‘Empresa sem pobreza’: responsabilidade social a partir do protagonismo das famílias

Iniciativa é apresentada na sede da FIESP, no dia 5, com a presença de Martín Burt, fundador e diretor-executivo da Fundación Paraguaya
Luciney Martins/O SÃO PAULO

Empresários, líderes de organizações não governamentais e profissionais de recursos humanos participaram do evento “Empresa sem pobreza”, no dia 5, na sede da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (FIESP), na capital paulista.

Organizado pelo Instituto Polaris, o encontro também contou com a presença de Martín Burt, fundador e diretor-executivo da Fundación Paraguaya, empreendedor social e pioneiro na aplicação de novas métricas de medição da pobreza no ambiente empresarial e autor do livro “Quem é o dono da pobreza?”, cuja edição brasileira foi lançada nessa ocasião.

Entre os participantes do evento estavam Gigi Cavalieri, presidente do Instituto Polaris; Raul Cutait, presidente do Conselho Superior de Responsabilidade Social da FIESP; Sonia Francine Gaspar Marmo, Secretária Municipal de Direitos Humanos e Cidadania; e o Diácono Márcio Ribeiro, Diretor da Caritas Arquidiocesana de São Paulo.

METODOLOGIA

Adotado em cerca de 50 países, o programa “Empresa sem pobreza” chegou ao Brasil em 2022, com o objetivo de potencializar as ações realizadas pelas empresas, visando ao bem-estar e à melhor qualidade de vida de seus funcionários, transformando as realidades de pobreza em que eles e suas famílias estão.

Esse programa se baseia na adoção da ferramenta “Semáforo de eliminação da pobreza”, que consiste em uma pesquisa que leva cada funcionário ao autoconhecimento sobre a realidade de pobreza de sua família, por meio de 50 indicadores, distribuídos em seis dimensões: acesso à renda e emprego; habitação e infraestrutura; educação e cultura; organização e participação na comunidade; saúde e meio ambiente; e interioridade e motivação.

Por meio de uma tecnologia de autoavaliação, as famílias podem, a partir dos dados compilados na pesquisa, pensar em soluções práticas e inovadoras, a fim de eliminar a pobreza.

PROTAGONISMO

Ao apresentar a metodologia, Martín Burt explicou que os programas de redução da pobreza, em geral, não são elaborados com uma comunidade, nem sequer preparados por uma comunidade, mas “impostos desde fora quando uma organização externa usa a sua própria definição (por mais coerente que seja), as suas próprias medidas (por mais exatas que sejam) e as suas próprias soluções (por mais bem intencionadas que sejam)”.

“Nenhum destes esforços é ruim em si mesmo”, destacou o empreendedor social, indicando que o problema está no fato de nenhuma dessas iniciativas dar protagonismo à comunidade a fim de encontrar soluções para os problemas que os seus próprios integrantes diagnosticam e priorizam. “Não deveria ser uma surpresa, não é? Afinal de contas, se pudessem, já os teriam visto, verdade?”, indagou.

Segundo Burt, o “Semáforo de eliminação da pobreza”, pelo contrário, devolve a pobreza às famílias pobres. “Em primeiro lugar, as famílias têm poder de decidir o que significa a pobreza no contexto das suas vidas. Baseamos a definição no modelo global descrito pela bibliografia sobre a pobreza, mas os indicadores que selecionamos para a nossa ferramenta são aqueles que os nossos clientes indicaram que eram os importantes”, frisou.

CORES

Para facilitar essa dinâmica, foi aplicada uma cor a cada situação: verde para não pobre, amarelo para pobre e vermelho para muito pobre. Daí nasceu a imagem do semáforo. “As próprias famílias diagnosticam o seu próprio nível de pobreza para cada indicador, refletindo sobre as representações gráficas que ilustram cada situação”, comentou.

Ainda segundo Burt, algumas das situações que ilustram o que significa “não ser pobre” em certos indicadores poderiam surpreender a pessoa que preenche a enquete do “Semáforo de eliminação da pobreza”.

“Quando uma família conta, em um só local, com dados detalhados e fáceis de serem entendidos sobre o que lhe falta e o que não lhe falta, também pode reavaliar o seu relacionamento com a palavra ‘pobreza’. Da mesma forma que nós nos afastamos de uma simples definição reducionista de ‘pobre é igual a viver com menos do valor de 2 dólares por dia’, muitas vezes escutamos famílias pobres exclamarem, após preencherem a enquete visual, que não eram tão pobres como acreditavam ser. Também escutamos pessoas da denominada classe média exclamarem, após preencherem a enquete visual, que são mais pobres do que acreditavam ser’”, comentou.

INVESTIMENTOS

O “Semáforo de eliminação da pobreza” permitirá que as organizações de desenvolvimento invistam os seus próprios recursos com mais eficiência.

“Nem todos os membros de uma comunidade terão um indicador vermelho em saúde, de forma que nem todos necessitarão de educação em saúde. Nem todos os membros de uma comunidade terão um indicador vermelho em saber ler e escrever, de forma que nem todos necessitarão alfabetização. Mas quando não sabemos quem necessita do quê, tendemos a generalizar, a aplicar uma só solução para todos os problemas”, observou Burt.

“O ‘Semáforo de eliminação da pobreza’ oferece às empresas uma meta concreta e finita: que todos os funcionários alcancem verde em todos os indicadores. Não se trata de iniciativas éticas arbitrárias que ficam bem no papel, mas proporcionam, para a empresa e os beneficiários, valores impossíveis de serem quantificados”, completou.

SUBSIDIARIEDADE

Gigi Cavalieri destacou ao O SÃO PAULO que, com o programa, é possível identificar claramente os pontos mais sensíveis e direcionar esforços de maneira eficiente, gerando melhores resultados para todos: os colaboradores e a empresa.

“Acreditamos que é possível erradicar a pobreza extrema por meio da subsidiariedade, que é um dos princípios da Doutrina Social da Igreja. Subsidiariedade seria o colaborador operar até onde for possível e a empresa realizar o que é necessário. Trata-se de ajudar na capacitação e desenvolvimento, para que o colaborador passe a ser o protagonista e a empresa, a apoiadora dentro do que é sua responsabilidade, para que ele pos- sa conquistar e realizar por meio do seu potencial/dons. A empresa não tem responsabilidade de realizar e sanar todas as demandas que se apresentam, mas pode utilizar sua capacidade de articulação para colaborar na solução dos problemas”, afirmou a empresária.

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