Ruth Maria em última entrevista: ‘Só tenho a agradecer a Deus e à Igreja’

Por 30 anos, ela atuou no Secretariado Arquidiocesano de Pastoral; ‘com profunda fé e espírito de serviço, consagrou sua vida Inteiramente a Cristo e à Igreja’, escreveu o Cardeal Scherer em nota de pesar

Luciney Martins/O SÃO PAULO

A Arquidiocese de São Paulo infor­mou na segunda-feira, 3, o falecimento de Ruth Maria de Carvalho, aos 87 anos, na capital paulista. Nascida em Descalvado (SP) em 1938, ela foi uma das primeiras leigas consagradas da Arquidiocese, a con­vite de Dom Paulo Evaristo Arns.

No contexto da renovação pós-conci­liar da Igreja, a então Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacra­mentos, sob o pontificado de São Paulo VI, promulgou, em 31 de maio de 1970, o Ritual da Consagração das Virgens, Ordo virginum, permitindo uma forma de con­sagração feminina à Igreja particular. Na­quele mesmo ano, o rito foi instalado na Arquidiocese pelo Cardeal Arns, então Arcebispo Metropolitano.

Ruth Maria se tornou consagrada em 8 de dezembro de 1973, em rito celebrado na antiga capelinha dedicada a São José, próxima à Santa Casa de Misericórdia: à sua frente estavam Dom Paulo; seu tio, o Frei João Maria de Carvalho; e alguns amigos e familiares.

As mulheres que se consagram pelo rito da Ordo virginum emitem o santo propósito de seguir mais de perto a Cris­to, desposam-se misticamente com Cristo, Filho de Deus, e dedicam-se ao serviço da Igreja, conforme consta no Código de Di­reito Canônico, no qual também se postu­la que “as virgens podem associar-se para observar mais fielmente o seu propósito e, com auxílio mútuo, realizar o serviço da Igreja, consentâneo com o seu próprio estado”.

‘AMOR E SERVIÇO AO REINO DE DEUS’

Formada em Letras Neolatinas pela USP, Ruth Maria atuou como professora de língua portuguesa no estado de São Paulo e exerceu cargos na Secretaria Esta­dual de Educação.

Em 1985, Dom Paulo a convidou para trabalhar no Secretariado Arquidiocesano de Pastoral, no qual atuou por 30 anos, também durante os arcebispados dos Cardeais Claúdio Hummes e Odilo Pe­dro Scherer, com destacada excelência na organização dos eventos arquidiocesanos e grande capacidade de mobilização do laicato, religiosos e clérigos para que deles participassem.

Em 2015, Ruth Maria recebeu a re­cém-criada Medalha São Paulo Apóstolo, em menção honrosa a ela conferida pelo Cardeal Scherer.

Em nota na segunda-feira, 3, Dom Odilo manifestou, em nome de toda a Arquidiocese, pesar pela morte de Ruth Maria, bem como “solidariedade e proxi­midade em oração aos seus familiares e amigos”.

Também recordou que Ruth Maria foi uma das primeiras leigas consagradas da Arquidiocese e que “com profunda fé e espírito de serviço, consagrou sua vida in­teiramente a Cristo e à Igreja, colaborando por décadas no Secretariado Arquidioce­sano de Pastoral, onde exerceu com com­petência e dedicação um papel de grande importância na animação pastoral e na organização de eventos arquidiocesanos”.

“Manifestamos gratidão a Deus por sua vida e missão, marcadas pela coerên­cia, humildade e generoso testemunho de amor e serviço ao Reino de Deus”, escre­veu Dom Odilo.

‘EU SÓ TENHO A AGRADECER A DEUS E À IGREJA’

Em março deste ano, por ocasião do Dia Internacional da Mulher, a TV Canção Nova entrevistou Ruth Maria no residen­cial para a terceira idade em que ela viveu nos últimos anos, recebendo os devidos cuidados, carinho e assistência. A conver­sa com a repórter Aline Imercio foi inter­mediada por Sueli Camargo, coordenado­ra arquidiocesana da Pastoral do Menor, e por Luciney Martins, fotógrafo do O SÃO PAULO. Abaixo estão alguns trechos da íntegra da entrevista.

Ruth Maria recordou a devoção, des­de a infância, a Nossa Senhora do Belém, padroeira da cidade de Descalvado; a vida atuante de fé desde a tenra idade junto dos pais; e o amor à Igreja Católica Apostólica Romana: “Eu cresci neste amor à Igreja. Primeiro lá em Descalvado, depois quan­do vim para São Paulo. Tenho amor à Igre­ja e ao que ela faz, sempre séria, compro­metida e corajosa, uma Igreja que sempre falou a verdade, pois Jesus é o caminho, a verdade e a vida”.

Ruth Maria também recordou a convi­vência com os três Arcebispos – Dom Pau­lo, Dom Cláudio e Dom Odilo: “Pessoas diferentes, cardeais diferentes, cada um em uma época, vivendo uma realidade social e política, e correspondendo como Igreja a essas épocas. Isso que é bonito! Ver que cada um assumiu e viveu aquilo que devia viver”.

A leiga consagrada também lembrou que ajudou na organização das visitas a São Paulo dos papas São João Paulo II, em 1980, e Bento XVI, em 2007; mencionou as grandes manifestações públicas de fé na Arquidiocese – “o povo sabe o que quer, sabe no que crê e isso é bonito!” – e reafir­mou o orgulho de pertencer à Igreja: “Se eu tivesse que recomeçar minha vida, faria tudo igual. Tudo igual! Eu escolheria ser Igreja Católica Apostólica Romana. A Igre­ja me proporcionou muita coisa. Então, eu só tenho a agradecer a Deus e à Igreja”.

Consciente de que o caminhar da vida é um constante peregrinar para Deus, Ruth afirmava na ocasião: “Agora, a gen­te espera a vida de lá. E sabe que a hora vai chegar, quando Ele quiser, não é?”. Nos últimos meses de vida, continuava a rezar: “Estou aqui quietinha, mas procuro rezar, meu Terço está sempre comigo”.

Ao término da entrevista, Ruth re­comendou a todos os católicos: “Amem a Igreja e a Jesus Cristo”; e se dirigiu de modo especial aos jovens: “Se querem ser felizes, sejam fiéis a Jesus Cristo e à Igreja. O que a Igreja está querendo agora que a gente faça? A gente faz! E nunca esqueçam a Mãe, viu? Nossa Senhora tem que estar na nossa vida. Ela sempre esteve na minha e tenho muito amor a ela. É Mãe! Ela cuida da gente. Tenham amor a ela e vocês serão muito felizes!”.

O corpo de Ruth Maria foi velado em sua cidade natal, Descalvado, e sepultado na terça-feira, 4.

(Colaboraram: Karen Eufrosino e Fernando Arthur)

Comentários

  1. Aqui em casa ficamos bem sentidos pelo falecimento da querida Ruth Maria….Minha mãe, a conheceu primeiro, pois participava da Comissão do Diálogo Inter-Religioso de Nossa Arquidiocese e sempre encontrav a Ruth Maria nas Assembleias Arquidiocesanas…Anos depois, eu trabalhei na Curia Regional da Lapa e certa vez em que fui à sede da Cúria Metropolitana, me apresentei como o filho da Vanda, da Lapa. Ela abriu um baita sorriso e mandou um grande abraço para a minha mãe…Essa era a Ruth Maria, pessoa de enorme competência e calor humano…. Que Deus a receba muito bem no outro plano

    Roberto e Vanda Carreira – Região Episcopal Lapa.

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