Plástico reciclado é convertido em casas populares na Grande São Paulo

Projeto da ONG TETO Brasil já entregou 3 moradias a pessoas em situação de vulnerabilidade. Estima-se que outras 5 sejam concluídas até o fim deste ano

Casas são erguidas com blocos de polipropileno reciclado, produzidos após a coleta, separação, limpeza, trituração e injeção do plástico
TETO/Fuplastic

Na comunidade Porto de Areia, em Carapicuíba, na Região Metropolitana de São Paulo, os mais de 2 mil moradores há muitos anos sofrem com as consequências do descaso do poder público, tendo que conviver com a falta de saneamento básico e enchentes constantes.

Mas essa triste realidade começou a ganhar outra perspectiva com o apoio da ONG TETO Brasil, organização sem fins lucrativos que, por meio de um projeto inovador, já construiu três moradias populares na comunidade. O material utilizado para as construções é o plástico.

BLOCO POR BLOCO

A iniciativa faz parte do programa “Moradias Semente” e busca oferecer uma resposta eficiente às famílias e comunidades mais vulneráveis do País. As casas são construídas com blocos de polipropileno reciclado, chamados de “Fubox”, produzidos a partir da coleta, separação, limpeza, trituração e injeção do plástico.

O modelo de moradia conhecido como “Semente Eco” é uma evolução dos módulos construídos pela ONG de forma emergencial, já que os blocos garantem a construção de casas completas e duráveis.

Patenteado pela empresa parceira Fuplastic, o material, utilizado somente nas paredes em cada moradia construída, é oriundo da reciclagem de mais de uma tonelada de plástico. As telhas são feitas com dezenas de milhares de caixinhas de suco ou de leite ou pasta de dente reciclados.

As casas são erguidas de forma modular e adaptável por voluntários do projeto. Além do baixo custo, a metodologia se destaca pela rapidez das construções, concluídas com menos de dez dias de trabalho.

Até julho deste ano, o programa já entregou três moradias e estima-se que outras cinco sejam concluídas ainda em 2024.

“Esse é um projeto desenhado para ser uma resposta à crise habitacional nas favelas mais vulnerabilizadas do País, sendo um ponto de conexão de várias tecnologias que produzem hoje um impacto social e ambiental histórico, e que precisa ser uma referência para o enfrentamento da crise social e climática que vivemos”, afirma Ygor Santos Melo, gerente social da TETO Brasil e arquiteto cocriador da iniciativa.

Ainda de acordo com Ygor, projetos de moradia emergencial não somente contribuem com a solução de problemas habitacionais, mas impactam diretamente na qualidade de vida das pessoas contempladas, reduzindo os níveis de stress, solidão e consumo de medicamentos ansiolíticos e antidepressivos.

UM LAR PARA QUEM MAIS PRECISA

A escolha das famílias contempladas pelo programa observa a mesma metodologia dos demais projetos desenvolvidos pela ONG, a partir de um processo que consiste em: cadastro com enquete das famílias em extrema vulnerabilidade habitacional; seleção por nível de prioridade; validação da escolha com as lideranças comunitárias; validação técnica no terreno; integração da família selecionada em um circuito de formação social e de colaboração com a TETO, que termina semanas depois da entrega da moradia.

“A ação nasce revolucionária por focar nas pessoas e territórios que mais precisam de uma resposta às suas necessidades habitacionais, o que é um direito. Esse é um projeto pensado para a realidade das favelas brasileiras. Quem precisa morar, precisa morar agora! Não é fácil de se implementar um modelo de casa que se adapte aos contextos mais adversos e terrenos mais difíceis, que pode ser construída de maneira ágil, que mobiliza a sociedade civil para construir voluntariamente conosco e que vem acoplada de uma forte metodologia social. Por isso, o impacto para sociedade é tão grande”, salienta o gerente social.

CONTRIBUIR COM A ‘CASA COMUM’

O meio ambiente também é beneficiado com o novo destino dado ao plástico e outras soluções sustentáveis. Segundo Ygor, as moradias construídas estão sendo acopladas a biodigestores, que tratam o esgoto produzido, transformando-o em biogás.

“Cada biodigestor chega a produzir o equivalente a um botijão de gás por mês, representando impacto ambiental e econômico para as famílias e a comunidade. Portanto, esse projeto atende diversas dimensões, tendendo a ser uma referência sem precedentes de como lidar com a crise habitacional e social no País”, explica.

“O projeto não só ajuda a mitigar o problema do lixo plástico, um dos maiores poluentes globais, mas também oferece uma solução habitacional digna e durável para as comunidades mais necessitadas”, enfatiza Ygor. Esse impacto é amplificado, conforme realçado pelo idealizador do programa, por conscientizar e mobilizar a sociedade civil em torno da reciclagem e do voluntariado, fortalecendo laços comunitários e promovendo a cidadania ativa.

RECOMEÇO

Uma das famílias contempladas pelo programa é liderada pela diarista Arivancleide Santos de Oliveira, 35. Ela contou ao O SÃO PAULO que sua antiga casa ficava próxima a um esgoto e era comum que em dias de chuva, fosse invadida pela água suja. Além da perda de móveis, a diarista lembrou que em uma das enchentes, uma de suas filhas chegou a se ferir pelo contato com as fezes que entraram na casa com o esgoto.

Arivancleide está em tratamento de um câncer no pescoço e ainda não tem condições de trabalhar todos os dias. O novo lar significa uma nova etapa em sua vida: “Eu me sinto muito grata por ter sido contemplda. Esta casa representa o começo de tudo para mim, porque em dias de chuva, eu não vou mais chorar por causa da invasão da água”, expressa.

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