então era o sábado, em recordação do dia em que Deus descansou após a criação, passou para o domingo, dia da “nova criação”. Nesse sentido, o domingo, além de ser o primeiro dia da semana, é também “o oitavo dia”, que marca não só o início do novo tempo, mas também o seu fim no “século futuro”, isto é, na eternidade. São Basílio explica que o domingo significa o dia realmente único que virá após o tempo atual, sem fim, que não conhecerá tarde nem manhã, “o prenúncio incessante da vida sem fim, que reanima a esperança dos cristãos e os estimula no seu caminho”.
Ciclos
Como as estações do ano, os ciclos litúrgicos ajudam os fiéis a vivenciarem o mistério salvífico no decurso do ano.
O primeiro é o ciclo do Natal, antecedido pelas quatro semanas do Tempo do Advento, que, como o próprio nome indica, é o período de preparação espiritual para a chegada do Senhor na celebração de sua natividade e, ao mesmo tempo, manifestação da espera da segunda vinda do Senhor. Esse tempo, que termina na tarde do dia 24 de dezembro, é caracterizado pela cor roxa dos paramentos litúrgicos.
do Natal do Senhor, caracterizada pela cor branca, dando início ao período que se conclui na festa do Batismo do Senhor. Neste ciclo, também são celebradas as festas da Sagrada Família, de Santa Maria Mãe de Deus e da Epifania do Senhor.
Tempo comum
Após o Tempo do Natal, inicia-se o Tempo Comum, ciclo de 33 ou 34 semanas, dividido em duas partes, sendo que a primeira se estende até a véspera da Quarta-feira de Cinzas e a segunda começa após a Solenidade de Pentecostes e perdura até a conclusão do ano litúrgico. Nesse período, marcado pela cor verde, a Igreja convida os fiéis a vivenciarem o mistério de Cristo manifesto na vida ordinária.
Durante esse ciclo, também são celebradas outras solenidades “cristológicas”, como Santíssima Trindade, Corpus Christi e Sagrado Coração de Jesus. E, ao longo de todo o ano litúrgico, também acontecem as celebrações relacionadas à Virgem Maria e aos santos, sempre tendo como referência o mistério pascal.
Páscoa
O Ciclo da Páscoa começa na Quarta-feira de Cinzas, que abre a Quaresma, período penitencial de 40 dias, em referência aos 40 anos do povo hebreu rumo à terra prometida e os 40 dias de Jesus no deserto. A cor litúrgica desse tempo é a roxa.
Em seguida, no Domingo de Ramos, começa a Semana Santa, que culmina no Tríduo Pascal, seguido do Domingo da Páscoa da Ressurreição, quando se dá início ao período solene de 50 dias, passando pela Ascensão do Senhor e que se encerra em Pentecostes.
Arquitetura espiritual
Doutor em Sagrada Liturgia e professor da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), Padre Valeriano dos Santos Costa ressaltou a “arquitetura espiritual” do ano litúrgico cristão como algo em comparação com outros sistemas religiosos.
“O ano litúrgico é uma pessoa concreta: Jesus Cristo. Uma pessoa concreta que realizou uma obra concreta. […]. Não é possível separar Jesus e sua obra. O ano litúrgico é a garantia dessa unidade”, explicou o liturgista no livro “Celebrar o amor na plenitude do tempo”.
O professor define que o ano litúrgico deve ser compreendido a partir do eixo da salvação que Cristo trouxe à humanidade. “Cada ciclo do ano litúrgico promove o derramamento do mesmo amor-ágape que os apóstolos testemunharam na esplanada do Templo no dia de Pentecostes”, frisou, acrescentando que “não há força mais atuante de restauração do ser humano do que a liturgia da Igreja celebrada ao longo do ano litúrgico. “Portanto, celebrar o ano litúrgico é manter-se em Cristo como um galho no tronco a fim de se receber a seiva”, completou.
Como é definida a data da Páscoa?
A comemoração da Páscoa cristã não acontece em uma data fixa anual. Isso se deve ao fato de esta celebração estar associada à tradição judaico-cristã. Como os textos bíblicos afirmam, Jesus morreu em uma sexta-feira antes da Páscoa judaica (Pessah, na língua hebraica), que segundo o calendário próprio, baseado nos ciclos lunares, acontece sempre na primeira lua cheia após o equinócio da primavera no Hemisfério Norte. O equinócio é um fenômeno natural relacionado à posição do sol em relação à terra, que faz com que o dia e a noite durem exatamente o mesmo tempo. Isso ocorre entre os dias 20 e 21 de março.
Como a Ressurreição de Jesus é celebrada no domingo, a Páscoa cristã acontece sempre no primeiro domingo após a primeira lua cheia depois do equinócio da primavera no Hemisfério Norte (outono no Hemisfério Sul).
A data da Páscoa e as solenidades móveis decorrentes dessa celebração são sempre anunciadas durante a solenidade da Epifania no novo ano litúrgico. Em 2022, o Domingo de Páscoa será em 17 de abril.