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Cresce no Brasil a devoção a São Miguel Arcanjo, o defensor celeste

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Em 29 de setembro, a Igreja Católica celebra a festa dos Santos Arcanjos Miguel, Gabriel e Rafael, figuras que aparecem na Bíblia com missões cruciais dadas por Deus. 

A Igreja ensina que a existência dos anjos é uma verdade de fé, confirmada de modo claro pela Sagrada Escritura e pela Tradição. Criados por Deus “desde o princípio do tempo”, os anjos são criaturas espirituais, não corporais, que fazem parte da obra divina ao lado do mundo visível e do ser humano, que une corpo e espírito. O Catecismo da Igreja Católica dedica os parágrafos 325 a 336 para tratar dos anjos, destacando que o Credo Niceno-Constantinopolitano afirma que Deus é Criador de todas as coisas, visíveis e invisíveis, abrangendo tanto a criação material quanto a espiritual, na qual se encontram os anjos. 

A palavra “anjo”, que significa “mensageiro”, expressa sua missão de servir a Deus transmitindo suas mensagens, e não a sua natureza. Eles habitam o “céu”, entendido não apenas como firmamento, mas como a realidade própria das criaturas espirituais que rodeiam o Senhor, participando de Sua glória e colaborando em Seu plano de salvação. 

Quanto à sua natureza, os anjos são seres pessoais, dotados de inteligência e vontade. Por terem vontade, Deus lhes concedeu o livre-arbítrio. Aqueles que escolheram se rebelar contra Deus se tornaram os anjos caídos, ou demônios. 

HIERARQUIA 

Na teologia católica, a hierarquia celestial é formada por nove coros de anjos, organizados em três hierarquias. A terceira hierarquia, mais próxima dos seres humanos, abrange os principados, arcanjos e anjos. A diferença entre anjos e arcanjos reside em suas missões: os anjos têm a missão de guardar e proteger cada pessoa individualmente, orientando-a nas questões cotidianas, enquanto os arcanjos ocupam uma posição especial por serem encarregados de missões importantes junto aos homens, atuando como os principais intermediários entre os mortais e Deus. Devido à importância de suas missões, os arcanjos possuem um profundo conhecimento dos mistérios divinos, o que os coloca em estreita proximidade com Deus. 

Cada um dos três arcanjos celebrados em 29 de setembro é conhecido por um nome que define sua missão bíblica: 

Miguel (Quem como Deus?) é o arcanjo que se insurgiu contra satanás e seus seguidores (cf. Jd 9; Ap 12,7; Zc 13,1-2); é defensor dos amigos de Deus (cf. Dn 10,12.21) e protetor de seu povo (cf. Dn 12,1). 

Gabriel (Força de Deus), um dos espíritos que estão diante de Deus (cf. Lc 1,19), revela a Daniel os segredos do plano de Deus (cf. Dn 8,16; 9,21-22), anuncia a Zacarias o nascimento de João Batista (cf. Lc 1,11-20) e a Maria, o de Jesus (cf. Lc 1,26-38). 

Rafael (Deus curou), um dos sete anjos que estão diante do trono de Deus (cf. Tb 12,15; Ap 8,2), acompanha e protege Tobias nas peripécias de sua viagem e cura-lhe o pai cego. A Igreja peregrina sobre a terra, especialmente na Liturgia Eucarística, associa-se às multidões dos anjos que, na Jerusalém celeste, cantam a glória de Deus (cf. Ap 5,11-14; Sacrosanctum Concilium-SC 8). 

PODEROSO GUARDIÃO 

A devoção a São Miguel Arcanjo tem crescido consistentemente, impulsionada por seu papel bíblico e tradicional como líder dos exércitos celestiais e poderoso defensor contra as forças do mal No Novo Testamento, ele é o capitão dos exércitos angélicos que luta contra o diabo e seus demônios. 

São Miguel é venerado como o defensor da justiça divina e da fidelidade a Deus, e como o grande protetor contra as forças do mal. Ele é visto como patrono especial do povo hebreu e, posteriormente, da Igreja Católica. Além disso, é invocado como patrono dos juízes, daqueles que exercem a justiça (frequentemente representado com uma balança), e, também, de soldados, policiais, paraquedistas e radiologistas. 

O capítulo 12 do livro do Apocalipse descreve a batalha em que Miguel e seus anjos pelejaram e venceram o dragão e seus anjos, resultando na expulsão deles do céu. Esse evento é um símbolo da luta contínua entre o bem e o mal. 

TRADIÇÕES 

A devoção popular é evidenciada por diversas aparições e santuários. O Monte Gargano, na Itália, o mais famoso de todos os locais dedicados a ele, foi consagrado pelo próprio São Miguel Arcanjo, conforme antiga tradição. Essa aparição no século V deu origem ao santuário, e a data de 29 de setembro é celebrada desde então como o dia da festa de São Miguel. 

Outros santuários importantes incluem o Mont Saint Michel, na Normandia, França; e o Saint Michael’s Mount, na Cornualha, Inglaterra. 

QUARESMA 

Uma prática devocional que se popularizou é a Quaresma de São Miguel Arcanjo, que vai de 15 de agosto a 29 de setembro. Durante esses 40 dias, os fiéis são convidados a intensificar orações e penitências para buscar maior proximidade com Deus sob a proteção de São Miguel. 

O ponto central da devoção é a oração escrita de próprio punho pelo Papa Leão XIII, em 1884, determinando que fosse recitada logo após todas as missas rezadas no rito latino: 

“São Miguel Arcanjo, defendei-nos no combate, sede nosso refúgio contra a maldade e as ciladas do demônio. Ordene-lhe Deus, instantemente o pedimos, e vós, príncipe da milícia celeste, pelo Divino Poder, precipitai no inferno a Satanás e a todos os espíritos malignos, que andam pelo mundo para perder as almas. Amém”. 

A intervenção de São Miguel na Revolução de 1932 

A devoção a São Miguel Arcanjo ganhou contornos singulares no Brasil, particularmente no interior de São Paulo. Uma intervenção notável e pouco conhecida, preservada pela fé popular, ocorreu no município de São Miguel Arcanjo, na Diocese de Itapetininga, durante a Revolução Constitucionalista de 1932. 

No auge do conflito armado liderado pelo estado de São Paulo contra o Governo Provisório de Getúlio Vargas, a cidade de São Miguel Arcanjo estava na iminência de ser tomada, com as tropas federais (sulistas) posicionadas e prontas para marchar sobre Sorocaba e, em seguida, a capital. Tudo apontava para a destruição, com o Capitão Dilermando de Assis à frente das ordens para o avanço. 

No entanto, na madrugada de 29 de setembro de 1932, data da festa litúrgica de São Miguel Arcanjo, um evento extraordinário interrompeu o curso da guerra. Embora um documento militar tenha ordenado a suspensão imediata de toda manifestação ofensiva à 1h, o que se seguiu é um testemunho de fé preservado na memória local. 

Basílica Santuário São Miguel Arcanjo 

CANHÕES CALADOS 

O céu estava carregado, e o barulho dos canhões indicava o prelúdio da batalha. De repente, um “estrondo diferente de tudo o que já se ouvira rasgou o silêncio”. Uma luz intensa e “sobrenatural” iluminou os campos e os soldados de ambos os lados. No meio dessa claridade, surgiu uma figura de “estatura imponente”, cuja voz firme e serena foi ouvida por todos, declarando: “A guerra acabou”. 

Imediatamente, uma força invisível imobilizou os exércitos: nenhum tiro foi disparado, os cavalos e canhões ficaram calados, e “a ordem vinda do Céu fora obedecida sem questionamentos”. As tropas paulistas desmobilizaram o acampamento, e a cidade foi poupada, “nenhum sangue foi derramado naquele chão”. 

Passados alguns dias, o Capitão Dilermando, ao entrar na cidade, dirigiu-se à igreja e, ao contemplar a imagem de São Miguel Arcanjo no altar, reconheceu o defensor que havia visto na clareira. Ele se ajoelhou, reconhecendo que “algo maior havia interferido”. Para os fiéis, a intercessão de São Miguel foi o grande sinal de que a cidade dedicada a ele, em seu dia, foi preservada de morte e da destruição. 

Basílica Santuário São Miguel Arcanjo 

MANIFESTAÇÃO DE FÉ 

Essa história é relatada no livro “São Miguel Arcanjo – O santo guerreiro da Revolução de 1932”, de autoria do Padre Márcio Almeida, Reitor da Basílica Santuário de São Miguel Arcanjo, publicado pela Angelus Editora

Este episódio, guardado na memória da fé, é visto hoje como um sinal de que São Miguel deseja, mais uma vez, defender o povo brasileiro. Em entrevista ao O SÃO PAULO, Padre Márcio vê um crescimento da devoção nos últimos anos, refutando que seja uma simples moda, mas sim uma manifestação do povo que busca a proteção divina. 

Para o Sacerdote, o crescimento da devoção reflete um fenômeno de fé e não uma simples tendência ou moda passageira. Em sua interpretação teológica, o Reitor vê esse aumento de fé como um prenúncio do que ele chama de cumprimento da profecia de Daniel, pela qual São Miguel se “levanta” para “defender o seu povo” diante do que ele considera um tempo marcado por ataques a valores essenciais, como a família, a moral e a própria fé cristã. 

CENTRO DE PEREGRINAÇÃO 

Como consequência dessa fé crescente, o santuário da cidade de São Miguel Arcanjo tornou-se um importante centro de peregrinação, recebendo anualmente visitantes de mais de 100 cidades e 10 estados brasileiros. Esse crescimento levou à organização do “Exército de São Miguel”, um movimento que ganhou força especial com a peregrinação de uma imagem do Arcanjo trazida do Monte Gargano, na Itália, pelo Instituto Hesed. 

A cidade foi escolhida para o encerramento da devoção da Quaresma de São Miguel deste ano e para sediar a Consagração do Brasil a São Miguel Arcanjo. As celebrações, que incluíram a Consagração das famílias do Brasil no “marco da aparição”, posicionam a cidade como o “coração simbólico” de um Brasil que deseja se proteger sob o Príncipe da Milícia Celeste. 

Para acolher essa devoção, o Santuário está desenvolvendo o projeto da Gruta do Arcanjo. A obra contempla a construção de uma igreja inspirada no Monte Gargano, com o qual o Santuário firmou um termo de irmandade, e uma imponente estátua de 70 metros de altura de São Miguel, que será visível de cidades vizinhas. Este é um projeto construído 100% com doações, que visa a criar um grande espaço de acolhimento e celebração, visto como um “sopro do Espírito Santo” e um chamado à conversão, como ressaltou Padre Márcio.

Para saber mais sobre a Basílica de São Miguel Arcanjo, acesse: https://basilicasaomiguelarcanjo.org.br/

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