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Dez compromissos urbanos pelo bem das famílias

No Brasil, 87,5% da população vive em cidades. O futuro de suas famílias está intrinsecamente ligado à qualidade de vida urbana. O que as grandes cidades podem fazer para melhorar o cotidiano de seus habitantes? A resposta está em políticas públicas integradas que reconheçam as famílias como protagonistas do desenvolvimento urbano.

São Paulo: Rio Pinheiros. Imagem Ana Luiza Mahlmeister

A Declaração de Veneza, assinada por representantes de regiões, cidades e territórios participantes do projeto Cidades Inclusivas para Famílias Sustentáveis (Cifs), deseja ser um marco referencial na defesa, em todo o mundo, de cidades mais humanas e voltadas às famílias. Estabelece 10 linhas de ação a serem adotadas como prioritárias pelos seus signatários.

1. Habitação. Moradia para todos vai além da construção de habitações populares; trata-se de criar espaços dignos que incluam uma rede integrada de serviços públicos, lazer e a possibilidade de desenvolver laços comunitários. Os assentamentos urbanos devem considerar todas as situações familiares e grupos sociais, com planejamento urbano flexível e saudável. É crucial a avaliação de impacto ambiental e a assistência financeira para a construção de edifícios sustentáveis e resilientes, com foco nas mudanças demográficas.

2. Novas tecnologias. Em um mundo dependente da tecnologia, a inclusão digital e o acesso a novas tecnologias são necessidades para o desenvolvimento humano integral. Programas de Wi-Fi públicos, acesso a recursos de computação e cursos de capacitação digital permitem que populações pobres ingressem no mercado de trabalho, aumentando a produtividade. É necessário expandir a infraestrutura, promover o acesso igualitário e aprimorar a conectividade para todos os membros da família na área urbana, garantindo a inclusão social e reduzindo a lacuna digital entre gerações.

3. Educação. O investimento em educação de qualidade traz enormes retornos sociais e atende a uma das maiores expectativas familiares: ver seus filhos se realizarem. Para ser eficiente, o investimento deve priorizar o ensino de qualidade, integrando escola e família, com gestão transparente, focando a melhoria real da aprendizagem e capacitação. Creches e escolas de qualidade devem estar próximas à residência ou trabalho dos pais. Outras ações incluem programas de educação parental, espaços de encontro intergeracional para atividades culturais e participação de idosos em atividades educacionais, ampliando a integração social..

4. Atenção à saúde. Os investimentos em saúde são vitais para as famílias, pois reduzem gastos diretos, aumentam a capacidade produtiva e promovem bem-estar. Estima-se que cada real investido em saúde pública gera retorno de R$1,23 em renda familiar e R$1,61 para o PIB. Para ser eficiente, o investimento público deve focar a prevenção, atenção primária contínua, gestão eficiente e inclusão social, protegendo especialmente famílias vulneráveis. Além disso, é importante promover hábitos e estilos de vida saudáveis, focando a prevenção de transtornos mentais e o atendendo às necessidades das pessoas idosas, também por meio da educação parental. Deve-se estabelecer uma estrutura para estimular a inovação e as relações intergeracionais em hospitais, além de garantir atendimento médico a visitantes e turistas.

5. Segurança. A importância da segurança se tornou óbvia para a população brasileira. Uma segurança pública eficiente requer ações integradas: policiamento comunitário preventivo, monitoramento em áreas críticas, urbanização adequada, educação preventiva, fortalecimento da justiça com investigações ágeis e políticas sociais que reduzam desigualdades. É crucial criar um ambiente acolhedor nas ruas, baseado na solidariedade, apoio mútuo e interação social. Isso pode ser feito por meio da promoção de voluntários, assistência jurídica, policiamento comunitário, uso de tecnologia, e treinamento em crises, garantindo a segurança pessoal e patrimonial e a confidencialidade de dados sensíveis.

São Paulo, região central. Fonte Wikimedia

6. Meio ambiente. Os cuidados com o meio ambiente são essenciais para as famílias porque promovem saúde, bem-estar e qualidade de vida, além de preservar recursos naturais para gerações futuras. Em nível pessoal, ações eficientes implicam educação ambiental em casa e na escola, consumo consciente, comportamentos que reduzem ou permitem a reciclagem dos insumos. Estas iniciativas, contudo, dependem da ação do poder público, criando parques e áreas verdes, garantindo a coleta de resíduos e a reciclagem, minimizando as fontes poluidoras etc.

7. Transporte. Nas cidades em que os provedores das famílias perdem horas no deslocamento, transporte urbano rápido e de qualidade faz grande diferença na dinâmica familiar. Essa eficiência exige: integração entre ônibus, metrô e trens, corredores exclusivos, tarifa justa, frota moderna e acessível, pontualidade, segurança, informação em tempo real e expansão para periferias. Investimentos em mobilidade ativa como ciclovias e calçadas adequadas também são essenciais, além da promoção de estratégias para reduzir o uso desnecessário de outros modos de transporte como o teletrabalho e arranjos flexíveis de trabalho e tempo em casa.

8. Acessibilidade financeira. Existem várias providências que podem dar alívio financeiro concreto a famílias, melhorando sua qualidade de vida. Por exemplo, facilitar o acesso a serviços e benefícios, especialmente para aquelas em situações vulneráveis, incluindo jovens, pessoas com deficiência e idosos; projetar estratégias para garantir o valor da área urbana, enfrentando a falta de moradia; incentivar a edificação de prédios eficientes no uso de energia etc.

9. Lazer e turismo. A qualidade de vida urbana passa pelo uso adequado dos espaços de patrimônio cultural e paisagístico, facilitando o acesso a atividades culturais e esportivas para todos os membros da família, mantendo e criando centros culturais, museus, parques e centros desportivos.

10. Famílias em situações vulneráveis. Famílias monoparentais, numerosas, de migrantes ou com pessoas que necessitam de cuidados especiais são particularmente vulneráveis e precisam de um acompanhamento adequado, por meio de programas específicos para reconhecer o valor do trabalho não remunerado e de cuidados, acompanhamento em suas necessidades básicas e estruturas de atendimento etc.

Um caminho possível. As experiências globais demonstram que cidades verdadeiramente inteligentes são aquelas que colocam o bem-estar das famílias no centro do planejamento urbano. Investir nas famílias é a forma mais eficaz de construir cidades resilientes, equitativas e prósperas. Os desafios são imensos, especialmente em contextos de desigualdade como o brasileiro, mas soluções viáveis existem. É necessário, porém, vontade política dos governantes e compromisso dos cidadãos para com o bem comum.

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