Jovens estão prontos para compartilhar saberes no encontro da ‘Economia de Francisco’

Atividade presencial ocorrerá em Assis, entre os dias 22 e 24, com o objetivo de consolidar caminhos para novos modelos econômicos centrados na dignidade do ser humano

Quando convidou jovens economistas, empresários e outros atores sociais a repensar o modelo econômico global com vistas a “uma economia diferente, que faça as pessoas viverem e não mate, inclua e não exclua, humanize e não desumanize, cuide da Criação e não a deprede”, conforme escreveu em maio de 2019, o Papa Francisco certamente não imaginava que o planeta seria assolado pela COVID-19. 

O processo chamado de “Economia de Francisco” (The Economy of Francesco – EoF) – nome alusivo a São Francisco de Assis e ao modo como ele viveu de modo coerente o Evangelho – previa a realização de um encontro presencial na cidade de Assis, na Itália, em março de 2020, mas este foi adiado em razão da pandemia. 

“Gestão e doação”; “Finanças e humanidade”; “Agricultura e justiça”; “Energia e pobreza”; “Vocação e lucro”; “Políticas para a felicidade”; “CO2 da desigualdade”; “Negócios e paz”; “Economia é mulher”; “Empresas em transição”; e “Vida e estilos de vida”. 

Nesta semana, entre os dias 22 e 24, mais de mil jovens de todo o mundo, incluindo cerca de cem que vivem no Brasil, estarão em Assis para a etapa presencial da “Economia de Francisco”. Ao O SÃO PAULO, quatro deles falaram de suas expectativas para o encontro mundial e as reflexões ao longo dos últimos dois anos. 

ALAN FARIA 

‘Que este encontro nos ajude a ter esperanças nos nossos trabalhos’ 

Advogado e doutorando em Direito pela PUC-SP, Alan Faria Andrade Silva, 36, participa da vila “CO2 da desigualdades”. Ele contou à reportagem que no evento presencial deseja auxiliar na implementação da EoF na área jurídica e acadêmica jurídica: “Espero que este encontro nos ajude a animar mais e ter esperanças nos nossos trabalhos que estamos desenvolvendo”. 

Alan Faria integra o grupo de jovens “Guardiões e Servidores”, que se coloca a serviço da EoF na América Latina e Caribe. O advogado ajudou a promover encontros presenciais para ampliar os conhecimentos das pessoas acerca da “Economia de Francisco e Clara” – no Brasil o nome da Santa foi incluído para ressaltar o papel feminino na família franciscana e a importância da mulher na economia global. Um desses eventos ocorreu em 23 de junho na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp). 

O advogado ressaltou que a “Economia de Francisco” não é um movimento religioso e ou sociopolítico, “mas reconhecemos nos documentos da EoF e no magistério do Papa Francisco que ‘devemos iniciar processos e não ocupar espaço’, como bem ele ressaltou na Evangelii gaudium. Iniciar processos para mim também passa pela dimensão humana e espiritual, principalmente a espiritual, quando busco reconhecer a voz do bom Espírito para fazer alguma coisa em prol da EoF”, disse. “Na Alesp, o encontro foi inusitado, pois muitos deputados esperavam que íamos tratar de religião. E tratamos, mas na perspectiva da EoF e suas propostas para uma sociedade mais justa e fraterna, e conseguimos reunir os polos para um diálogo”, detalhou. 

FRANCHESCO 

‘Todos temos muito a compartilhar e aprender’ 

O boliviano Franz Lopez Paredes, 35, vive em São Paulo. Empreendedor e formado em Comércio Internacional, ele participa do ramo jovem da Associação de Dirigentes Cristãos de Empresa (ADCE Jovem). Na EoF está na vila “Vocação e lucro”. 

Franchesco, como é mais conhecido, estará em Assis para “um encontro que irá despertar muitos jovens sobre sua vocação empresarial, um evento em que, certamente, todos temos muito a compartilhar e aprender, e sairemos repletos de esperança e de propostas para transformar o mundo em um local melhor”. 

Ele enfatizou que empreender e zelar pelo bem comum não são coisas incompatíveis, como bem tem aprendido nos grupos de reflexão e vivência do programa Empresa com Valores da ADCE, no qual visualiza ser possível “atuar com fraternidade e responsabilidade social empresária, construindo uma economia mais justa, solidária e humana, que é o pedido do Papa na ‘Economia de Francisco’, uma nova economia”. 

O empreendedor estimula que os jovens conheçam melhor as iniciativas de negócio que já são feitas em conformidade com os valores cristãos, como é o caso, segundo ele, das empresas associadas à União Cristã Internacional de Dirigentes de Empresas (Uniapac) latino-americana, à qual a ADCE é vinculada. 

AUGUSTO LUÍS E ANA CAROLINA 

‘A vida é a principal riqueza da humanidade’ 

O casal Augusto Luís Pinheiro Martins e Ana Carolina Fernandes Alves, da Arquidiocese de Cascavel (PR), também estará em Assis. A mestra em Economia e o jovem filósofo, teólogo e pós-graduado em Análise Comportamental e Clínica criaram o projeto “Educação Financeira para a Vida” (EFV), que une a economia à espiritualidade e à Doutrina Social da Igreja, a partir da espiritualidade Franciscana e Inaciana, apresentando conteúdos por meio de podcasts, cursos e formações. 

“O Educação Financeira para a Vida surgiu como resposta ao chamado do Papa e sintetiza aquilo que o Pontífice desejou: que não caiamos em um consumismo febril, porque, como já dizia Bento XVI na encíclica Caritas in veritate, comprar é sempre um ato moral para além do econômico. O EFV permite que as pessoas entendam os seus comportamentos financeiros, suas decisões e sua capacidade de escolha em relação às finanças de uma forma integral”, detalhou Augusto Luís, que participa da vila “Trabalho e cuidado”. 

O filósofo comentou, ainda, que especificamente no caso do Brasil, o que se propõe na “Economia de Francisco e Clara” é uma diaconia dos serviços que já existem, a fim de conectar “todas as esferas que são rotas alternativas ao atual modelo econômico”. 

Ana Carolina, que integra a vila “Finanças e humanidade”, lembrou que um dos principais pontos que diferencia a ‘Economia de Francisco’ do sistema econômico atual é o fato de que nela “a vida é colocada em primeiro lugar, é a principal riqueza do sistema econômico, ou seja, está no centro de todas as decisões, políticas e trabalhos, algo que diverge da economia que temos hoje, que gera desigualdade, injustiça e morte”. 

Ainda de acordo com a mestra em Economia, nesse sonhado modelo econômico, o ser humano é o principal agente e se supera uma lógica consumista. “Quando eu sou agente participante dessa mudança, eu começo a cuidar da Criação, das relações de trabalho, da relação com o dinheiro”, enfatizou. Também Augusto Luís lembra que, com o ser humano no centro das preocupações, será possível retomar o sentido de irmandade universal, segundo o qual homens e mulheres cumprem a vocação de guardiões da Criação, exercem sua cidadania, aprendendo “a cuidar do mais frágil, daquele que está em situação de vulnerabilidade social, que sofre injustiças sociais e econômicas. Portanto, é um cidadão que não está atento somente ao seu interesse, mas às necessidades de seu entorno, e, assim, vão se formando melhor as pessoas nas famílias, nas comunidades e nas empresas”. 

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