Incansável, aos 87 anos, o Papa Francisco partiu de Roma na segunda-feira, 2, rumo a uma longa missão. Ele começa uma jornada de 12 dias e mais de 40 horas de voo intercontinental. Trata-se da viagem mais longa do seu pontificado, que já dura 11 anos. Ele vai passar por quatro países na Ásia e na região da Oceania: Indonésia, Papua Nova Guiné, Timor-Leste e Cingapura.
Toda viagem papal é carregada de significado. Neste caso, são quatro países bastante diferentes entre si, mas todos marcados por algumas questões urgentes em comum: a pobreza e a desigualdade social, a necessidade de fortalecer o diálogo inter-religioso, a violência e a guerra, e a proteção e o cuidado do meio ambiente. “Peço que rezem pelos frutos desta viagem”, disse ele após a oração do Angelus do domingo, dia 1°.
Chegar mais perto
Se “a proximidade é o estilo de Deus”, como o Papa Francisco costuma dizer, é assim que ele busca viver sua missão pastoral: o mais próximo possível do povo.
Recentemente, mesmo com as dificuldades de locomoção e outros problemas de saúde mais ou menos graves – ou, talvez, por causa disso –, ele aumentou expressivamente o número de audiências privadas no Vaticano. Às vezes, em uma manhã, o Papa recebe quatro ou cinco oficiais do Vaticano e dois ou três grupos de centenas de pessoas. Nas audiências gerais de quarta-feira, em que ele encontra grande número de fiéis no Vaticano, ele tem cumprimentado, um a um, centenas de pessoas.
A longa viagem à Ásia e à Oceania já vinha sendo planejada há alguns anos, mas teve que ser adiada por causa da pandemia de COVID-19, em 2020 e 2021. O tempo passou, mas o Papa continuou firme na sua decisão de viajar. O novo contexto global, com uma acentuação das guerras “em pedaços”, em diferentes partes do mundo, não serviu de obstáculo, mas de motivação adicional.
A idade avançada e os problemas de saúde levaram observadores do Vaticano a questionar se seria possível dar mais esse passo. Francisco, entretanto, tem se mostrado vivaz e muito ativo.
Essa viagem é, além de tudo, uma demonstração de que o sucessor do apóstolo Pedro está consciente de suas decisões e quer continuar próximo das pessoas, do seu povo. Como de costume, ele vai encontrar autoridades da Igreja e da sociedade civil, bem como jovens, religiosos e seminaristas, visitará obras sociais e celebrará a Eucaristia.
Passo a passo
O Papa quer ser um sinal de esperança para aqueles que encontra. A primeira etapa da viagem é em Jacarta, capital da Indonésia, país de grande maioria muçulmana – quase 90% da população –, mas onde os cristãos gozam de relativa liberdade religiosa.
Na Indonésia, há boas experiências de diálogo inter-religioso, mas a difusão do extremismo islâmico é uma ameaça para as comunidades cristãs – algo reconhecido, inclusive, pelas autoridades locais. “Em geral, os católicos na Indonésia vivem em harmonia com o resto da nação, que, em sua grande maioria, professa o Islã. Perseguições, em comparação com a vastidão da nação, ocorrem somente em poucas áreas”, disse à imprensa o Cardeal IgnatiusSuharyo, Arcebispo de Jacarta.
“A presença física do Papa Francisco [na Indonésia] é incrivelmente importante, mas o que não é menos importante é aprender suas ideias, não se limitando à encíclica Fratelli tutti[‘Todos os Irmãos’], entre outras. Também podemos aprender seus princípios de vida”, disse Dom Ignatius Suharyo.
Da Fratelli tutti à Laudato si’
Já em Papua Nova Guiné, a maioria da população é cristã, cerca de 69%, dos quais mais ou menos a metade é católica e a outra metade, protestante. Ali, a pauta ambiental deve ser mais forte, pois o país ainda preserva grande parte de suas reservas e ambientes naturais, e isso vem sendo ameaçado pelo avanço da mineração e da indústria.
Como descreve a encíclica Laudato si’, do Papa Francisco, os problemas ambientais e sociais têm uma raiz comum. A visita à capital do país, Porto Moresby, deve mostrar a imensa diversidade cultural e étnica do país, cujos grupos e comunidades falam mais de 800 idiomas indígenas diferentes.
No Timor-Leste, país de língua portuguesa devido à sua colonização, mais de 90% da população é católica. É um dos países mais católicos do mundo. Na Ásia, somente Filipinas e Timor Leste têm maioria católica.
O Timor-Leste ocupa metade de uma ilha, o lado Oriental da ilha de Timor. A outra parte pertence à Indonésia. Embora hoje haja paz entre os vizinhos, Indonésia e Timor-Leste estiveram em guerra entre 1975 e 1999, pois os indonésios tentaram se apropriar de toda a ilha após o fim da colonização de Portugal. Mesmo após 20 anos de violência, que matou um quarto da população de Timor-Leste, na maioria homens, o país manteve sua identidade católica. Muitas mulheres ainda são viúvas – e a importância da liderança das mulheres em muitas comunidades deve surgir nos discursos.
O Papa Francisco parte de Timor-Leste rumo a Cingapura, onde conclui a longa viagem. O país, conhecido por ser um dos maiores centros financeiros do mundo e talvez , possuidor da cidade com maior proporção de milionários, é também a casa de muitos imigrantes asiáticos que se mudam para lá em busca de uma vida melhor.
Cingapura também é uma ponte simbólica que leva à China. Grande parte da população da cidade-estado é de chineses. Parte das mensagens do Papa naquele país – assim como fez em sua visita à Mongólia – será certamente destinada ao povo chinês, em especial os cristãos. Por causa do domínio do Partido Comunista chinês e da falta de relações diplomáticas bem constituídas, uma viagem do Papa à China é, por enquanto, somente um sonho, mas a Santa Sé tem buscado estabelecer e manter acordos de colaboração e mútuo reconhecimento.
Os invisíveis da sociedade, as periferias existenciais, presentes nas maiores e mais ricas cidades do mundo, entre eles jovens e idosos doentes, serão o alvo da atenção do Papa Francisco em Cingapura, mas também em toda a sua longa viagem. Ao percorrer mais de 32 mil quilômetros, a partir de Roma, o Pontífice se aproxima dos que estão fisicamente distantes, mas próximos a ele em pensamento e oração.