A viagem apostólica do Papa Francisco a quatro países da Ásia e da Oceania foi uma maratona de quase duas semanas na qual ele falou de fraternidade, valorizou a cultura e promoveu a família e a vida – em especial a dos mais jovens.
Nessa jornada, na qual passou por Indonésia, Papua Nova Guiné, Timor-Leste e Cingapura, o Pontífice, aos 87 anos, mostrou que as suas dificuldades de locomoção e a ampla diferença de fuso horário em relação a Roma não são motivo suficiente para impedi-lo de sair de casa. Ele insiste em ir ao encontro do povo de Deus espalhado pelo mundo, encurtando distâncias que parecem longas demais a esta altura da vida.
Ao contrário, o Papa foi recebido com grande calor humano por onde passou. Em Timor-Leste, pequeno país no Sudeste asiático, foi recebido por 600 mil pessoas de guarda-chuvas brancos e amarelos – praticamente a metade da população de toda a ilha, segundo estimativas oficiais – para a missa campal na esplanada de Taci Tolu.
Como escreveu a vaticanista Nicole Winfield, da Associated Press, é nesses momentos que o Papa Francisco mostra o melhor de si, ou seja, “nas periferias do mundo, entre pessoas esquecidas pelas grandes potências, ele pode sair do roteiro para responder ao espírito do momento”.
FAMÍLIA E VIDA
Ali ele elogiou o fato de que a população de Timor-Leste, que é mais de 90% católica, tem muitos filhos. “A proximidade de Deus acontece por meio de uma criança. Deus faz-se criança, não apenas para nos maravilharmos e comovermos, mas também para nos abrirmos ao amor do Pai e nos deixarmos moldar por Ele, para que possa curar as nossas feridas, recompor os nossos desentendimentos, pôr ordem na nossa existência,” disse na celebração. “Esta realidade é bonita de ver em Timor-Leste, porque há muitas crianças: vocês são um país jovem, no qual se sente a vida a pulsar, a desabrochar por todo o lado.”
Esse elogio foi uma reflexão que tem como pano de fundo a baixa taxa de natalidade de países mais desenvolvidos – como a própria Itália, por exemplo, ou Cingapura, que o Papa visitou. Sua visão de promoção da vida e da família está vinculada também a uma defesa dos direitos dos migrantes e dos bebês ainda não nascidos.
Durante o voo de retorno a Roma, quando conversou com jornalistas que o acompanham, Francisco reforçou sua visão ao responder a uma pergunta sobre as eleições nos Estados Unidos. Disse que cada eleitor deve decidir em consciência quem é o melhor candidato, mas a mensagem principal foi a mesma que deu em Timor-Leste e Cingapura.
“Mandar os migrantes embora, não dar aos migrantes a capacidade de trabalhar, não dar as boas-vindas aos migrantes é um pecado, é sério”, disse ele, em referência a políticas que procuram extraditar migrantes ou reprimi-los nas fronteiras.
“Depois, o aborto. A ciência diz que um mês após a concepção existem todos os órgãos de um ser humano, todos eles. Fazer um aborto é matar um ser humano. Você goste ou não da palavra, mas é matar”, acrescentou, aqui criticando políticos que procuram legalizar o aborto.
MULTICULTURALIDADE E FRATERNIDADE
Outra chave de leitura para essa longa viagem papal foi a valorização da convivência entre pessoas diferentes – e uma convivência que vai além da mera coexistência, mas uma convivência fraterna, amigável, terna. Isso ficou claro na Indonésia, quando assinou um acordo com Nasaruddin Umar, o Grande Imã de Jacarta, para criticar todo tipo de violência, em especial aquela perpetrada em nome da religião, e defender o cuidado da “casa comum”, o planeta Terra, nosso meio ambiente.
Em Papua Nova Guiné, um dos países mais ricos do mundo no que diz respeito à multiculturalidade, ele falou sobre a beleza das culturas humanas. Repleto de tribos e grupos indígenas, mais de 800 línguas são vivas por lá. “Em todos os países, a arte é altamente desenvolvida: danças, outras expressões poéticas… Mas em Papua Nova Guiné é impressionante, e em Vanimo o desenvolvimento da arte é impressionante. Os missionários que visitei estão na floresta, eles vão para a floresta para trabalhar”, declarou Francisco no avião.
E aí a sua mensagem de inculturação do Evangelho ficou clara. Também em Cingapura, ele procurou deixar claro que a mensagem e o amor de Cristo são para todos, universais. “Sem o amor, não somos nada”, disse. Não basta ter tudo de material: é preciso viver a gratuidade do amor de Cristo. “O mais belo edifício, o tesouro mais precioso, o investimento mais rentável aos olhos de Deus, o que é? Somos nós, somos todos nós: filhos amados do mesmo Pai, chamados, por sua vez, a espalhar o amor”, afirmou o Papa.