‘Crédito do Trabalhador’ não é dinheiro extra; é empréstimo com juros menores

O SÃO PAULO detalha as vantagens e os potenciais riscos desta nova opção de consignado que já pode ser requisitada por 47 milhões de brasileiros

Marcelo Casal/ Agência Brasil

Em vigor desde 21 de março, por meio de medida provisória 1.292, do Governo Federal, o programa Crédito do Trabalhador já liberou mais de R$ 2,8 bilhões em empréstimos, firmados em 453,4 mil contratos. Os dados são da DataPrev e foram divulgados na terça­-feira, dia 1º, pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE).

Trabalhadores com carteira assinada no regime CLT, inclusive rurais e domés­ticos, e empregados CLT contratados por MEIs podem fazer solicitações de propostas às instituições bancárias, por meio do App da Carteira de Trabalho Digital (CTPS Digital), para essa nova opção de empréstimo consignado que já pode ser requisitada por cerca de 47 mi­lhões de brasileiros.

“No empréstimo consignado, as par­celas são descontadas diretamente da fo­lha de pagamento ou do benefício, o que de certa forma é controlado por ter uma margem limite para desconto em folha, por débito automático – reduzindo a ina­dimplência – e por isso as taxas de juros costumam ser mais baixas do que as de outras modalidades de crédito”, explicou, ao O SÃO PAULO, a economista Cris­tiane Mancini, mestre em Economia pela PUC-SP.

Em seu site, a Federação Brasileira de Bancos (Febraban) explica que jus­tamente em razão dessa segurança que os bancos têm de que irão receber pelo empréstimo concedido é que o con­signado costuma ter juros menores do que o rotativo do cartão de crédito ou o cheque especial: “Até agora, essa moda­lidade [consignado] estava acessível de forma direta para servidores públicos e aposentados do INSS. Para que o traba­lhador do setor privado tivesse direito ao consignado, sua empresa precisava firmar um convênio com o banco. Com a nova regra, essa exigência deixa de existir e o produto poderá ser oferecido aos consumidores por todas as institui­ções financeiras que aderirem ao pro­grama”.

COMO FUNCIONA?

Inicialmente, o trabalhador, por meio do App da Carteira de Trabalho Digital faz a requisição de uma proposta de crédito e autoriza que as instituições fi­nanceiras habilitadas pelo MTE acessem seus dados – nome, CPF, margem do sa­ lário disponível para consignação e tem­po de empresa.

Em até 24 horas, o trabalhador re­ceberá as ofertas para analisar a melhor opção e fazer a contratação no canal ele­trônico do banco. A partir de 25 de abril, a contratação também poderá ser feita por estes mesmos canais digitais.

O trabalhador tem até sete dias corri­dos após o recebimento do crédito para cancelar o empréstimo, devendo devolver a íntegra do valor à instituição financeira.

O prazo máximo para a quitação do empréstimo é de 96 meses (8 anos) e o valor das parcelas a serem descontadas mensalmente não pode passar de 35% do salário bruto do trabalhador.

E SE O TRABALHADOR FOR DEMITIDO?

Ao contratar o empréstimo consig­nado por meio do programa Crédito do Trabalhador, a pessoa autorizará a insti­tuição bancária a usar até 10% do saldo de seu Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e até 100% da multa rescisória.

“Como a dívida fica vinculada ao eSocial, caso [o trabalhador] troque de emprego, as parcelas podem ser des­contadas do salário na nova empresa. Se ficar desempregado, parte do FGTS e a multa rescisória são empenhados pela instituição financeira para quitar o em­préstimo. Se o valor for insuficiente, o pagamento das parcelas é interrompido e retomado quando o trabalhador conse­guir outro emprego. Nesse caso, porém, o valor das parcelas será corrigido. Além disso, o trabalhador poderá negociar ou­tra forma de pagamento com seu banco”, detalha a Febraban.

A MIGRAÇÃO DE EMPRÉSTIMOS PARA ESTE NOVO CONSIGNADO

Segundo o MTE, os trabalhadores que já têm empréstimos com descon­to em folha poderão migrar o contrato existente para o novo modelo, a partir de 25 de abril.

Já a partir de 6 de junho, o tomador do consignado via Crédito do Trabalha­dor terá a opção de fazer a portabilidade para um banco com taxas menores.

“Esse processo aumenta a concorrên­cia entre os bancos e facilita o acesso ao empréstimo em melhores condições. A dica é comparar os preços e prazos de pagamento e escolher a alternativa mais vantajosa para você”, recomenda a Febra­ban. “A instituição que você contratar irá quitar antecipadamente o valor da dívida com a anterior e você passará a pagar as parcelas a ela, de acordo com as condi­ções negociadas. Sem qualquer cobrança de tarifas ou taxas”, explica a federação dos bancos.

Na média, o valor do empréstimo por trabalhador nos primeiros dias do pro­grama foi de R$ 6.240,57, com parcelas de R$ 349,20, por 18 meses. A perspec­tiva do Governo Federal é que a média atual de 6% de juros cobrados pelos ban­cos para a concessão de crédito, caia para 2,5% a 3% ao mês.

O QUE CONSIDERAR ANTES DA TOMADA DO EMPRÉSTIMO?

A primeira dica, dada pelo próprio MTE, é ter paciência para aguardar o recebimento do maior número de pro­postas das instituições financeiras, para, assim, avaliar qual é a melhor oferta.

Também é recomendável conside­rar a efetiva necessidade de se contrair o empréstimo. A Febraban, por exem­plo, recomenda que o trabalhador faça a si próprio estas três perguntas: “Eu realmente preciso desse crédito agora ou posso esperar?”; “A parcela cabe no meu orçamento sem comprometer ou­tras despesas?”; “Eu conseguirei arcar com esse compromisso caso ocorra um imprevisto?”.

“A possibilidade de acesso a crédito com juros mais baixos pode ser vantajo­sa para quem deseja quitar dívidas mais caras, investir em um pequeno negócio, realizar melhorias na casa ou até com­pletar a entrada para comprar a casa pró­pria”, aponta a Febraban.

Além do valor dos juros cobrados no empréstimo, a economista Cristiane Mancini orienta que o trabalhador tam­bém leve em conta se o banco credor é conhecido e confiável e se lembre que o empréstimo contraído irá comprometer uma margem fixa de sua renda por um longo período. “Também é recomendá­vel que o tomador de crédito considere esse ‘dinheiro’ para o pagamento de dívi­das, não para contrair mais uma”.

Cristiane ressalta, ainda, que há em­préstimos com juros menores sendo ofere­cidos fora deste programa. “Em fevereiro, a taxa média de um empréstimo pessoal concedido por um banco era de 3,86% – ou seja, mais baixa que a de algumas propostas do Crédito do Trabalhador. Por outro lado, o programa também recebeu propostas de bancos para empréstimos com juros de 1,89%, considerada bem bai­xa, vantajosa, que dificilmente o trabalha­dor conseguiria em um empréstimo fora do Crédito do Trabalhador. Assim, se ele estiver mesmo precisando dos recursos, pode valer a pena”.

De acordo com a Pesquisa de Endivi­damento e Inadimplência do Consumi­dor (Peic), publicada pela Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), em janeiro 76,1% das famílias brasileiras estavam endividadas, e 20,8% dos habitantes do País destina­ram mais da metade de seus rendimen­tos para pagar dívidas.

Deixe um comentário