Gil Pierre de Toledo Herck
Quem nos separará do amor de Cristo? A tribulação? A angústia? A perseguição? (…) Tenho certeza de que nem a morte e nem a vida, nem os anjos nem os principados, nem o presente e nem o futuro, nem as potestades, nem a altura e nem a profundeza, nem outra criatura qualquer será capaz de nos separar do amor de Deus, que está em Cristo Jesus, Nosso Senhor (cf. Rm 8, 35-39).
Esta profissão de fé e de esperança de São Paulo, escrita já nos primeiros alvores do Cristianismo, foi sempre um farol luminoso para os cristãos que, a cada época, sofreram vários tipos de tormentas. Neste tempo em que nos cabe viver – no qual, dizem os estudiosos do assunto, são os cristãos o grupo religioso que mais sofre perseguição no mundo inteiro –, estes versículos foram magnificamente musicados pelo Monsenhor Marco Frisina, na música Chi ci separerà. Há inclusive uma bela versão bilíngue, em que as frases de São Paulo são acompanhadas de cenas de filmes, sobre os mártires cristãos das várias épocas – e vale a pena repassar brevemente por elas, para entendermos como é possível que, mesmo em face de perseguições tão constantes e extremas, a Igreja não apenas sobreviva, mas inclusive se fortaleça.
Primeiro, vemos o apóstolo Pedro, já um ancião de barba e cabelos grisalhos, sendo pregado numa cruz por soldados do imperador, e suspenso de ponta cabeça, diante de uma multidão de cristãos. Depois, mostram-se vários cristãos crucificados num circo, como espetáculo e zombaria da multidão que os assiste, ou ainda sendo lançados nas arenas, diante de cidadãos romanos com suas ricas togas, para serem devorados vivos por leões. Na sequência, avançamos até a Inglaterra de 1535, quando o rei Henrique VIII proíbe a religião católica, para assistir à execução de São João Fisher, o venerável bispo que, após meses de prisão injusta, é arrastado ao cadafalso vestido em trapos, e, antes de ser decapitado pelo crime de permanecer fiel a Cristo, abençoa seus carrascos e a multidão que assiste, desalentada, ao triste espetáculo.
Caminhamos mais um pouco no tempo, para o Japão do século XVII, quando o Cristianismo era absolutamente proibido, e vemos dois jovens padres jesuítas rezando a Santa Missa, escondidos num casebre com alguns fiéis, que participam com profunda devoção do sacrifício do altar, no mais estrito silêncio. Na Coreia, o jovem sacerdote André Kim foi executado em 16 de setembro de 1846, com apenas 25 anos de idade, junto com outros oito leigos. Vinte anos depois, uma terrível perseguição elevou para 103 o número de santos mártires coreanos.
Seminaristas diante da imagem de Santo André Kim Degun na paróquia pessoal coreana em SP
Enfim, vemos agora algumas imagens reais da perseguição promovida, em nossos dias, pelo Estado Islâmico: dezenas de jovens cristãos, amarrados e ajoelhados com seus macacões laranjas, prestes a ser executados; em Moçambique, vilas atacadas e queimadas.
Segundo a organização Portas Abertas, a Nigéria é hoje um dos lugares mais difíceis de ser cristão no mundo. Somente em 2015, mais de 4.028 homicídios e 198 ataques contra Igrejas foram registrados pela Organização.
É claro que devemos procurar dar todo apoio a nossos irmãos que sofrem perseguições de vários tipos, por causa de sua fé: acorrendo a suas necessidades materiais, e rezando por eles. Mas não percamos a esperança, nem fraquejemos: busquemos na vida dos santos o exemplo de como enfrentar as tormentas com confiança na bondosa Providência divina. Lembremos de um Thomas More, que pouco antes de seu martírio, consola sua filha dizendo: “Nada pode acontecer-me que Deus não queira. E tudo o que Ele quer, por muito mau que nos pareça, é, na verdade, muito bom” (cf. Catecismo, n. 313). Eis aí o combustível espiritual dos mártires: “tudo concorre para o bem daqueles que amam a Deus” (Rm 8, 28).