E se o que for estudado se tornar a solução para um problema ambiental?

Alunos de uma escola técnica estadual desenvolvem carvão ativado natural para absorver poluentes das águas

Estudantes e professora Márcia Silva apresentam o projeto de carvão ativado feito com cascas de amendoim em uma feira das Etecs de SP
Arquivo pessoal

De um lado da equação, muitas cascas de amendoim com um destino incerto; do outro, um grande volume de azul de metileno, corante usado pela indústria têxtil e que pode levar à poluição das águas. O resultado provável desta conta seria o de mais um problema ambiental, mas um grupo de estudantes chegou a uma solução benéfica para toda a sociedade.

Felipe Pinheiro, Ana Soldá, Gisle de Oliveira Alves e Gisele Jonsson da Fonseca, estudantes do Curso Técnico em Química na Etec Irmã Agostina, no Jardim Satélite, zona Sul de São Paulo, fizeram desta equação o objeto de seu trabalho de conclusão de curso e desenvolveram o Carvoamendo, um carvão ativado, feito à base de casca de amendoim, que é capaz de absorver o azul de metileno dos lençóis freáticos.

O projeto, orientado pela professora Márcia Freitas Silva, docente na Etec Irmã Agostina há 15 anos, foi finalista da etapa nacional do Prêmio Jovem da Água de Estocolmo, que reconhece alternativas sustentáveis e inovadoras, propostas por estudantes de 15 a 20 anos de idade, para o tratamento, monitoramento e prevenção de problemas relativos à água.

“Gosto de pesquisa e desenvolvimento para setores ambientais: água, solo e ar; mas a água se tornou o meu xodó”, disse Felipe Pinheiro, em entrevista ao portal do Governo do Estado de São Paulo. Atualmente, o jovem estuda Química Industrial na Universidade Federal de São Paulo, (Unifesp).

COLOCANDO A IDEIA EM PRÁTICA

Ao O SÃO PAULO, a professora Márcia Silva recordou que o grupo de estudantes a procurou com a proposta de fazer o trabalho de conclusão de curso com uma temática referente aos resíduos sólidos, e que após estudos chegaram ao projeto do Carvoamendo, também com o apoio das professoras Thaís Taciano e Aline Ramos.

Ao longo do desenvolvimento da proposta, o grupo entrou em contato com uma fábrica de amendoim de Tupã (SP) para o esclarecimento de dúvidas.

A parte prática do projeto se deu no laboratório da Etec, simulando a realidade em etapas que envolveram a trituração da casca do amendoim, sua ativação química, tratamento, ajuste do PH do carvão e, finalmente, os testes de absorção, que apresentaram os resultados esperados.

METODOLOGIA ATIVA

Márcia, que é especialista em Educação Ambiental pela Escola de Engenharia da USP de São Carlos e mestre em Políticas Públicas pela Universidade de Mogi das Cruzes, ressaltou que neste projeto, assim como em muitos outros que são realizados pelos estudantes da Etec Irmã Agostina, se aplicou a metodologia Steam – uma abreviação para as iniciais em inglês das cinco áreas que a envolvem: Ciências, Tecnologia, Engenharia, Artes e Matemática.

“Diante de um problema ambiental, por exemplo, os alunos vão pensar em melhorias a partir dos projetos que realizam. Uma dessas questões é sobre a sustentabilidade, e, assim, eles pensam em como desenvolver um produto com menos poluentes”, detalhou.

A metodologia Steam busca uma abordagem integrada dessas cinco áreas do saber, por meio de uma aprendizagem interdisciplinar e contextualizada dos temas, proporcionando: o desenvolvimento de habilidades por parte dos alunos; a aprendizagem ativa, com a aplicação dos conhecimentos em projetos práticos; e o estímulo à curiosidade.

“Em uma aula prática, por exemplo, o estudante vai desenvolver competências e habilidades, e há a questão da interdisciplinaridade. Não dá para ficar apenas no ensino teórico, somente com a lousa e o giz, quando os estudantes estão muito informatizados e com acesso a tecnologias”, observou Márcia. “É muito importante que os alunos tenham aulas práticas relacionadas com as questões ambientais”, enfatizou.

BOA BASE FORMATIVA

Promotora de práticas interdisciplinares em Educação Ambiental, a professora Márcia Silva lembrou, porém, que não basta que uma escola de ensino técnico tenha bons materiais para o desenvolvimento de projetos se os estudantes não adquiriram uma boa base sobre as temáticas ambientais no ensinos fundamental e médio.

“É importante que o aluno que ingressa no ensino técnico já tenha conhecimentos elementares em coisas como coleta seletiva e o que é um solo sadio ou poluído, por exemplo”, pontua.

“Quando todo o processo educativo está inserido com a educação ambiental, o aluno desenvolverá habilidades e competências com pensamento crítico, vai selecionar o que está certo e o que está errado, e depois de formado, quando já estiver na universidade ou no mercado de trabalho, será um funcionário com várias habilidades. Hoje, a indústria, principalmente na área Química, tem um setor de meio ambiente. Por isso, é muito importante que as escolas trabalhem essas questões, capacitando os professores e demais profissionais”, opinou.

GANHOS PARA TODA A SOCIEDADE

A professora assegurou que um jovem que estuda questões ambientais se torna um agente multiplicador de conhecimentos tanto para a comunidade em que vive quanto para a área profissional em que está inserido.

Referindo-se à participação dos estudantes no Prêmio Jovem da Água de Estocolmo, Márcia avaliou que eles puderam pensar em questões relacionadas aos recursos hídricos, sustentabilidade, mudanças climáticas e aquecimento global, e em como resolver os problemas que impactam a sociedade e o meio ambiente.

A professora enfatizou que além das metodologias adotadas pelas escolas e do empenho dos estudantes em realizar os projetos, a promoção de políticas públicas voltadas para a educação ambiental é indispensável: “Para que as escolas façam projetos como estes, elas precisam de bons materiais e professores bem capacitados. E se isso ocorrer, melhor será para todo o Brasil, já que atualmente as indústrias que poluem, por exemplo, buscam formas para tratar resíduos que elas não pensavam tratar antes, mas para isso precisam de pessoas bem capacitadas”.

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