Antecipação do 13º salário faz com que aposentados e pensionistas convivam com ligações de ofertas de crédito, que se feitas de modo recorrente podem ser consideradas como assédio ao consumidor

O Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) iniciou em maio e prossegue neste mês o pagamento antecipado do 13º salário para aposentados e pensionistas. São mais de 30 milhões de beneficiários, e o total de recursos é de R$ 62,6 bilhões.
Esse período de pagamento vem acompanhado do aumento da quantidade de ligações telefônicas e de outras formas de contato de bancos e operadoras de crédito para a oferta de empréstimos a aposentados e pensionistas, uma prática que se feita de modo insistente pode ser considerada abusiva.
A Lei Federal 14.181, publicada em 2021, acrescentou ao Código de Proteção e Defesa do Consumidor (CDC), um capítulo sobre a prevenção e o tratamento do superendividamento, tendo entre seus itens um no qual se proíbe “assediar ou pressionar o consumidor para contratar o fornecimento de produto, serviço ou crédito, principalmente se se tratar de consumidor idoso, analfabeto, doente ou em estado de vulnerabilidade agravada”.
BASTA DIZER ‘NÃO’ UMA VEZ
Na avaliação do advogado Roberto Pfeiffer, especialista em Direito do Consumidor e professor da Faculdade de Direito da USP, “se a pessoa já recusou a proposta uma vez ou não manifestou interesse em receber uma ligação, uma segunda tentativa já configura esse assédio do qual trata a lei, que se caracteriza justamente por essa recorrência na oferta de crédito, seja por telefone, seja naquelas abordagens de rua um tanto quanto insistentes”, detalha ao O SÃO PAULO.
O especialista recomenda que o consumidor seja explícito na recusa à oferta – “embora isso não seja uma condição para configurar o assédio” – e no caso da recorrência de tentativas, tome nota da maior quantidade de dados possível para uma posterior denúncia.
“Para fazer a denúncia, a pessoa precisará saber o nome do banco ou da operadora de crédito que fez a oferta, o número do telefone pelo qual recebeu a ligação, o horário e a data em que foi feita, e, se tiver, o nome da pessoa que fez o contato”, explica.
O assédio pode ser denunciado nos sites da Secretaria Nacional do Consumidor e da Fundação Procon-SP.
MAS DE TANTO INSISTIREM…
Mesmo cientes da lei, muitas empresas insistem na recorrência do contato e, por vezes, o consumidor acaba por contratar o empréstimo, ainda que em condições diferentes daquelas ofertadas inicialmente. Pfeiffer explica que nestes casos em que alguém faz a contratação após ser defrontado, alguns simples cuidados ajudam a evitar maiores prejuízos futuros.
“O melhor é sempre que a pessoa consiga gravar a conversa, mas ainda que não o faça, pela lei – embora isso seja muito descumprido – o funcionário do banco ou seu representante comercial é obrigado a disponibilizar previamente uma cópia do contrato e da proposta por escrito antes da concessão do empréstimo, mandando isso por e-mail, whatsapp ou SMS. E caso a cobrança venha maior que a oferta inicial, sempre vai prevalecer o que foi proposto pelo representante. Recomendo, portanto, que o consumidor só aceite fechar o contrato após receber, ao menos, a proposta por escrito, na qual devem estar os dados mais importantes como o valor que está sendo emprestado, a quantidade de meses em que será pago, juros e outros encargos mensais”, detalha.
ATENÇÃO AOS GOLPES!
Pfeiffer alerta ainda para as situações em que o empréstimo financeiro é apresentado ao cliente como credito pré-aprovado a ser depositado na conta bancária: “Isso é um empréstimo disfarçado, e ao receber uma proposta assim, o consumidor deve ser bem explícito de que não quer contratar esse serviço. Na verdade, neste caso, já não se trata nem mais de assédio, já é uma fraude, pois se fez uma contratação sem a anuência da pessoa”.
Não menos importante é redobrar o cuidado com os golpistas que não estão vinculados a instituições financeiras. Para deles se precaver, Pfeiffer dá duas dicas: “Jamais efetive qualquer operação financeira de empréstimo na qual a condição seja o pagamento de algum valor, o tal do adiantamento”; e nunca forneça dados pessoais e bancários: “Se o golpista tiver acesso a tais dados, poderá fazer uma contratação em nome do consumidor, por isso jamais forneça a sua a senha, o número da conta, o número do registro do INSS ou a cópia de qualquer outro documento”.
Já disse não a uma oferta de crédito e continuam ligando para você?
DENUNCIE!
Canal de denúncia da Secretaria Nacional do Consumidor.
Canal de denúncia da Fundação Procon-SP.
Permite bloquear ligações indesejadas de ofertas recorrentes de produtos e serviços.
IMPORTANTE:
Tenha em mãos os seguintes dados: nome da empresa, o dia e horário da ligação e, se possível, o nome de quem fez o contato.
E como dar um bom destino a esse dinheiro extra?
Desde 2020, o 13º salário de aposentados e pensionistas do INSS vem sendo pago no primeiro semestre do ano e não mais em agosto e novembro, como ocorria antes. O SÃO PAULO conversou com a economista Cristiane Mancini, mestra em Economia pela PUC-SP, para saber qual o melhor destino a ser dado a esse recurso extra.
Qual a melhor maneira de o aposentado/ pensionista investir ou poupar esse recurso do 13º salário?
Recomendo negociar as dívidas primeiramente. Isto é, se a dívida for com o cartão de crédito, parcelas de aluguel, com a “quitandinha”/“supermercado” ou farmácia do bairro, converse com a operadora do cartão e com o dono do estabelecimento. Muitas vezes, a renegociação é possível e a dívida pode ser diluída ou ainda diminuída. Assim que as dívidas forem pagas, recomendo investir o montante que sobrou, fazendo uma reserva para outro momento que precise.
Tendo esse recurso adicional, é um bom momento para contrair um empréstimo?
A taxa de juros básica (Selic) no Brasil permanece alta. Observamos que está menor se comparada a meses anteriores; no entanto, ainda alta. Essa taxa regula as demais taxas cobradas em cartões de crédito, na tomada de empréstimos e consignados. Dessa forma, é importante estar atento ao juro que será cobrado na tomada do empréstimo/consignado. Re- cordo que em qualquer tomada de em- préstimo/consignado haverá a cobrança de juros.
Se o aposentado optar pelo empréstimo, quais os cuidados que deve ter para não entrar em uma escalada de endividamento?
1 – Pesquise sobre a credibilidade do banco ou do correspondente em que for adquirir o empréstimo, ou seja, se ele possui autorização pelo banco. Os correspondentes são intermediários bancários, inclusive podem auxiliar de forma mais próxima que o banco em si.
2 – Desconfie de promessas milagrosas, “quantias exorbitantes” de dinheiro ao obter o empréstimo, pois não há “mágica”: a quantidade de dinheiro emprestada será proporcional à sua folha de pagamentos;
3- Certifique-se sobre o número de parcelas para que esteja ciente de “até quando” elas perdurarão;
4- Cheque todos os termos do contrato antes de assiná-lo e não assine caso existam algumas dúvidas ou esteja totalmente em branco.
5 – Tenha uma cópia do contrato, mesmo que seja no celular. Assim, caso as dúvidas permaneçam, você ou algum familiar pode consultá-lo sempre.
6- Confira mensalmente o valor recebido e o desconto em folha.