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Somente uma “diplomacia da esperança” pode levar paz ao mundo, afirmou o Papa Francisco em seu discurso à comunidade internacional na quinta-feira, 9. Todos os anos, o Pontífice se reúne nesta época com os embaixadores que representam suas nações junto à Santa Sé. Em um dos discursos mais importantes do ano, o Pontífice faz uma leitura da situação geopolítica do mundo, a partir de uma perspectiva espiritual e pastoral.
Ao fazer votos de um feliz ano para os diplomatas, e fazendo menção ao Jubileu da Esperança de 2025, o Santo Padre afirmou desejar que este novo ano represente para todos, cristãos e não cristãos, “uma oportunidade de repensar também as relações que nos unem, como seres humanos e comunidades políticas; de superar a lógica do confronto e, em vez disso, abraçar a lógica do encontro; de modo que o tempo que nos espera não nos encontre errantes desesperados, mas peregrinos da esperança, ou seja, pessoas e comunidades na estrada comprometidas com a construção de um futuro de paz”.
São 184 os países que atualmente mantêm relações diplomáticas plenas com a Santa Sé. A esses se acrescentam a União Europeia e a Ordem Militar Soberana de Malta. Há 90 missões diplomáticas credenciadas junto à Santa Sé com sede em Roma – as demais têm sede em outros escritórios diplomáticos europeus.
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CLIMA DE INSEGURANÇA
Francisco observou que o mundo vive em uma situação de perene instabilidade e lamentou que os líderes globais tenham criado um “clima de insegurança” difuso internacionalmente. “Infelizmente, começamos este ano com o mundo dividido por inúmeros conflitos, grandes e pequenos, mais ou menos conhecidos, e também pela retomada de atos hediondos de terror”, disse ele.
“Também vemos que em muitos países há contextos sociais e políticos exacerbados por contrastes crescentes. Estamos diante de sociedades cada vez mais polarizadas, nas quais um sentimento geral de medo e desconfiança em relação ao próximo e ao futuro está ardendo”, comentou o Pontífice. “Isso é agravado pela contínua criação e disseminação de notícias falsas, que não apenas distorcem a realidade dos fatos, mas também acabam distorcendo as consciências, despertando falsas percepções da realidade e gerando um clima de suspeita que fomenta o ódio, mina a segurança das pessoas e compromete a coexistência civil e a estabilidade de nações inteiras.”
O papel da diplomacia, acrescentou ele, “é promover o diálogo com todos, inclusive com interlocutores considerados mais incômodos ou que não se considerariam legítimos para negociar”. Somente por meio do encontro é possível “quebrar as correntes de ódio e vingança que aprisionam e desarmar os dispositivos do egoísmo humano, do orgulho e da soberba, que são a raiz de toda vontade beligerante que destrói”, alertou.
Em perspectiva pastoral e espiritual, o sucessor do apóstolo Pedro convidou as autoridades do mundo a acolher as oportunidades do Ano Jubilar e fazer gestos concretos de misericórdia. “O ano do Jubileu é uma época favorável para praticar a justiça, perdoar dívidas e comutar as sentenças dos prisioneiros”, exortou, em um apelo contra o endividamento dos países mais pobres e contra a pena de morte.
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CRÍTICAS À DIPLOMACIA ATUAL
Uma diplomacia da esperança é também a da verdade, do perdão, da liberdade e da justiça, disse Francisco. Ele criticou diferentes situações que considera um mal uso dos canais diplomáticos como, por exemplo, as tentativas de manipular documentos multilaterais para promover ideologias – não se pode falar, por exemplo, de um “direito ao aborto” como se fosse um direito humano, declarou, pois esse se opõe ao direito à vida.
Ele também mencionou a incapacidade de se chegar a decisões negociadas que promovam a paz e acordos de colaboração, de modo que as instituições diplomáticas passam a alimentar “um contínuo proliferar de armas sempre mais sofisticadas e destrutivas”.
“A perspectiva de uma diplomacia do perdão não é apenas necessária para sanar conflitos internacionais ou regionais. Ela atribui a todos a responsabilidade de se tornarem artífices da paz, de modo que sociedades verdadeiramente pacíficas possam ser construídas, nas quais as diferenças políticas legítimas, mas também sociais, culturais, étnicas e religiosas constituam um bem e não uma fonte de ódio e divisão”, afirmou.
Francisco falou também sobre a inércia diante de problemas transversais como o tráfico humano e de drogas, além das migrações e das novas formas de escravidão. Ele fez um forte apelo pela liberdade religiosa e o fim da perseguição de natureza religiosa. Lamentou, ainda, a falta de ações práticas eficazes para conter a crise climática global – tema adotado pela Doutrina Social da Igreja especialmente em sua encíclica Laudato Si’, de 2015.
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NOVAS FRONTEIRAS DIPLOMÁTICAS
Conforme nota informativa publicada pela Sala de Imprensa da Santa Sé, em 11 de outubro, foi assinado o Segundo Protocolo Adicional ao Acordo entre a Santa Sé e Burkina Faso sobre o status legal da Igreja Católica naquele país, um passo na direção do estreitamento das relações.
Em 22 de outubro, a Santa Sé e a China concordaram em prorrogar por mais quatro anos a validade do Acordo Provisório sobre a Nomeação de Bispos, concluído em 22 de setembro de 2018 e renovado em 22 de outubro de 2020 e 22 de outubro de 2022.
Por fim, em 24 de outubro, foi assinado o Acordo entre a Santa Sé e a República Tcheca sobre determinadas questões jurídicas. Também há relações diretas com os escritórios da Liga dos Estados Árabes, da Organização Internacional para as Migrações e do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados, sediados em Roma.