Mulheres angolanas têm vidas transformadas no Centro de Acolhida do Amparo Maternal

Instituição católica acolhe gestantes, puérperas e seus bebês, bem como seus filhos de até 6 anos de idade

As angolanas Nvunzi Albertina e Beatriz Ventura – com o filho Gael em seus braços – estão entre as mulheres acolhidas no Amparo Maternal
Fotos: Comunicação do Amparo Maternal

Os olhos expressivos, a voz firme e aliviada e as mãos entrelaçadas sobre o vestido estampado com cores vívidas, mesclando azul e verde, não negam a construção de uma identidade cultural e as raízes angolanas de Nvunzi Albertina Panzo, 32.

Ela tinha uma vida dedicada integralmente ao trabalho e aos afazeres domésticos em Luanda, capital de seu país natal. Albertina concluiu o ensino médio, mas não pôde realizar uma formação de nível superior pelo alto custo e pela crise inflacionária em Angola. Com famílias cada vez mais sem moradia, com baixo poder de compra devido à inflação, precarização nos equipamentos do sistema de saúde, falta de vagas em escolas públicas, Angola passou a fazer parte da lista de países que vivem na pior desigualdade social. De acordo com o Relatório de Desenvolvimento Humano (PNUD) 2021-2022, o IDH de Angola é de 0,574, o que o coloca na categoria de desenvolvimento humano médio, na posição 149 no ranking de 189 países e territórios.

Aos 31 anos, mãe de primeira viagem, Albertina, insatisfeita com a situação econômica de seu país e temendo perder seu bebê, dadas as precárias condições do sistema nacional de saúde de Angola, decidiu percorrer uma jornada de mais de 7,5 mil km até o Brasil em busca de melhores condições de vida, bem-estar social e segurança para criar o seu filho.

“Eu já tinha o visto de viagem para o Brasil. Quando fiquei grávida, olhei a realidade ao meu redor e decidi vir para ganhar meu bebê, com segurança. Nos hospitais públicos e na educação em Angola, há muitas instabilidades e realidades negativas. Devido às condições financeiras, meu marido deu prioridade a mim. Não foi fácil chegar até aqui, gasta-se muito dinheiro”, recorda.

A ESPERANÇA NO RECOMEÇO

Ao pisar em solo brasileiro, ainda no Aeroporto Internacional de Guarulhos, Albertina conta que foi bem recebida por uma brasileira que a levou ao Centro de Referência de Assistência Social (CRAS). Já com cinco meses de gravidez, a angolana foi encaminhada para o Centro de Acolhida do Amparo Maternal, que acolhe mães, gestantes, puérperas e suas crianças de até 6 anos de idade.

Com o filho Mizael Ventura, de 4 meses nos braços, Albertina conta que desfruta da vida que gostaria de ter em seu país de origem, e que o Amparo Maternal virou mais do que sua segunda casa: tornou-se um lar que a acolheu de braços abertos, proporcionando a ela uma cama com o berço para o seu filho, o enxoval do bebê, seis refeições ao dia, apoio na saúde física e mental, assistência em atividades socioeducativas e cursos de capacitação profissional.

“Aqui já realizei o curso de cuidadora de idosos; já participei de um processo seletivo para o mercado de trabalho e agora estou esperando o resultado da vaga e uma oportunidade para começar a trabalhar”, relata.

SONHOS E PLANOS NO BRASIL

Esperançosa, Albertina faz planos para quando a família se reencontrar e ela estiver estabilizada financeiramente: “Quero uma vaga de emprego e conseguir um espaço para minha família. Tudo o que eu passei, o meu filho não terá que passar. Eu darei o meu máximo pela educação dele”, enfatiza.

Saudosa e em meio às lágrimas, Albertina relembra de quando se despediu de sua família em Angola e das palavras de incentivo de seu pai quando estava prestes a embarcar para o Brasil. “Se eu não lhe conhecesse e você fosse irresponsável, eu não abriria mão de deixar você ir ao Brasil. Você é muito forte. Vai ser difícil, mas vai dar certo”.

Segundo a porta-voz e colaboradora da equipe técnica do Centro de Acolhida do Amparo Maternal, Edilene Teixeira Silva, a missão inicial da organização é levar o acolhimento e restaurar a dignidade humana para as mães, gestantes e seus filhos que convivem no lugar: “O papel da equipe técnica é fazer o acolhimento, e a nossa linha de trabalho é sempre da maneira mais humanizada possível. É um acolhimento que inclui afeto. Nós damos todo o suporte necessário para que essa pessoa se sinta em um lar”.

No Centro de Acolhida, as gestantes e puérperas encontram não só a moradia, mas cursos técnicos de capacitação profissional e o incentivo à reinserção no mercado de trabalho. Há cursos de cuidador de idosos, formação em oficinas de costura, salão de beleza, que inclui manicure, cabeleireiro e estética.

Edilene comenta sobre a assistência maternal, como a alimentação e o apoio de cuidadoras técnicas que oferecem o suporte às mães para cuidarem de seus filhos. “Todo o apoio que damos está ligado ao projeto de vida da mãe com o bebê. Muitas chegam despreparadas e fragilizadas. Aqui essa mãe recebe o enxoval, a cama, o berço e todo o suporte necessário de infraestrutura, orientações sobre garantia de direitos, encaminhamentos para a rede de saúde, inclusive acompanhamento em saúde mental”, detalha.

A CONQUISTA DE BEATRIZ

Quando estava grávida de cinco meses, Beatriz Sebastião Ventura, 42, natural da capital Luanda, veio para o Brasil em 2022 em busca de oportunidades e melhores condições de vida para si e seu filho Gael Natanael, hoje com 1 ano e 2 meses.

Beatriz já havia sofrido com a morte de um de seus três filhos por complicações médicas e negligências de saúde em Angola. Assim, decidiu atravessar o oceano Atlântico para ter o seu quarto filho a salvo – afinal, já estava na sua segunda gravidez de risco.

“Eu já ouvia que no Brasil a assistência médica era muito boa. Por isso, meu marido me enviou para cá, mesmo sem conhecermos ninguém. Ele já sabia que existem casas que apoiam imigrantes”, contou. Esperançosa ao saber que seu marido e um dos seus filhos virão para o Brasil, Beatriz não vê a hora de poder abraçá-los e conseguir uma casa para recomeçar uma nova vida ao lado de sua família.

Depois que foi acolhida no Amparo Maternal, Beatriz relata que teve diversas oportunidades de continuar crescendo no âmbito profissional. Ela foi uma das angolanas que realizaram o curso de cuidador de idosos, encerrado em dezembro. Agora, quer cursar a faculdade de Psicologia. “Eu realizei o curso de cuidador de idosos e agora estou em busca do meu primeiro emprego. Já realizei uma entrevista junto com algumas colegas do Amparo e estou confiante de que vou conquistá-lo”.

IMIGRANTES ANGOLANOS NA CAPITAL PAULISTA

De acordo com a Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social (SMADS), em 2023 foram acolhidos 3.402 imigrantes angolanos, sendo 1.594 mulheres e 1.808 homens. Em comparação a 2019, foram acolhidos 290 imigrantes angolanos nos serviços da rede socioassistencial, sendo 127 mulheres e 163 homens. Até fevereiro de 2024, foram contabilizados 1.545 angolanos, sendo 712 mulheres e 833 homens.

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