Pandemia aciona alerta para os cuidados da saúde mental

(Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil)

Além dos impactos sociais e econômicos, a pandemia de COVID-19 acentuou outro problema que atinge pessoas de diferentes idades e realidades: a saúde mental.

Se, de um lado, o confinamento forçado, o medo de ser infectado pelo novo coronavírus, a perda repentina de familiares sem a oportunidade de despedida, carga elevada de stress e angústia colaboram para o desenvolvimento de patologias psíquicas, de outro, aqueles que já tratavam da saúde mental tiveram seus tratamentos comprometidos ou até interrompidos pela atual crise sanitária.

Em entrevista à rádio 9 de Julho, dois profissionais da área da psicologia conversaram com a jornalista Cleide Barbosa sobre esse tema.

Renata Aleotti, psicanalista e voluntária na Missão Belém, ressaltou que as principais doenças mentais que afetam a população durante a pandemia são depressão, ansiedade, síndrome de pânico, inclusive em crianças e adolescentes. “As pessoas não estão aguentando o isolamento, há muitos casos de agressão, violência doméstica e as doenças mentais pré-existentes acabam sendo agravadas por esse contexto”, explicou.

Já João Paulo Machado de Sousa, psicólogo e professor do Programa de Pós- graduação em  Saúde Mental da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da USP, explicou que os transtornos mentais são causados pela combinação de uma pré-disposição genética, uma pré-disposição individual ou de personalidade e uma interação ambiental.

“Portanto, uma alteração genética sozinha não vai gerar o transtorno, mais se a pessoa tem, por exemplo, alguma dificuldade para lidar com os estímulos do cotidiano e acontece um evento grande na vida dela que a atrapalha, seja a perda de alguém, o fim de um casamento, uma nova mudança de cidade, aquela pré-disposição vai ser ativada e a pessoa pode desenvolver um transtorno mental”, destacou.

Ouça a entrevista com o psicólogo João Paulo Machado de Sousa

Prevenção

O professor enfatizou que a prevenção é o melhor meio para proteger a saúde mental, sobretudo, porque a maior parte dos transtornos não têm cura. “Nós trabalhamos com a ideia de remissão, que é quando os sintomas passam a ficar no nível tão baixo que não atrapalham mais o dia-dia. Porém, a volta dos episódios de transtornos é comum na maior parte dos casos. Por isso, é importante evitar a instalação do transtorno pela primeira vez”, afirmou o Psicólogo. Para isso, há vários estudos que buscam identificar os “gatilhos” que geram tais transtornos.

Os profissionais são unânimes em apontar a combinação de duas atitudes para proteger a saúde mental: informação sobre o assunto e a identificação dos possíveis sintomas. Quando esses sinais são percebidos a tempo, é possível intervir precocemente por meio de medicamentos e acompanhamento psicoterápico.

Embora se reconheça que haja mais canais de informação sobre o assunto, especialmente nas mídias, o professor da USP alerta para o risco de as pessoas confundirem a experiência normal da variação de emoções com transtornos. “Depressão é uma doença, tristeza é uma emoção humana normal. É importante fazer a distinção entre essas duas coisas”, disse João Paulo.

Tratamento

Quanto ao tratamento os especialistas indicam como ferramentas essências o trabalho conjunto com medicação, psicoterapia e atividade física.

João Paulo Machado explicou que as medicações são excepcionalmente importantes em alguns casos. “Hoje em dia, existem medicações que causam menos efeitos colaterais ou mais leves e que agem na região do cérebro que realmente precisa ser tratada. Antes, era como se você desse um tiro de bazuca um alvo pequeno. Até acertava, mas causava uma grande destruição em volta também”, disse.

“Quem está com transtorno mental grave tem grande sofrimento e, em geral, a família também. Várias vezes, é a medicação que viabiliza o acompanhamento de um tratamento, infelizmente, sempre de longo prazo, que vai fazer com que o paciente possa tentar retomar as suas atividades cotidianas.

Renata Aleotti salientou os serviços públicos como as unidades do Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) que, apesar da pandemia, mantêm os atendimentos tanto virtuais quanto presenciais, o que é de grande importância para o tratamento de doenças como a esquizofrenia, que necessitam de atendimento psiquiátrico e psicológico, além do uso contínuo de medicamentos que não pode ser interrompido.  

Sobre a internação, os profissionais consideram que essa deve ser a última opção dentre as alternativas de tratamento dos transtornos mentais. “É algo que, hoje,  tentamos evitar a todo custo, pelos problemas ligados à internação, o impacto e o sofrimento para a própria pessoa e para família. Além disso, há o alto custo de leitos de saúde mental com profissionais preparados para cuidar desses pacientes, daí as alternativas de tratamentos que nós temos são a psicoterapia, o trabalho dos psicólogos e a psiquiatria que é o trabalho com as medicações”, sublinhou João Paulo.

Renata Aleotti acrescentou que a família tem um papel primordial no tratamento de qualquer sofrimento mental. “Poder contar com a família e ter o apoio das pessoas que você gosta é fundamental para recuperação. É por isso que, muitas vezes, é importante fazer o acompanhamento também da família”, disse a psicanalista, frisando que nem sempre a família sabe lidar com tais transtornos e, por isso, precisam de uma rede apoio e orientação.

Unidade do Centro de Atendimento Psicossocial (foto: Prefeitura de São Paulo)

Onde encontrar ajuda?

São muitas as iniciativas voltadas para o atendimento de pessoas com transtorno mentais. Para ajudar nessa busca um grupo de psicólogos e outros profissionais da sáude, educação pesquisa, desenvolveram o Mapa da Saúde Mental disponibiliza em seu site informações sobre iniciativas de atendimento em diversas cidades do país, com explicação sobre o serviço e contatos para acioná-lo.

O site traz projetos relacionados a saúde mental para público em geral, para trabalhadores da saúde e para grupos específicos. Os serviços e projetos são exibidos de forma geolocalizada, de modo que o interessado possa inserir o seu CEP e visualizar as opções mais próximas.

Além disso, o projeto também traz explicações sobre como saber quando buscar ajuda, quais são os direitos das pessoas, como ajudar, como receber ajuda e como identificar se alguém precisa de apoio psicológico.

Programa Autoestima

Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) do Governo do Estado de São Paulo desenvolve o Programa Auto Estima, composto por vários serviços com diferentes complexidades interligados. 

O primeiro atendimento acontece nas Unidades Básicas de Saúde (UBS) onde é possível procurar orientação ou equipes de saúde da família município ou bairro.

Para saber outras informações, acesse o site.

Na capital paulista, o portal da Prefeitura também tem uma área destinada à saúde mental, álcool e drogas, com endereços doas unidades do CAPS na cidade, documentos e protocolos de atendimento. Para outras informações, acesse aqui.

Texto: Fernando Geronazzo

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