Ensino, tradição e inovação pautam o novo curso de Direito da Faculdade de São Bento

O início das atividades está previsto para agosto. Aulas acontecerão nas dependências do complexo do mosteiro beneditino, no centro de São Paulo. 

Um dos diferenciais do curso de Direito da Faculdade de São Bento será a aplicação prática dos conhecimentos jurídicos já no 1º semestre
Fotos: Luciney Martins/O SÃO PAULO

Um ambiente especial, com arquitetura e infraestrutura que incitam o pensar, incluindo uma biblioteca com quatro séculos de história, composta por mais de 100 mil títulos, com exemplares de livros antigos, desde incunábulos (livros dos primeiros tempos da imprensa) do século XV até obras do século XX, além de coleções de periódicos. 

Toda essa estrutura agora está disponível também para quem decidir cursar o bacharelado de Direito da Faculdade de São Bento de São Paulo, mantida pelo tradicional Mosteiro de São Bento. 

Estão abertas, até 31 de agosto, as inscrições para o processo seletivo de preenchimento de vagas para este novo curso de graduação da Faculdade, que terá duração de cinco anos. Outros detalhes podem ser obtidos no site da instituição, acessível pelo link

Para a primeira turma, haverá desconto de 25% no valor total durante toda a graduação. As aulas serão presenciais, com turmas no matutino e no noturno, cada uma composta por uma média de 35 alunos. 

No dia 11 de agosto, haverá uma aula magna, com horário a ser definido, na sede da instituição, que fica ao lado do metrô São Bento (Linha 1 – Azul), no centro da capital paulista. 

TRADIÇÃO CENTENÁRIA 

Fundada em 1908, dentro do Mosteiro da Ordem Beneditina, a Faculdade de São Bento foi a primeira faculdade livre de Filosofia do Brasil. 

No início, a instituição era filiada à Universidade de Louvain, na Bélgica, que reconhecia os graus acadêmicos. Em 1940, os cursos da São Bento passaram a ser reconhecidos no Brasil pelo Ministério da Educação (MEC). 

Em 1946, a pedido da Arquidiocese de São Paulo, a Faculdade passou a integrar o núcleo que deu origem à Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Contudo, continuaram a ocorrer no Mosteiro cursos internos de Filosofia. 

Ao longo das décadas, o Mosteiro continuou educando e formando alunos principalmente nas áreas de Teologia e Filosofia. Em 2002, a Faculdade retomou suas atividades acadêmicas no Largo São Bento, com cursos reconhecidos pelo MEC, como o recente bacharelado em Direito. 

“São cursos clássicos que seguem uma linha comum. Eles retomam a tradição do ensino e, principalmente, uma tradição muito clássica da Igreja, que é ensinar a partir das fontes, dos textos e dos principais autores”, diz, ao O SÃO PAULO, o diretor acadêmico da instituição, professor Claudenir Módolo Alves. 

A instituição oferece ainda cursos de extensão em diferentes áreas. “Atuamos na área da Filosofia, Teologia, Direito, Espiritualidade, Línguas e Artes”, lista Alves. “Temos, ainda, uma especialização lato sensu em Patrística, que é única no Brasil”, recorda. 

Alves afirma que os cursos compõem a identidade da Faculdade, que é sólida e no âmbito da tradição. “Quando falamos em tradição, nos referimos desde a Grécia Antiga, passando por Roma. Depois, toda a história da Igreja que compõe essa tradição cultural em que ela se insere e que contribuiu muito para o mundo ocidental. Parte da identidade da Faculdade se assenta nisso.” 

TRADIÇÃO E INOVAÇÃO 

A nova graduação da São Bento está pautada no tripé excelência no ensino, tradição e inovação. O coordenador do curso de Direito, professor Luiz Roberto Guimarães Erhardt, mais conhecido como Professor Mac, explica como será na prática essa junção. 

“A inovação que estamos traçando está vinculada, principalmente, à matéria prática. Buscamos fazer uma faculdade que tem excelência na transferência de conhecimentos teóricos, focando muito a questão prática, de forma que, ao concluir o curso, o aluno consiga uma inserção mais fácil no mercado de trabalho”, explica. 

Erhardt, que também administra empresas de advocacia, comenta que não é difícil esbarrar com advogados recém-formados que demonstram falta de prática na elaboração de peças muito simples, como uma procuração. Coisas que ele afirma que deveriam ser feitas por estagiários. 

“Percebo que os recém-formados têm certa deficiência, inclusive na escrita, porque há uma dependência muito grande de corretor de texto, da forma da escrita de WhatsApp etc.”, relata Erhardt. “Hoje, quando nos deparamos com peças feitas por advogados recém-formados, temos dificuldade de entender o que se pretende com o processo”, comenta. 

“Por isso, nessa parte de inovação, queremos passar para o aluno a estratégia jurídica, para que ele entenda um processo e já comece a pensar nele como um jogo de xadrez. Pensar quais são as ações, as investidas necessárias, prevendo qual será a resposta da parte contrária e, assim, poder traçar uma estratégia”, acrescenta. 

Ao focar a prática profissional, o curso de Direito da São Bento se diferencia do que é ofertado, de modo geral, em cursos padrões. Somando com a tradição da Faculdade, essa inovação mira na escrita, “para a pessoa conseguir colocar no papel o que ela realmente tem que dizer. E, assim, conseguir passar informação”, frisa o coordenador. 

SABER APLICADO NA PRÁTICA 

A prática jurídica será inserida a partir do primeiro semestre. “Normalmente, nos cursos padrões, isso só ocorre a partir do quarto, quinto semestre, sendo oferecido primeiro o conhecimento e depois a aplicação no final do curso. Nós queremos dar o conhecimento junto com a aplicação”, afirma Erhardt. 

Tal prática será gradativa. “Mostraremos como funciona um escritório. Como se faz a captação do cliente, a leitura dos anseios do cliente, como se elabora uma proposta de honorários”, explica. “O aluno entenderá a parte administrativa do escritório, como montar uma procuração até a elaboração do processo propriamente dito da petição inicial, que já seria uma fase bem mais adiantada.” 

Sobre estimular a capacidade de raciocínio do estudante, Erhardt diz que a Faculdade quer também “formar grandes pensadores que consigam se inserir no mercado de trabalho e nele vencer. Queremos selecionar os alunos para formar grandes pensadores. Por isso, buscamos um caminho mais vinculado a faculdades que buscam ensinos diferenciados de excelência”, frisa. 

Em concordância com as novas demandas do mercado jurídico, o curso oferece disciplinas de novos temas como Direitos Humanos; Direito Financeiro e Direito Digital e Cibernético. 

A respeito dos desafios inerentes à abertura de um novo curso, Erhardt acredita que a localização da instituição e sua própria história são vantagens que fortalecem a credibilidade da graduação. 

“Estar dentro de uma instituição com mais de 100 anos dá uma solidez enorme. Você sabe, por exemplo, que ela não será vendida para um segundo grupo e que os fundamentos serão mantidos. Afinal, estamos dentro de uma expressão católica e de um prédio centenário”, enfatiza. 

CORPO DOCENTE E PERFIL DOS ESTUDANTES 

Erhardt recorda que, assim que houve a divulgação do curso no site da Faculdade, muitas pessoas e professores, alguns já ligados ao Mosteiro, se apresentaram com currículos muito fortes. “Estamos formando um corpo docente muito sólido com mestres, doutores, juízes, pessoas vinculadas ao tribunal de impostos e taxas”, assegura. 

A divulgação também atraiu pessoas em busca do curso. Por isso, optou-se em iniciar o ano letivo já no mês de agosto. No primeiro momento, a Faculdade acreditava que nesse período atrairia alunos em busca da segunda graduação. Erhardt conta, entretanto, que 90% das pessoas que demonstraram interesse nesse bacharelado é para fazer sua primeira graduação: “Há um perfil muito jovem”. 

Outro ponto destacado por Erhardt é que a Faculdade incentivará o contato do professor com cada aluno. “Queremos que, no primeiro mês, os professores estejam chamando os alunos pelos nomes. Que haja mesmo uma troca de confiança e de conhecimento”, comenta. 

UM AMBIENTE QUE ESTIMULA O SABER 

Em relação ao ambiente com que os novos alunos passarão a ter contato, Erhardt afirma que a principal preocupação da instituição é para que não haja nenhum tipo de doutrinação. 

“Somos uma faculdade naturalmente tradicional, mas não será um curso em que será dado teologia católica para o estudante. Claro que ficaremos dentro dos conceitos da Igreja, a tradição e todos os princípios serão respeitados, mas lecionaremos o Direito como está escrito na linguagem dos homens, nos códigos, conforme as regras do MEC para o curso”, assegura Erhardt, lembrando, porém, que aqueles que tiverem interesse poderão participar de cursos abertos sobre o Direito Canônico. 

Com mais de 420 anos de existência, o Mosteiro de São Bento tem uma importante atuação na história espiritual e cultural de São Paulo, que inclui suas realizações educacionais por meio do Colégio de São Bento, fundado em 1903, e pela própria Faculdade. Nesses espaços passaram ilustres ex-alunos, de intelectuais a artistas, como o escritor Oswald de Andrade (1890-1954) e o jurista André Franco Montoro (1916- 1999), que foi governador de São Paulo entre 1983 e 1987. 

Em 2007, o histórico Mosteiro hospedou o Papa Bento XVI, durante sua viagem apostólica ao País. 

CONTRIBUIÇÃO DOS BENEDITINOS NA EDUCAÇÃO 

A ordem beneditina foi fundada por São Bento, em 529, no convento italiano de Monte Cassino, com monges comprometidos com os votos de pobreza, amor a Deus e com o trabalho. 

Embora tenham passado pelas terras brasileiras antes de 1581, foi a partir deste ano que os monges da Ordem Beneditina se estabeleceram definitivamente no País, quando o primeiro grupo chegou a Salvador (BA), enviado pelo abade-geral da Congregação Beneditina de Portugal. 

Os beneditinos chegaram a São Paulo em 1598, mas somente em 1634 foi criada a abadia, e a capela foi dedicada a São Bento. 

Além das atividades relacionadas à vida monástica, os beneditinos realizam no Brasil atividades externas, que, entre outras coisas, têm como destaque a contribuição para a educação. 

Na dissertação de mestrado “A influência dos beneditinos na educação brasileira – Subsídios para a história da educação no Brasil”, apresentada, em 1984, por Adão Gonçalves da Mota à Universidade Federal Fluminense, o autor recorda que, embora a atividade educacional não constituísse uma destinação específica dos mosteiros de São Bento, “já no início da Idade Média, os mosteiros se aplicavam com igual empenho em dois objetivos educacionais: ensinavam as letras e o cultivo da terra” e, mesmo sem terem formulado um plano educacional, os mosteiros beneditinos transformaram-se em grandes centros de cultura. 

“Onde quer que se estabelecessem os mosteiros, um ou mais religiosos eram designados para instruir os filhos dos habitantes da terra […] O mosteiro da Paraíba, já antes da invasão holandesa [ao estado], mantinha aulas de latim, as quais foram restabelecidas em 1669 com o retorno dos monges à abadia. Na mesma época, havia no mosteiro de Sorocaba [SP], recentemente fundado, um curso de língua latina para os filhos de moradores da vila”, consta em outro trecho da dissertação de Mota. 

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