Paixão, Morte e Ressurreição de Cristo: Eis o Mistério da Fé!

Nas celebrações e ritos do Tríduo Pascal, os cristãos participam do momento central da liturgia cristã e memorial da Paixão, Morte e Ressurreição de Jesus.

Conforme aponta o Catecismo da Igreja Católica (CIC), “o mistério pascal da cruz e ressurreição de Cristo está no centro da Boa-Nova que os Apóstolos, e depois deles a Igreja, devem anunciar ao mundo” (CIC 571); e “partindo do Tríduo Pascal, como da sua fonte de luz, o tempo novo da ressurreição enche todo o ano litúrgico da sua claridade” (CIC 1168).

Assim, entender o significado do que se celebra nesses dias é fundamental para que se possa dar verdadeiro testemunho de vida cristã.

MISSA VESPERTINA DA CEIA DO SENHOR

Luciney Martins/O SÃO PAULO
“Ele, verdadeiro e eterno sacerdote, oferecendo-se a vós pela nossa salvação, instituiu o Sacrifício da nova Aliança e mandou que o celebrássemos em sua memória. Sua carne, imolada por nós, é o alimento que nos fortalece. Seu sangue, por nós derramado, é a bebida que nos purifica”.
(Missal Romano - Prefácio da Santíssima Eucaristia, I, p.439)

O Tríduo Pascal é iniciado Quinta-feira Santa com a Missa Vespertina da Ceia do Senhor. “Jesus fez desta última ceia com os Apóstolos o memorial da sua oblação voluntária ao Pai para a salvação dos homens: ‘Isto é o meu Corpo, que vai ser entregue por vós’ (Lc 22,19). ‘Isto é o meu ‘Sangue da Aliança’, que vai ser derramado por uma multidão, para remissão dos pecados’(Mt 26,28)” (CIC 610).

Assim, na Última Ceia, o Senhor instituiu a Eucaristia ao oferecer o Seu Corpo e o Seu Sangue sob as espécies do Pão e do Vinho – e, também, o Sacerdócio. “Jesus incluiu os Apóstolos na sua própria oferenda e pediu-lhes que a perpetuassem. Desse modo, instituiu os Apóstolos como sacerdotes da Nova Aliança: ‘Eu consagro-me por eles, para que também eles sejam consagrados na verdade’ (Jo 17,19)” (CIC, 611). 

E o sacerdócio instituído por Cristo inclui a dimensão de servir o próximo, pois o próprio Mestre deu o exemplo com o rito do lava-pés, conforme explicou o Cardeal Odilo Pedro Scherer na homilia da Missa da Ceia do Senhor em 2022: “Era costume que os servos do dono da casa lavassem os pés dos convidados quando estes chegavam. Jesus, porém, o faz no final da ceia não simplesmente como uma hospitalidade comum, mas ligando-o com uma atitude que deve nos acompanhar quando celebramos a Eucaristia: Jesus pôs a água na bacia e começou a lavar os pés dos apóstolos. No final deste gesto, Ele explica: ‘se eu lavei os pés vocês, também vocês devem lavar os pés uns dos outros. Façam isto lembrando de mim [‘Eis que lhes dei o exemplo, para que, como eu fiz, vocês também o façam’ (Jo 13,15)]. Lavar os pés era um gesto simbólico naquele momento, pois significava uma atitude de colocar-se a serviço uns dos outros, de verdadeira fraternidade, de solicitude, de cuidado uns com os outros”. 

Ao término da Missa da Ceia do Senhor ocorre a vigília e adoração ao Santíssimo Sacramento, uma piedosa tradição pela qual os fiéis recordam a agonia e oração do Senhor no monte das Oliveiras, e assumem a atitude de vigília e oração que Cristo pediu aos apóstolos (cf. Lc 22, 39-46). 

CELEBRAÇÃO DA PAIXÃO DO SENHOR

Luciney Martins/O SÃO PAULO
“Ó Deus, pela Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo, destruístes a morte que o primeiro pecado transmitiu a todos. Concedei que nos tornemos semelhantes ao vosso Filho e, assim como trouxemos, pela natureza, a imagem do homem terreno, possamos trazer, pela graça, a imagem do homem novo.” 
(Missal Romano, p.254, 2a opção).

A Sexta-feira Santa é marcada pelo silêncio, oração e jejum, tendo como ponto alto a celebração da Ação Litúrgica da Paixão do Senhor, às 15h, horário em que o Cristo foi morto. “A morte de Cristo é, ao mesmo tempo, o sacrifício pascal que realiza a redenção definitiva dos homens por meio do ‘Cordeiro que tira o pecado do mundo’, e o sacrifício da Nova Aliança que restabelece a comunhão entre o homem e Deus, reconciliando-o com Ele pelo ‘sangue derramado pela multidão, para a remissão dos pecados” (CIC 613).

Essa ação litúrgica é iniciada em profundo silêncio. Quem a preside se prostra diante do altar desnudado enquanto a assembleia de fiéis se ajoelha, simbolizando a coparticipação no sofrimento do Senhor e a humilhação do homem terreno. Na liturgia é proclamada a narrativa da Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo o Evangelho de João (Jo 18,1–19,42), que apresenta em detalhes o drama da morte de Cristo.

Nesta celebração também ocorre a Oração Universal, após a homilia, em que são dirigidas preces a Deus pela Santa Igreja, pelo Papa, por todas as ordens e categorias de fiéis, pelos catecúmenos, pelos que creem no Cristo, pelos judeus (aos quais o Senhor Deus falou em primeiro lugar), pelos que não creem no Cristo, pelos que não reconhecem a Deus, pelos governantes e pelos que sofrem provações. 

Um dos momentos centrais é a Adoração à Santa Cruz, uma tradição iniciada por volta do século IV, quando se venerava a Cruz em que Cristo foi crucificado, a qual estava conservada em Jerusalém. A cruz, revestida com um pano vermelho, é solenemente apresentada à comunidade e, posteriormente, desnudada pelo presidente da ação litúrgica. Depois, é colocada à frente do presbitério para a veneração dos fiéis, que podem tocá-la e beijá-la. O Catecismo da Igreja Católica ensina que “a cruz é o único sacrifício de Cristo, mediador único entre Deus e os homens. Mas porque, na sua pessoa divina encarnada. ‘Ele Se uniu, de certo modo, a cada homem’, ‘a todos dá a possibilidade de se associarem a este mistério pascal, por um modo só de Deus conhecido’. Convida os discípulos a tomarem a sua cruz e a segui-Lo porque sofreu por nós, deixando-nos o exemplo, para que sigamos os seus passos” (CIC 618).

E ainda que não se celebre a Eucaristia neste dia, posto que todo o ato é dedicado ao memorial da Paixão e Morte de Jesus, é feita a comunhão eucarística, com as hóstias que foram consagradas na missa da noite anterior, gesto que também expressa a participação dos fiéis na morte salvadora de Cristo.

Ainda na Sexta-feira Santa é realizada a Via-sacra ou “Via-crucis”, uma tradição que ajuda a meditar, por meio das 14 estações, o caminho doloroso que Jesus percorreu até ser crucificado e morto no Monte Calvário.

SÁBADO SANTO

A manhã e a tarde do Sábado Santo são próprias para o silêncio. Cristo está no sepulcro, desceu à mansão dos mortos, ao mais profundo da condição humana. Aquele que é o Verbo está calado depois de ter dado seu último grito na cruz. Em oração, toda a Igreja permanece à espera de Sua Ressurreição. 

“No seu plano de salvação, Deus dispôs que o seu Filho não só ‘morresse pelos nossos pecados’ (1 Cor 15,3), mas também ‘saboreasse a morte’, isto é, conhecesse o estado de morte, o estado de separação entre a sua alma e o seu corpo, durante o tempo compreendido entre o momento em que expirou na cruz e o momento em que ressuscitou. Este estado de Cristo morto é o mistério do sepulcro e da descida à mansão dos mortos. É o mistério do Sábado Santo, em que Cristo, depositado no túmulo, manifesta o repouso sabático de Deus depois da realização da salvação dos homens, que pacifica todo o universo” (CIC 624). 

SOLENE VIGÍLIA PASCAL

Luciney Martins/O SÃO PAULO
“Segundo uma antiquíssima tradição, esta é a noite de vigília em honra do Senhor (Ex 12,42). Os fiéis, tal como recomenda o Evangelho (Lc 12,35-36), devem assemelhar-se aos criados que, com as lâmpadas acesas nas mãos, esperam o retorno do seu senhor para que, quando esse chegar, os encontre velando e os convide a sentar à sua mesa” (Missal Romano, p.275).

Na noite do Sábado Santo, a Igreja convida seus filhos a se reunirem em vigília e oração para o momento em que Cristo, o Cordeiro de Deus que tirou o pecado do mundo, morrendo destruiu a morte e ressuscitando restaurou a vida. 

Essa que é considerada a mãe de todas as vigílias começa com o Lucernário, que compreende a bênção do fogo novo e do Círio Pascal: inicialmente, quem preside a vigília grava a cruz no Círio; depois o ornamenta com as letras gregas Alfa e Ômega – ‘Cristo ontem e hoje, Princípio e Fim, Alfa e Ômega. Dele é o tempo e a eternidade. A Ele a gloria e o poder. Pelos séculos dos séculos’ –; e com os cinco cravos, que simbolizam as chagas de Cristo na cruz. O Círio, então, é aceso (simbolizando o Cristo ressuscitado, a luz do mundo) e a partir dele são acessas as velas dos fiéis. Em procissão, todos adentram ao templo – que está com as luzes apagadas – tendo a frente o Círio Pascal, a luz que guia em meio às trevas e que indica o caminho à terra prometida. 

Com todos em pé e com as velas ainda acessas, o presidente da celebração incensa o Círio Pascal e, então, há a proclamação da Páscoa, com o canto Exulte, que anuncia a alegria pela vitória de Cristo sobre as trevas. 

Na sequência, a Liturgia da Palavra perpassa toda a história da salvação, mostrando como outrora Deus salvou o seu povo e agora envia seu Filho como o Redentor da humanidade. Ocorre quase que como um diálogo: Deus se dirige ao povo por meio das leituras (sete ao todo) e este lhe responde com salmos e orações. Antes da passagem ao Novo Testamento – com duas leituras, uma delas extraída das cartas de Paulo e outra a proclamação do Evangelho –, é entoado o canto do Glória e todas as luzes do templo se acendem, em sinal de que Deus iluminou esta noite santa com a glória da Ressurreição do Senhor e faz despertar na Igreja o espírito filial para que todos, inteiramente renovados, possam Servi-lo de todo o coração. 

Também é parte desta celebração a Liturgia Batismal. Estando a comunidade reunida para testemunhar a passagem de Cristo da morte para a vida, ela mesma renasce e terá vida nova por meio dos sacramentos: pelo Batismo, será incorporada a Cristo em sua Páscoa; pela Crisma, receberá o Espírito Santo; pela Eucaristia, participará do memorial da Morte e Ressurreição do Senhor. 

Esse momento da liturgia compreende a Ladainha de todos os santos (pela qual a Igreja peregrina sobre a terra se une à Jerusalém celeste), a bênção da água e sua aspersão na assembleia de fiéis, a administração dos sacramentos do Batismo e da Confirmação aos catecúmenos que se preparam para tal; e a renovação das promessas batismais – “renovemos as promessas do nosso Batismo, pelas quais já renunciamos a satanás e suas obras, e prometemos servir a Deus na Santa Igreja Católica”.

Por fim, ocorre a Liturgia Eucarística, o ápice da Noite Pascal e de toda a vida sacramental da Igreja, em que Cristo Ressuscitado nos faz participar do Seu Corpo e do Seu Sangue, como memorial de Sua Páscoa.

DOMINGO DA PÁSCOA DA RESSURREIÇÃO DO SENHOR

Luciney Martins/O SÃO PAULO
“Na verdade, é justo e necessário, é nosso dever e salvação dar-vos graças, sempre e em todo o lugar, mas sobretudo neste dia em que Cristo, nossa Páscoa, foi imolado. Ele é o verdadeiro Cordeiro, que tira o pecado do mundo. Morrendo, destruiu a morte e, ressurgindo, deu-nos a vida”
(Prefácio da Páscoa I, Missal Romano, p.421).

Data mais importante do calendário litúrgico católico, o Domingo de Páscoa celebra a vitória da vida sobre a morte. “‘A ressurreição de Jesus é a verdade culminante da nossa fé em Cristo, acreditada e vivida como verdade central pela primeira comunidade cristã, transmitida como fundamental pela Tradição, estabelecida pelos documentos do Novo Testamento, pregada como parte essencial do mistério pascal, ao mesmo tempo que a cruz: ‘Cristo ressuscitou dos mortos. Pela Sua morte vence a morte aos mortos deu a vida’ (Liturgia Bizantina, Tropário de Páscoa)” (CIC 638).

Assim, depois de morrer crucificado, ser sepultado e descer à mansão dos mortos, Cristo ressuscitou, seu espírito e seu corpo foram reunificados. “A fé na ressurreição tem por objeto um acontecimento, ao mesmo tempo historicamente testemunhado pelos discípulos (que realmente encontraram o Ressuscitado) e misteriosamente transcendente, enquanto entrada da humanidade de Cristo na glória de Deus” (CIC 656).

Na missa da Páscoa da Ressurreição do Senhor também é realizada a bênção da água e a aspersão sobre os fiéis, na qual a comunidade reunida bendiz a Deus por tudo o que fez por meio da água ao longo da História da Salvação, implorando-Lhe que, hoje, também esse sinal atualize o Espírito de vida sobre os batizados: “Que esta água seja para nós uma recordação do nosso Batismo e nos faça participar da alegria dos que foram batizados na Páscoa”. 

Antes da proclamação do Evangelho é entoada a Sequência Pascal, que estruturada como um hino tem uma introdução – “Cantai, cristãos, afinal/ Salve, ó vítima pascal/ Cordeiro inocente, o Cristo/ Abriu-nos do Pai o aprisco/ Por toda ovelha, imolado/ Do mundo lava o pecado/ Duelam forte e mais forte/ É a vida que vence a morte”; um diálogo entre os apóstolos e Maria Madalena, que vira o túmulo vazio – “Responde, pois, ó Maria/ No caminho, o que havia?”; e é concluída na alegria de que  “O Cristo que leva aos céus/ Caminha à frente dos seus/ Ressuscitou de verdade/ Ó Cristo Rei, piedade”. 

Eis o mistério da fé: a Paixão, Morte e Ressurreição de Cristo para a nossa salvação. “A Páscoa não é simplesmente uma festa entre outras: é a ‘festa das festas’, a ‘solenidade das solenidades’ (…) O mistério da ressurreição, em que Cristo aniquilou a morte, penetra no nosso velho tempo com a sua poderosa energia, até que tudo Lhe seja submetido” (CIC 1169). 

(Fontes: Missal Romano, Catecismo da Igreja Católica, folheto O Povo de Deus em São Paulo e sites CNBB, Vatican News e Canção Nova)
(Edição do conteúdo: Daniel Gomes/O SÃO PAULO)

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