Semana Santa do Papa é repleta de símbolos e orações pelo fim da pandemia

Jamais o Tríduo Pascal foi celebrado como em 2020. A pandemia do novo coronavírus impediu que as tradicionais celebrações da Semana Santa do Papa tivessem um grande número de fiéis. Mesmo assim, numa Basílica de São Pedro com cerca de 20 participantes, entre assistentes, músicos e alguns leitores, o Papa Francisco presidiu um dos momentos mais intensos do seu pontificado, transmitido globalmente.

As celebrações do Papa foram repletas de símbolos e orações, implorando a Deus o fim da epidemia global de COVID-19, doença que já matou mais de 110 mil pessoas em todo o mundo. Francisco deixou fortes palavras de alerta à humanidade, especialmente aos líderes das nações, para que abandonem seus litígios e se concentrem numa grande colaboração contra o mal que coloca “todos no mesmo barco”. Ele pediu unidade, o fim da indiferença e uma atenção maior aos que já estão sofrendo com a pandemia e outras mazelas.

PELO FIM DO EGOÍSMO

O Papa, no entanto, não se dirigiu somente aos detentores de poder: lembrou-se de cada gesto de solidariedade, como aquele dos profissionais de saúde e prestadores de serviços essenciais, rezou pelos doentes e falou “dos santos da porta ao lado”, ou seja, as pessoas que agem de forma discreta e silenciosa, e assim dão testemunho do amor de Cristo no dia a dia.

Nas palavras de Francisco, o anúncio da ressurreição celebrado na Páscoa é a nossa maior esperança. Se até mesmo quando tudo parecia ter dado errado Ele voltou dos mortos, também os corações humanos, ainda que aflitos e cheios de feridas, serão capazes de reviver.

“Não se trata de uma fórmula mágica, que faz desaparecer os problemas”, declarou, em sua tradicional bênção pascal Urbi et Orbi (Para a cidade [de Roma] e para o mundo). A ressurreição de Cristo “é a vitória do amor sobre a raiz do mal”.

O Papa disse no Domingo de Páscoa, 12, que “não é esse o tempo da indiferença, do egoísmo e das divisões”. Ele pediu o fim de todos os outros conflitos nas nações, mencionando-os um a um. “Não se percam ocasiões de dar maiores provas de solidariedade, também recorrendo a soluções inovadoras”, disse, usando a Europa como exemplo, pois vive impasses multilaterais sobre como reagir à crise.

“Não é este o tempo para continuar a fabricar e traficar armas”, denunciou, também falando do aborto e da pobreza como fontes do mal. A indiferença a esses problemas parece “prevalecer quando em nós vencem o medo e a morte, isto é, quando não deixamos vencer o Senhor Jesus no nosso coração e na nossa vida”, enfatizou.

CRISTO SOFRE COM A HUMANIDADE 

Entre os diversos símbolos deste Tríduo Pascal, esteve o crucifixo trazido a pedido do Papa da igreja de São Marcelo, em Roma, considerado milagroso por ter sobrevivido a um incêndio no século XVI. Depois de ser carregada em procissão, segundo a tradição, essa cruz ajudou a trazer o fim da peste negra na cidade.

Um sinal de devoção popular que associa a dor humana à sensação de abandono do Cristo na cruz. Na celebração da Paixão, na Sexta-feira Santa, 10, o pregador da Casa Pontifícia, Frei Raniero Cantalamessa, falou sobre a companhia de Deus quando a humanidade sofre. “A pandemia do coronavírus nos despertou bruscamente do perigo maior que os indivíduos e a humanidade sempre correram, aquele da ilusão de onipotência”, refletiu Cantalamessa. Segundo ele, a morte de Jesus Cristo na cruz, de fato, remete à situação dramática atual. No entanto, “Deus, às vezes, faz assim conosco: confunde os nossos projetos e a nossa tranquilidade, para nos salvar do abismo que não vemos”, comentou, ressalvando que não é Deus quem manda o mal para o mundo, mas que Ele nos acompanha no sofrimento.

“Deus participa da nossa dor para superá-la.” Citando Santo Agostinho, afirmou também que “Deus, por ser soberanamente bom, nunca deixaria qualquer mal existir em suas obras se não fosse bastante poderoso e bom para fazer resultar do mal o bem”.

Dor essa que também ficou evidente nas meditações da Via-Sacra, celebrada na Praça São Pedro, e não no Coliseu, como de praxe. Os textos foram escritos por detentos, familiares, vítimas de crimes, funcionários do sistema carcerário e um padre acusado injustamente de algo que não cometera. Todos, porém, com palavras que remetem a uma nova vida.

“Tudo é possível a quem crê, porque, mesmo na escuridão das prisões, ressoa este anúncio cheio de esperança: ‘Nada é impossível a Deus’ (Lc 1,37). Se alguém lhe apertar a mão, o homem que foi capaz do crime mais horrendo poderá ser o protagonista da mais inesperada ressurreição”, dizia o texto da Via-Sacra.

LUZ DO MUNDO 

A liturgia do Sábado Santo, a mais completa de todo o ano litúrgico, teve de ser adaptada e abreviada neste ano. Não houve Batismo, por exemplo, mas apenas a renovação das promessas batismais. E, no caso da missa papal, só o Círio Pascal, representando a luz de Cristo, e uma pequena vela acendida pelo Papa Francisco iluminaram a quase deserta basílica.

Em mais um momento deste ano atípico, a clássica “oração universal” da liturgia do Sábado de Aleluia, 11, incluiu uma prece pelo fim da epidemia, para “fazer triunfar a vitória [de Deus] sobre o mal que aflige a humanidade”. Nesse contexto, o Papa Francisco defendeu o que chamou de “direito à esperança”.

“Com Deus nada é perdido. Coragem!”, disse. “Não cedamos à resignação. Não coloquemos uma pedra sobre a esperança. Deus não nos deixou sozinhos. Ele nos visitou.” Esse direito, explicou, não é o simples otimismo, mas um “dom que vem do céu” 

Da mesma forma que as mulheres encontraram o sepulcro vazio, também nós devemos ver a esperança, declarou. “Jesus, como semente na terra, estava por fazer germinar no mundo uma vida nova. E as mulheres, com a oração e o amor, ajudavam a esperança a florescer. Quantas pessoas, nos dias que vivemos, fizeram e fazem como aquelas mulheres: semeiam brotos de esperança!”

O Papa pediu à humanidade, neste momento de dor, a coragem de abrir o coração a Cristo, para ressurgir com Ele e tornar-se promotora de vida. 

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