Cardeal Parolin: a diplomacia vaticana cada vez mais a serviço da paz

O secretário de Estado, cardeal Pietro Parolin, enfatiza os aspectos fundamentais da reforma da Pontifícia Academia Eclesiástica. Uma instituição, afirma o purpurado, chamada pelo Papa Francisco a formar, antes de tudo, testemunhas de fé a serviço da Igreja e corajosamente comprometidas em construir pontes de diálogo e justiça.

Arquivo Vatican Media

Uma nova temporada para a diplomacia da Santa Sé. Foi lançada pelo Papa Francisco com a publicação de um Quirógrafo que sanciona oficialmente a renovação da Pontifícia Academia Eclesiástica, uma instituição que nasceu há mais de três séculos e que sempre teve a função de preparar os diplomatas pontifícios. O secretário de Estado, cardeal Pietro Parolin, que também é o Protetor da Pontifícia Academia Eclesiástica, conversou com a mídia do Vaticano sobre pontos salientes dessa reforma. E espera que a diplomacia vaticana esteja com coragem e criatividade – como pede o Papa – cada vez mais a serviço do diálogo entre os povos e as culturas.

A Pontifícia Academia Eclesiástica nasceu há mais de 300 anos. No entanto, os seus propósitos fundamentais permaneceram os mesmos…

Sim, mais de três séculos após sua fundação, a Pontifícia Academia Eclesiástica continua a formar diplomatas que são o olhar vigilante e lúcido do Sucessor de Pedro sobre a Igreja e sobre o mundo, empenhados em representar o Papa com um espírito missionário que não conhece fronteiras. Eles não apenas participam de debates internacionais, mas são chamados a interpretar e a propor, de acordo com a visão cristã da Igreja, soluções que possam contribuir para a construção de um mundo mais justo e fraterno.

Papa Francisco sempre deu atenção às pessoas envolvidas no percurso de formação da diplomacia do Vaticano. Quais são as principais qualidades que, segundo o Santo Padre, deveria ter um bom diplomata da Santa Sé?

Durante os seus encontros com os Núncios Apostólicos e Observadores Permanentes, Papa Francisco frequentemente descreveu os diplomatas pontifícios como “sacerdotes com as malas na mão”, enfatizando assim o caráter pastoral, missionário e universal do serviço deles. Foi exatamente esse espírito de serviço evangelizador que levou o Papa a reorganizar o percurso formativo para esses sacerdotes, com a intenção de fortalecer a preparação e adaptá-la aos desafios contemporâneos. Uma decisão que marca um novo capítulo na história da diplomacia pontifícia.

Aqui entramos diretamente no coração da reforma. Quais são as novidades mais significativas? Qual é o espírito por trás dessa decisão do Papa?

Com a reforma, a Academia se estrutura como um Instituto de Ensino Superior e de Pesquisa em Ciências Diplomáticas, de acordo com a visão inovadora proposta pela Constituição Apostólica Veritatis Gaudium e com os padrões internacionais de estudos universitários, em particular com o “Processo de Bolonha”, que realizou uma harmonização dos vários sistemas europeus de ensino superior. A Pontifícia Academia Eclesiástica agora poderá conferir graus acadêmicos de licenciatura (equivalente ao mestrado) e doutorado (PhD), oferecendo aos seus alunos uma formação que integra disciplinas jurídicas, históricas, politológicas, econômicas e, é claro, conhecimentos específicos em ciências diplomáticas. Com uma visão atualizada dos percursos universitários e de pesquisa, trata-se de um retorno às raízes, à fundação desta instituição que viveu muitos eventos na história, muitas vezes não fáceis para a Sé de Pedro. E, apesar das adversidades dos acontecimentos, a Academia continuou sendo o local de formação a serviço dos Papas. 

No Quirógrafo, o Papa enfatiza que a renovação não se limita a uma abordagem puramente técnica…

Certamente. Os programas de ensino estarão, de fato, intimamente ligados às disciplinas eclesiásticas, de modo que a preparação dos sacerdotes-alunos combine o âmbito diplomático com a dimensão de comunhão da Igreja e se desenvolva em harmonia com o método de trabalho da Cúria Romana, a evangelização e a ação missionária da Igreja. E depois a relação entre a Igreja e a sociedade, bem como o diálogo com a cultura contemporânea, que são considerados elementos fundamentais para a diplomacia vaticana, que atua como porta-voz da mensagem cristã em sedes internacionais. Também por esse motivo – embora a Academia seja organicamente inserida na estrutura da Secretaria de Estado – vários Dicastérios da Cúria Romana serão envolvidos na formação e nos órgãos colegiados da Academia. 

Essa reforma teve um longo período de gestação. Pode-se dizer que o Papa agora amplia o horizonte da ação diplomática da Santa Sé?

Papa Francisco, com aquele “realismo saudável” que caracteriza a sua ação pastoral, não se limita a propor uma reforma da formação diplomática baseada exclusivamente na aquisição de conhecimentos teóricos, mas convida a uma preparação que responda às exigências de um mundo em constante evolução. No Quirógrafo, o Papa observa que “não é suficiente limitar-se à aquisição de conhecimentos teóricos, mas é necessário desenvolver um método de trabalho e um estilo de vida que permitam de compreender profundamente as dinâmicas das relações internacionais”. A formação, portanto, deve ser orientada para a compreensão dos desafios concretos que uma Igreja cada vez mais sinodal enfrenta. Nessa perspectiva, o Papa enfatiza sobre qualidades imprescindíveis para aqueles que são chamados a representar a Sé Apostólica em sedes internacionais: a proximidade, a escuta atenta, o testemunho, a abordagem fraterna e o diálogo. E ainda, a coragem e a criatividade. Essas características devem ser acompanhadas da humildade e da mansidão, que constituem a essência da missão sacerdotal. Essas virtudes são a alma da ação diplomática que tem como objetivo o bem comum, a paz e a promoção da liberdade religiosa.

A guerra na Ucrânia, a guerra em Gaza e depois as muitas, tantas guerras esquecidas. Infelizmente, parece que a diplomacia, o multilateralismo, não tem mais o valor e a força que tinham antes. Como uma reforma como essa se encaixa no contexto internacional em que nos encontramos?

O Santo Padre nos lembra que somente por meio de um discernimento atento e de uma observação cuidadosa da realidade em constante mudança é possível dar sentido aos eventos globais e propor ações concretas. O diplomata pontifício não é, portanto, apenas um especialista em técnicas de negociação, mas uma testemunha de fé, comprometida em superar as barreiras culturais, políticas e ideológicas e em construir pontes de paz e de justiça. Essa abordagem permite à Igreja desenvolver caminhos concretos para a paz, para a liberdade de religião de cada crente e para a ordem entre as nações, sempre tendo em mente a missão de Cristo e o bem de toda a humanidade. Nesse horizonte renovado, a Pontifícia Academia Eclesiástica se torna não apenas um centro de excelência em ciências diplomáticas, mas também uma forja de formadores que são chamados a levar adiante a diplomacia da Santa Sé, com um estilo que reflete o coração do Evangelho: diálogo, reconciliação e paz.

Quais são seus desejos para essa reforma, para o que pode ser definido como uma verdadeira nova temporada da diplomacia da Santa Sé?

Com a reforma, o Papa Francisco deseja atualizar a abordagem da diplomacia da Santa Sé aos desafios do mundo contemporâneo, respondendo às necessidades de um ambiente diplomático cada vez mais globalizado e interconectado. A reforma visa fortalecer o vínculo entre a pesquisa e a formação acadêmica dos futuros diplomatas pontifícios com os desafios concretos que eles enfrentarão em suas missões no exterior. O meu auspício, portanto, não é apenas que sejam formados diplomatas especializados, mas sacerdotes que, conscientes da missão universal da Igreja, possam responder com competência, sensibilidade e espírito evangélico aos desafios globais, levando adiante a visão do Papa sobre a diplomacia como um instrumento de paz, justiça e solidariedade entre os povos.

Fonte: Vatican News

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