Apocalipse: uma mensagem de fé e esperança na vida futura

‘A cidade não necessita de sol nem de lua para iluminar, porque a glória de Deus a ilumina, e a sua luz é o cordeiro’ (Ap 21,23)

Christo James/Pexels

Em setembro, a Igreja no Brasil celebra o Mês da Bíblia. Embora o Dia da Bíblia, 30 de setembro, já fosse comemorado desde 1947, a primeira vez em que se dedicou o mês todo à Palavra de Deus foi em 1971, por ocasião do cinquentenário da Arquidiocese de Belo Horizonte (MG). Com o passar do tempo, a comemoração foi assumida pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e se estendeu em âmbito nacional.

Com o intuito, mais uma vez, de dar destaque às Sagradas Escrituras durante este mês, o jornal O SÃO PAULO traz a seguir um artigo referente ao Apocalipse, livro que conclui todo o conjunto da Palavra de Deus.

SIGNIFICADO

Associada ao fim do mundo e ao juízo final, a palavra “apocalipse” é comumente utilizada como sinônimo de catástrofe e destruição.

Apocalipse, por sua vez, também é o nome do último livro da Bíblia, que, embora conhecido, é considerado uma obra de difícil compreensão por muitas pessoas. Dado o seu estilo enigmático, repleto de símbolos, seres fantásticos, lugares incomuns e alegorias, a mensagem do Apocalipse causa impacto e expectativa no leitor, baseada numa visão popular que deturpa o seu real teor e o concebe como mensageiro de tragédias que estão por vir.

Escrito no fim do primeiro século e cuja autoria é atribuída ao apóstolo João, o Apocalipse, do grego apokálypis, significa revelação, isto é, um ato pelo qual se retira o véu de algo e se permite conhecê-lo. No caso do Apocalipse, trata-se de revelar aquilo que acontece na história, abordando o presente e o futuro da Igreja, a humanidade e o fim dos tempos, e também descrevendo o juízo de Deus sobre os povos, a volta de Jesus e a eternidade no Céu.

CONTEXTO

No início do Cristianismo, os discípulos e os cristãos foram alvo de perseguição, não somente no meio judaico, mas também no meio pagão. Além disso, muitas eram as heresias que adulteravam a fé originária e se infiltravam nas comunidades, levando-as a cair no laxismo moral e arrefecendo o fervor primitivo. Assim, o contexto histórico do livro do Apocalipse retrata um momento delicado tanto para a Igreja quanto para os seguidores de Jesus, que aguardavam ansiosamente a segunda vinda do Senhor.

Após o término da narrativa dos Evangelhos, o livro dos Atos dos Apóstolos retrata Jesus Cristo que sobe aos céus, juntamente com a promessa de que Ele retornaria para julgar os vivos e os mortos. Essa esperança levou muitos cristãos, incluindo o apóstolo Paulo, a aguardarem a vinda de Jesus quase que de imediato, porém, o passar do tempo lhes mostrava que isso não seria tão iminente e que os fatos caminhavam em outra direção.

O Senhor, no entanto, deixou a todos na expectativa e disse que, quando voltasse, o faria como um ladrão, uma maneira figurada para explicar que sua volta se daria num momento inesperado, de improviso.

Mediante essa situação, era preciso um grito de esperança para animar os cristãos a perseverarem na fé, – por meio da prontidão, da oração e até mesmo à custa da própria vida terrena –, e para recordar o poder vitorioso do Senhor e da Igreja, uma vez purificada, com seu esplendor de Esposa do Cordeiro. Assim, o livro do Apocalipse vem ser um alento para os cristãos que viviam (e ainda vivem) num contexto histórico de perseguição, alimentando-os na esperança, fortalecendo-os na fé e estimulando-os a praticar o amor ensinado por Cristo.

INTERPRETAÇÃO

Ao longo da história da Igreja, diversas foram as interpretações acerca do significado do Apocalipse, as quais podem ser reduzidas às seguintes, conforme apontado na obra de Geraldo Morujão, Apocalipse – um guia de leitura para hojeEditora Quadrante.

Para uns, o Apocalipse conteria uma descrição profética dos principais períodos da história da Igreja, desde as suas origens até o fim dos tempos. Dessa forma, Joaquim de Fiore (+ 1201), dividia-a em sete períodos, sendo o último o “reino de mil anos” que Cristo viria instaurar na terra, antes do fim dos tempos.

Para outros, o livro visa a uma descrição simbólica da história contemporânea do seu autor, sobretudo as dificuldades e perseguições provenientes do Judaísmo e do paganismo. Essa interpretação teve início no século XVI e foi assumida pela crítica racionalista do século XIX: assim, o caráter escatológico da obra apenas se devia ao atraso da parusia, a segunda vinda de Cristo.

Há, ainda, aqueles que veem no Apocalipse uma obra de caráter escatológico: um anúncio figurado do fim dos tempos. As imagens e as calamidades descritas seriam os sinais precursores do fim do mundo, embora admitindo que de algum modo o fim dos tempos já tenha começado com a primeira vinda de Cristo. Essa interpretação foi feita a partir do século XVIII e ainda hoje é defendida por muitos.

Por fim, há a interpretação que parece ser a mais congruente e também a mais seguida pelos comentadores: acima de tudo, o Apocalipse deve ser visto como uma filosofia e teologia da História. Seguramente contém uma referência a acontecimentos da época em que foi escrito, porém projetados no futuro, exprimindo-se assim um drama comum a todos os tempos: a luta das forças do mal contra Cristo e sua Igreja, em que estes se saem vitoriosos.

Sendo assim, não se deve pretender encontrar argumentos em prol de um iminente fim de mundo, embora o Apocalipse aponte para o fim dos tempos, com o estabelecimento pleno do Reino de Deus, o juízo final e a vinda definitiva de Cristo, sem qualquer determinação de tempo definido.

ESPERANÇA

É inerente ao ser humano o ceticismo em relação ao futuro, porém deve-se pensar nele hoje, preparando-o com ações de bem, de justiça e de verdade. Tomar o texto do Apocalipse em sentido literal, sem levar em conta critérios importantes para bem interpretá-lo, como o contexto, o gênero literário adotado – no caso, o apocalíptico – e a condução da história na época, entre outros, faz com que se corra o risco de achar que a mensagem que ele diz é aquilo que nunca pretendeu dizer. A aplicação que se faz do livro nos dias atuais será ou não correta na medida em que o aproximar-se de seus textos seja feito com propriedade e conhecimento.

O autor do Apocalipse se apropriou dessas realidades para transmitir uma mensagem teológica e de esperança, mas, acima de tudo, um chamado à conversão. É preciso compreender que a história deve ser vista como um tempo da graça de Deus na vida de todos, uma oportunidade que o Senhor dá a cada um para procurar organizar aquilo que é inerente à criação de cada ser humano: ser imagem e semelhança de Deus.

O objetivo do livro do Apocalipse não é incutir medo nas pessoas. Pelo contrário, ele pretende mostrar que o que deve orientar as suas vidas é a fé, a esperança e a prática da caridade. O fim dos tempos um dia se concretizará e, longe de se configurar como uma catástrofe, o que o Apocalipse afirma é a aplicação de um senso de justiça incomparável, mediante a transformação do mundo em um novo céu e uma nota terra, em que a experiência da dor, do sofrimento e da morte será uma realidade superada, pela vitória de Cristo e sua Igreja.

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