Com base na Doutrina Social da Igreja e na teologia moral, o primeiro dia de debates buscou “ver” o problema e “iluminá-lo”, em uma reflexão sobre o comportamento do homem em sociedade e sua responsabilidade no cuidado com a Casa Comum.
Na palestra de abertura, a professora Dra. Karen Ambra, reitora do Centro Universitário Assunção, destacou que “falar sobre o meio ambiente não é se referir a um objeto de estudo que está distante de nós e sobre o qual possamos nos debruçar e observar de uma forma neutra”.
Karen enfatizou que “não existe algo que possamos falar sobre o meio ambiente que não nos impacte diretamente” e observou que “não estamos só ligados à natureza – nós somos a própria natureza, e está mais do que na hora de lidar com ela, com o meio ambiente, não só de uma forma acadêmica, mas séria, humana, compromissada, respeitosa”.
Na palestra seguinte, o Frei Marcelo Toyansk Guimarães, Assessor da Comissão Justiça e Paz da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), falou sobre a “Inspiração franciscana na elaboração da carta encíclica Laudato si´”.
Frei Marcelo lembrou que o planeta Terra chegou a um ponto crítico de elevação da temperatura e que, portanto, não adianta fingirmos que o problema não é nosso. “Os pobres serão os mais afetados, mas todo mundo vai junto”.
Ele lembrou a importância do papel da Igreja nesse processo de conscientização. “Quando somos conectados com o mundo e conseguimos dar uma resposta, a Igreja é muito mais entendida e valorizada, porque ela dá uma resposta para o mundo. Por isso, é tão importante a Igreja participar desse processo, porque ela também está na sociedade” , observou.
Na sequência, Padre Claudio Antonio Delfino, mestre em Filosofia pela Pontifícia Universidade Gregoriana, apresentou o tema “Em toda criação a presença da Santíssima Trindade”, destacando que a Trindade “faz com que cada criatura participe da sua condição”.
“O Papa nos convida a termos um olhar de fé. Se é para olharmos as criaturas a partir dos sinais da Trindade, nós temos que olhá-las a partir da fé”, disse. “O mundo não é um ser em que as criaturas não racionais têm menos valor do que o ser humano. As espécies estão à disposição no jardim do mundo ao homem, mas para que ele as use de modo a guardar e cultivar”, explicou.
Ainda na manhã do dia 28, o Padre Marcelo Maróstica Quadro, Vice-diretor da CASP, falou sobre “A raiz humana como problema da crise socioambiental”.
“No magistério da Igreja, os Papas Paulo VI, João Paulo II e Bento XVI colaboraram em alguns documentos, algumas encíclicas, já destacando a raiz humana nessa questão da crise socioambiental”, apontou, lembrando, porém, que a Laudato si’ é um documento inovador nesse sentido, pois faz essa correlação de modo mais direto.
“Para o Papa Francisco, o crescimento tecnológico e científico dos últimos séculos proporcionou benefícios inegáveis – bem-estar, conforto e segurança –, mas o aumento do poder sobre a natureza revelou uma realidade inerentemente humana: o mau exercício da liberdade. Segundo o Papa, esse é um problema de natureza estritamente ética, que afeta profundamente a moral humana”, prosseguiu.
A rodada de palestras da manhã terminou com uma mesa de debates com os palestrantes, conduzida pelo Diretor da CASP, Diácono Márcio José Ribeiro.
POLÍTICA E QUESTÕES HUMANITÁRIAS
Na parte da tarde, representantes da academia abordaram os impactos das mudanças climáticas na vida moderna e o papel do Estado como fomentador de políticas no sentido de mitigá-las.
Zenaida Luisa Lauda Rodriguez, pós-doutora no Programa USP Cidade Globais do Instituto de Estudos Avançados da USP e doutora em Ciência Ambiental pela mesma universidade, tratou sobre a realidadedos refugiados climáticos na palestra “Mobilidade humana decorrente de questões ambientais”.
A academia, segundo ela, também se debruça sobre a Laudato si’, “que é um documento muito coerente com todas as coisas que estudamos das questões ambientais”. Ela comentou que tragédias como a do Rio Grande do Sul não são uma novidade para os cientistas.
“Temos vários estudos internacionais, como o IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas da ONU), que reúne milhares de pesquisadores do mundo todo que trabalham constantemente analisando estudos, pesquisas e relatórios sobre as mudanças climáticas. Já há previsões sobre como o mundo vai mudar conforme a temperatura for mudando”, disse.
O Grid (Global Report on Internal Displacement ) 2023, segundo ela, traz um levantamento sobre deslocamentos forçados pelo mundo. “Houve uma época em que as pessoas se deslocavam por situações de conflito. Hoje, o movimento é mais influenciado por fatores hidrometeorológicos, que estão vinculados às mudanças climáticas”, alertou.
Na sequência, o professor Dr. Alessandro Fuentes Venturini, vice-reitor do Centro Universitário Assunção, abordou a “Política Nacional Sobre Mudanças Climáticas” (Lei 12.187), em vigor desde dezembro de 2009, mas ainda sem efetiva implementação.
“Para quem nega a mudança climática, é um dado matemático. Quando analisamos os dados de aumento de temperatura com emissão, vemos que parece que o Brasil não emite tanto carbono. De fato, o Brasil não emite tanto carbono, mas no Brasil se emite muito gás metano, que é 30 vezes mais potencialmente causador do efeito estufa”, disse.
O professor lamentou que o negacionismo climático tenha dificultado a aprovação de políticas públicas no País e avaliou que o Congresso Nacional muitas vezes contribui para precarizar o arcabouço de proteção de áreas ambientais, como ocorreu com o Código Florestal.
A última palestra do dia 28 foi proferida pelo Cônego Antônio Manzatto, doutor em Teologia pela Univerdade de Lousanne, na Bélgica, que abordou o tema “Justiça socioambiental intergeracional como herança divina”.
“A Laudato si’ traz como elemento o fato de que tudo está interligado. As gerações estão interligadas: fisicamente, culturalmente, geneticamente. Uma recebe a vida como herança da geração anterior. Se nós recebermos um mundo marcado pela guerra, foi porque a geração anterior nos deixou um mundo assim marcado”, analisou.
Ele enfatizou que a salvação da humanidade não se dará individualmente, mas coletivamente: “Eu costumo dizer que ninguém vai para o céu de bicicleta – ou a gente vai de trem ou não vai, porque a bicicleta é um transporte individual e o trem é coletivo. Ou vamos juntos ou não vamos.”
Por fim, o Padre Marcelo Maróstica e Victor Félix, analista de informações da CASP, conduziram uma mesa de debates com os palestrantes da tarde. O encerramento do dia foi feito pelo Diácono Márcio José Ribeiro.