Iniciativa tem o apoio do Vicariato Episcopal para a Educação e a Universidade da Arquidiocese de São Paulo
Com a promulgação da Emenda Constitucional 108, em agosto, o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb) se tornou uma verba permanente e serão aumentados gradualmente, até 2026, os percentuais de participação da União dos atuais 10% para 23%.
O repasse dos recursos do Fundeb, porém, ainda depende de regulamentação, que já está em análise na Câmara dos Deputados, por meio do projeto de lei (PL) 4372/20. Este, em seu artigo 7º, indica que o fundo pode contemplar instituições comunitárias, confessionais ou filantrópicas sem fins lucrativos, que estejam conveniadas com o poder público. No entanto, o repasse só será permitido para a etapa da educação infantil, de 0 a 3 anos de idade, e para as pré-escolas que atendam crianças de 4 a 5 anos, respeitando-se, porém, a limitação do período de convênio de, no máximo, seis anos.
O Vicariato Episcopal para a Educação e a Universidade da Arquidiocese de São Paulo, o Vicariato da Educação da Arquidiocese do Rio de Janeiro, a Confederação Nacional da Família e da Educação (CNFE), a Frente Cristã por um Brasil Melhor, a Associação Nacional de Escolas Católicas (Anec), o Fórum Nacional das Instituições Filantrópicas e parlamentares de diferentes partidos têm se mobilizado para que esse repasse seja extensivo a toda a Educação Básica – Infantil, Fundamental e Médio –, uma vez que a Constituição e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) não fixam este limite apresentado no PL 4372/20.
Segundo Dom Carlos Lema Garcia, Bispo Auxiliar de São Paulo e Vigário Episcopal para a Educação e a Universidade, o Vicariato, com o apoio de dirigentes de escolas e líderes de comunidades, está em contato permanente com parlamentares municipais, estaduais e federais para conseguir o apoio a essa proposta. “Também estamos fazendo um trabalho de conscientização das escolas filantrópicas da Arquidiocese que se encaixariam nessa regulamentação de escolas comunitárias, além de diversas novas comunidades que já promovem escolas ou estão se mobilizando para isso”, detalhou o Bispo em entrevista à reportagem.
Geridas pela comunidade e pelas famílias
Edivan Mota, diretor-executivo da CNFE, explicou ao O SÃO PAULO que as escolas comunitárias são montadas por grupos de famílias, com a meta de alcançar a excelência na aprendizagem dos estudantes.
“Uma das pedras fundamentais do nosso modelo curricular é a participação efetiva da família, o que respeita o artigo 205 da Constituição, o qual diz que a educação é dever do Estado e da família. Hoje em dia, infelizmente, a família não é escutada. É chamada na escola apenas para receber o boletim do estudante ou quando ele tem mau comportamento. Nas escolas comunitárias, o artigo 205 será posto em prática”, enfatizou Mota.
Consultora pedagógica da CNFE, Ilona Becskehazy, doutora em Política Educacional e ex-secretária de Educação Básica do Ministério da Educação, assegurou que as parcerias dos municípios com as escolas comunitárias na educação infantil têm gerado bons resultados no Brasil, e que em países como Inglaterra, Estados Unidos e Canadá isso também se verifica nas escolas católicas em todas as etapas da Educação Básica.
“É um direito da família lutar pelo tipo de educação que deseja dar a seus filhos. Desde que o aluno aprenda certo tipo de conteúdo e habilidade, não deveria haver problema algum em qual será o provedor deste serviço. Hoje, o espírito comunitário da escola e da educação, que está refletido no artigo 205 da Constituição, está sendo desrespeitado, pois as famílias não podem contar com o Fundeb, que é um dos principais financiadores da educação brasileira”, apontou Ilona.
Estrutura preparada
Mota afirmou que muitas das paróquias que mantêm atividades de contraturno escolar ou administram creches e pré-escolas conseguiriam, com poucas adaptações, receber também estudantes do Ensino Fundamental e Médio. “Temos mobiliário, espaço físico e até recursos humanos para isso, mas manter uma estrutura educacional é algo caro. Se haverá mais dinheiro do Governo Federal no Fundeb, por que não democratizar o uso desses recursos? Por que não torná-los mais próximos das comunidades?”, indagou.
Um direito dos pais, os primeiros educadores
Dom Carlos recordou que no Compêndio da Doutrina Social da Igreja se aponta que os pais têm o direito de fundar e manter instituições educativas e que as autoridades devem assegurar que se distribuam as subvenções públicas para tal (cf. CDSI, 241).
“A razão é que os pais são os primeiros responsáveis pela educação de seus filhos. A prerrogativa de poder constituir uma escola comunitária permitirá que aquelas famílias que desejam dar uma educação de acordo com seus valores religiosos possam ter acesso a uma escola adequada, uma vez que os recursos públicos poderão subsidiar tais escolas. Assim se corrigirá uma desigualdade: as famílias que não têm recursos para custear uma escola particular são discriminadas”, explicou o Bispo.
Dom Carlos ressaltou, ainda, que os pais procuram as escolas católicas por confiar que nelas seus filhos terão uma formação de acordo com os princípios éticos e morais da Igreja. Ele também recordou um discurso do Papa Francisco em uma plenária da Congregação para a Educação Católica, em fevereiro de 2014: “Os institutos de educação católicos oferecem a todos uma proposta educacional que visa ao desenvolvimento integral da pessoa e que corresponde ao direito de todos de aceder ao saber e ao conhecimento, mas são igualmente chamados a oferecer a todos – no pleno respeito da liberdade de cada um e dos métodos próprios do ambiente escolar – a proposta cristã, ou seja, Jesus Cristo como sentido da vida, do cosmos e da História”