Horas antes de se aposentar voluntariamente como ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso, 67 anos, votou na noite da sexta-feira, 17, a favor da descriminalização do aborto até a 12ª semana de gestação.

O voto foi proferido no julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 442, protocolada pelo PSOL, em 2017.
A votação estava suspensa por pedido de destaque do próprio Barroso, mas ontem, ele cancelou o pedido e, assim, o processo retornou ao plenário virtual para votação, algo também solicitado pelo magistrado ao ministro Edson Fachin, presidente do STF, atitude que foi criticada por entidades de juristas católicos.
Com o voto do ministro, o placar do julgamento está em 2 a 0 pela descriminalização até a 12ª semana de gravidez. O primeiro voto favorável foi da ex-ministra Rosa Weber, em setembro de 2023, também dias antes de se aposentar da Suprema Corte. Barroso está aposentado a partir deste sábado, 18.
A sessão virtual de ontem começou às 20h, mas foi logo interrompida por um pedido de destaque feito pelo ministro Gilmar Mendes. Assim, o julgamento voltou a estar suspenso.
De acordo com o Código Penal Brasileiro, o aborto é crime, mas que não penalizado ao autor em caso de estupro, risco à saúde da gestante e em fetos anencéfalos.
ARGUMENTOS DE BARROSO
Segundo Barroso, a interrupção da gestação deve ser tratada como uma “questão de saúde pública”, e não pelo direito penal.
“A discussão real não está em ser contra ou a favor do aborto. É definir se a mulher que passa por esse infortúnio deve ser presa. Vale dizer: se o Estado deve ter o poder de mandar a polícia, o Ministério Público ou o juiz obrigar uma mulher a ter o filho que ela não quer ou não pode ter, por motivos que só ela deve decidir. E, se ela não concordar, mandá-la para o sistema prisional”,
O magistrado assegurou, ainda, que não é favorável ao aborto: “O papel do Estado e da sociedade é o de evitar que ele aconteça, dando educação sexual, distribuindo contraceptivos e amparando a mulher que deseje ter o filho e esteja em circunstâncias adversas. Deixo isso bem claro para quem queira, em boa-fé, entender do que se trata verdadeiramente”.
Ele também fez menção ao debate religiosos em torno do tema: “A tradição judaico-cristã condena o aborto. Deve-se ter profundo respeito pelo sentimento religioso das pessoas. Mas será que a regra de ouro, subjacente a ambas as tradições – tratar o próximo como desejaria ser tratado –, é mais bem cumprida atirando ao cárcere a mulher que passe por esse drama?”, completou.
A IGREJA CATÓLICA É CONTRA O ABORTO EM QUALQUER FASE

Em 14 de setembro de 2023, a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) divulgou uma nota enfatizando ser contra a qualquer possibilidade de descriminalização do aborto no Brasil, como está proposto na ADPF 442.
“Jamais um direito pode ser exigido às custas de outro ser humano, mesmo estando apenas em formação. O fundamento dos direitos humanos é que o ser humano nunca seja tomado como meio, mas sempre como fim. ‘Ninguém nunca poderá reivindicar o direito de escolher o que mais convém por meio de uma ação direta que elimine uma vida humana, pois nenhuma pessoa tem o direito de escolha sobre a vida dos outros’ (Vida: Dom e Compromisso II, n. 97)”.
“Como já nos manifestamos em 2017, por meio de Nota ‘Pela vida, contra o aborto’, reiteramos nossa posição em defesa da integralidade, inviolabilidade e dignidade da vida humana, desde a sua concepção até a morte natural. Entendemos que os pedidos da ADPF 442 foram conduzidos como pauta antidemocrática pois, atropelando o Congresso Nacional, exigem do Supremo Tribunal Federal (STF) uma função que não lhe cabe, que é legislar diante de uma suposta e inexistente omissão do Congresso Nacional, pois se até hoje o aborto não foi aprovado como querem os autores da ADPF não é por omissão do Parlamento, senão por absoluta ausência de interesse do Povo Brasileiro, de quem todo poder emana, conforme parágrafo único do art. 1º da Constituição Federal. De qualquer forma, jamais aceitaremos quaisquer iniciativas que pretendam apoiar e promover o aborto”.