Para comemorar o jubileu, a histórica matriz paroquial da zona norte de São Paulo foi elevada à dignidade de basílica menor
Os sinos da Paróquia Sant’Ana, na zona norte de São Paulo tocaram solenemente na manhã deste domingo, 5, após o anúncio de que sua igreja-matriz foi elevada pela Santa Sé à dignidade de basílica menor.
A notícia, anunciada pelo Cardeal Odilo Pedro Scherer, Arcebispo Metropolitano de São Paulo, no fim da missa dominical na Catedral da Sé, foi acolhida com alegria pelos fiéis da paróquia que, no próximo dia 12, completa 125 anos de criação.
Nas redes sociais da Paróquia, a notícia destaca que a concessão desse título foi um “presente do Papa Francisco” para a comunidade pelo seu jubileu, que será comemorado solenemente no próximo dia 26, dia de Sant’Ana.
HISTÓRIA
A origem da Paróquia se confunde com a origem da cidade de São Paulo no século XVI, quando uma grande porção de terra do outro lado da margem do Rio Tietê foi confiada aos missionários da Companhia de Jesus (Jesuítas), ao norte da Vila de São Paulo de Piratininga.
Batizada inicialmente de Fazenda Tietê, no local eram cultivados legumes, frutas e verduras para abastecer a população da vila. Com o passar dos anos, a fazenda expandiu seus limites à medida que os Jesuítas iam adquirindo outras terras, muitas delas doadas por famílias. Nesse período, a propriedade abrangia o que hoje é o município de Guarulhos e ia até a antiga Estrada Jundiaí.
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PRIMEIRA IGREJA
A antiga sede da fazenda e ao mesmo tempo convento dos Jesuítas ficava onde hoje está o Centro de Preparação de Oficiais da Reserva de São Paulo (CPOR), na Rua Alfredo Pujol. Anexa à residência, havia uma igreja dedicada a Sant’Ana. Ali, os cerca de 150 colonos se reuniam para rezar e, assim, foi se difundindo a devoção à mãe da Virgem Maria. Tanto que, com o tempo, a propriedade passou a ser conhecida como Fazenda Santa Ana. Em cartas enviadas aos portugueses em 1560, São José de Anchieta, fundador da cidade de São Paulo, chega a mencionar a fazenda.
PADROEIRA
Com a expulsão dos Jesuítas em 1760, a propriedade passou a ser uma fazenda real e a sede tornou-se a residência de José Bonifácio de Andrada e Silva, ministro de Dom Pedro I e “Patriarca da Independência do Brasil”.
Foi no Solar dos Andradas, como ficou conhecida a construção, que, na madrugada de 23 de dezembro de 1821, José Bonifácio redigiu a representação na qual pedia a permanência de Dom Pedro no Brasil, resultando no histórico Dia do Fico, em 9 de janeiro de 1822.
Mesmo nesse período, a Igreja de Sant’Ana continuou a ser utilizada pelos fiéis até 1894, quando o imóvel foi entregue aos militares, sendo demolido em 1915. No livro tombo da Paróquia Santa Ifigênia, à qual compreendia o território da fazenda, há o registro do então pároco de que, na ocasião da demolição, as imagens e objetos sacros da igreja tiveram que ser tirados às pressas.
Dentre as imagens sacras havia a pequena imagem de Sant’Ana, fabricada no século XVI, em terracota pintada. A imagem foi acolhida no oratório particular do colono João Chemin, que se tornou o local onde os fiéis se reuniam para celebrar a fé.
A PARÓQUIA
Apesar de, desde 28 de maio de 1782, Sant’Ana ser a padroeira principal da cidade e da Arquidiocese de São Paulo, ainda não havia nenhuma paróquia dedicada à avó de Jesus. Somente em 12 de julho 1895 que Dom Joaquim Arcoverde de Albuquerque Cavalcanti, então bispo diocesano, erigiu a Paróquia de Sant’Ana. Na ocasião, foi nomeado como primeiro Pároco o Cônego Antonio Augusto Lessa. A sede provisória da nova paróquia passou a ser a Capela Santa Cruz, do Colégio Santana.
MATRIZ
A bênção da pedra fundamental da Igreja Matriz de Sant’Ana aconteceu em 1o de maio de 1896, por Dom Joaquim Arcoverde, em um terreno doado por Ismael Dias da Silva. Porém houve um conflito entre os moradores da parte alta do bairro, que não concordavam com a construção da igreja na parte baixa. Paralisou-se totalmente a construção e dissolveu-se a comissão de obras. Dessa forma, faltaram o apoio e os recursos necessários para a continuidade dos trabalhos.
Em 1904, a Paróquia foi confiada aos cuidados dos Missionários de Nossa Senhora da Salette (Saletinos), assumindo como Pároco o Padre Clemente Henrique Moussier, figura bastante lembrada na Paróquia por ter retomado a construção da matriz.
Em 26 de julho de 1908, foi inaugurada a capela-mor da matriz, que compre- endia o presbitério e os altares laterais. A nave central do templo foi inaugurada em 1924. Na festa da padroeira de 1941, foi concluída a construção das duas torres e abençoados, por Dom José Gaspar de Affonseca e Silva, os três sinos de bronze.
PADRES
De 1895 a 1904, a Paróquia Sant’Ana teve seis párocos, dentre os quais, o Padre Roberto Landell de Moura, famoso inventor precursor da radiodifusão. Tanto que seus primeiros testes de transmissão de rádio foram feitos entre a avenida Paulista e o alto de Santana.
Os missionários saletinos foram responsáveis pela paróquia de 1904 a 1986. A partir desse ano, a comunidade voltou a ser pastoreada pelos padres diocesanos, tendo como párocos os padres Nadir Sergio Granzotto, Victor Santana Milagres Fernandes, Tommaso Leporale, João Luiz Miqueletti, Maurício Vieira de Souza e, há pouco mais de um ano, o Padre José Roberto Abreu de Mattos (Beto), 23º Pároco, que conta com a colaboração do Padre Francisco Ferreira da Silca, como Vigário Paroquial.
FATOS HISTÓRICOS
A Paróquia Sant’Ana foi o local onde dois arcebispos de São Paulo iniciaram seu ministério episcopal. Em 1966, Dom Paulo Evaristo Arns foi acolhido como Bispo Auxiliar da Arquidiocese na Região Santana e, em 2002, Dom Odilo Pedro Scherer assumiu a mesma função. No Aeroporto Campo de Marte, no território da Paróquia Sant’Ana, já foram acolhidos dois papas: São João Paulo II, em 1980, e Bento XVI, em 2007, quando celebrou a canonização de Santo Antônio de Sant’Anna Galvão.
SER ‘IGREJA EM SAÍDA’ NA CIDADE
A Paróquia Sant’Ana deu origem não só ao bairro de mesmo nome como à zona Norte da capital paulista. De seu território, foram desmembradas outras nove paróquias. “Esta Paróquia tem uma importância histórica muito grande, não só por Sant’Ana ser uma das padroeiras da cidade, como também pelo fato de a história da paróquia se confundir com a história do bairro e da própria capital paulista”, destacou o Padre Beto.
Hoje, Santana é um bairro predominantemente comercial e com bastante contrastes. No território da Paróquia, existe o Terminal Rodoviário do Tietê, maior da América Latina, um complexo penitenciário, uma favela, um conjunto habitacional e uma estação de metrô de grande circulação.
DESAFIOS
O Pároco ressaltou os muitos desafios da Paróquia. “É preciso ter um relacionamento com o poder público, com a associação de bairro, os lojistas, com o Metrô e, sobretudo, com os pobres”, afirmou Padre Beto, chamando a atenção para a grande quantidade de pessoas em situação de rua que vivem no bairro.
Para atender a essa população, a Paróquia conta com um serviço de voluntários que servem o café da manhã diariamente para os pobres. Pela proximidade com o Terminal Rodoviário, também é grande a procura de pessoas pedindo ajuda para comprar passagens para poderem voltar para suas terras.
‘GRANDE GRAÇA’
O casal Laura de Fátima Ramos Pinheiro, 61, e José Carlos Pinheiro, 66, frequentam a Paróquia há 28 anos. Atualmente eles são ministros extraordi- nários da Sagrada Comunhão e já foram catequistas. Todos os anos ajudam também na quermesse. Para eles, a comunidade paroquial é essencial em suas vidas, especialmente para superar momentos difíceis. “A partir do mo- mento em que entramos nessa Paróquia, nós conhecemos Jesus, que deu um novo sentido às nossas vidas”, afirmou Laura.
Laura e José ressaltaram, ainda, que a celebração do jubileu é uma opor- tunidade de aprofundar ainda mais o sentido de pertença à comunidade, ao tomarem consciência de que estão continuando uma história que começou há 125 anos.
CAMINHO SINODAL
Padre Beto enfatizou que, neste ano jubilar, a Paróquia Sant’Ana busca ser cada vez mais uma ‘igreja em saída’, que vai ao encontro das necessidades da cidade. Nesse sentido, o sínodo arquidiocesano tem sido uma oportunidade de a comunidade rever sua história, sua vida e missão no bairro, em vista de uma autêntica conversão pastoral e missionária.
(Colaborou Rubens da Cruz)