Retrato da Igreja na Amazônia mostra os avanços e desafios nascidos no Sínodo

Comunicação CNBB Norte 1

A Igreja da Amazônia está reunida em Manaus para seu V Encontro, iniciado no dia 19 de agosto e que será encerrado no dia 22. Mais de 80 pessoas, bispos, padres, representantes da Vida Religiosa e do laicato refletem no segundo dia a partir da realidade social e eclesial.

Em uma Igreja em que “anunciamos o Reino de Deus sempre novo”, segundo o Arcebispo de Manaus e presidente do Regional Norte1, Cardeal Leonardo Steiner. Um Reino que “anunciamos e vivemos” nos ministérios, serviços e vocações que fazem chegar o Reino a sua plenitude, com uma abundância que dá cem vezes mais. Ele destacou “quanta disponibilidade e quanta generosidade, quanta entrega, tudo por causa do Reino de Deus”, nos missionários e missionárias na Amazônia, que “foram atraídos”, segundo o cardeal disse na Eucaristia que deu início aos trabalhos do segundo dia do encontro.

A Igreja da Amazônia dá de sua pobreza, ressaltou o Cardeal Steiner, “e tudo isso é transformado em Reino de Deus, visibilização da vida de Deus entre nós”, sublinhando que “recebemos cem vezes mais, em cultura, em religiosidade, em doação, na sensibilidade para com os povos”. Ele enfatizou a importância dos últimos, queridos de Deus, “últimos porque Deus não consegue não se inclinar de modo bem facejo diante da fragilidade, da pequenez, do abandono de seus filhos e filhas”, chamando a ser anunciadores desta esperança e na Igreja da Amazônia, fazer memória “dos nossos antepassados que anunciaram o Reino de Deus, viveram o Reino de Deus e plantaram o Reino de Deus”, de sua missionariedade.

O Encontro é uma retomada das vivências do Sínodo para a Amazônia, que foi um tempo de muitas expectativas, segundo o bispo auxiliar de Manaus e vice-presidente da Conferência Eclesial da Amazônia (Ceama), Dom Zenildo Lima. O IV Encontro da Igreja na Amazônia, realizado em Santarém 2022, foi momento de recepção do Sínodo para a Amazônia, assumindo como tarefa, a partir das Igrejas da Amazônia, avançar nas lacunas, na questão ministerial, no rosto amazônico, na questão social. Tudo isso foi recolhido no Documento de Santarém 2022, considerado por Dom Zenildo Lima, “uma recepção do Sínodo para a Amazônia com os nossos aportes”.

Nesse Documento aparecem como diretrizes básicas a encarnação na realidade e a evangelização libertadora, com cinco linhas prioritárias: fortalecimento das comunidades eclesiais de base na ministerialidade e participação das mulheres; formação dos discípulos missionários; defesa da vida, dos povos da Amazônia; cuidado com a casa comum, migração, mineração, megaprojetos de infraestrutura; evangelização das juventudes.

Nessa perspectiva, as igrejas locais da Amazônia foram convidadas a responder a algumas perguntas, para ver os avanços e dificuldades, para verificar os passos dados e os entraves quanto a aplicação das propostas de Santarém 2022; perceber situações emergentes que tem exigido um peculiar cuidado pastoral; consolidar algumas iniciativas, indicando desdobramentos concretos quanto a compromissos, opções pastorais, responsáveis, prazos. Cada um dos seis regionais em que está dividida a Igreja na Amazônia Legal, seguindo as perguntas previamente enviadas, foram apresentando o resultado das escutas.

Se percebe um cansaço das comunidades e dos agentes, e existe na Igreja da Amazônia uma preocupação com o clericalismo, com o tradicionalismo, aparecendo a questão da formação presbiteral e o papel das mulheres na Igreja. Também aparecem algumas exigências, que fazem referência ao cuidado com a casa comum e a proximidade com os pobres. Uma Igreja que nunca deve esquecer a dimensão do Reino, onde as comunidades têm uma importância decisiva e que é desafiada a uma maior presença nas comunidades indígenas, a não perder a dimensão sinodal, presente por muitos anos na Igreja da Amazônia.

A análise de conjuntura mostra que a Amazônia é a região do Brasil com maior mobilidade humana, com deslocamentos internos e internacionais. Uma realidade marcada pela violência e a violação dos direitos humanos, com grupos especializados em contrabando, tráfico de pessoas e exploração no trabalho. Migrantes, principalmente venezuelanos, sem documentação, com um atendimento deficiente do governo brasileiro, marcados pelo sofrimento, que demanda da Igreja a necessidade de acolher e incluir os migrantes, para vencer a xenofobia e a aporofobia, segundo relatou a professora da Universidade Federal de Roraima, Márcia Maria de Oliveira.

Existe uma relação entre as fronteiras e os conflitos socioambientais, se dando uma parceria entre o garimpo criminoso, o crime organizado e o avanço do agronegócio. O crime organizado controla o garimpo, o tráfico de drogas, o tráfico de pessoas, e provoca o desmatamento, as queimadas, a contaminação da terra e das águas, a crise climática. Tem se dado, afirma a socióloga, um crescimento da violência na Amazônia, especialmente contra as mulheres, vítimas de assassinatos e de violência sexual, e da violência sexual contra crianças. Na Amazônia, uma criança ou adolescente é vítima de estupro a cada 8 minutos no último ano.

Na Igreja da Amazônia, se faz necessário, segundo o arcebispo de Cuiabá, dom Mário Antônio da Silva, olhar para fora, abrir janelas, abrir portas, abrir o telhado. Ele questionou como é o compromisso da Igreja na Amazônia, o que é prioridade. Diante da complexidade da realidade, se faz inevitável o profetismo, perguntando “como ser profeta da verdade em nossa querida Amazônia em nossos dias?” e “o que se espera da Igreja?”. Ele destacou a necessidade de uma formação sacerdotal para ser padres discípulos pastores, refletindo sobre o diaconato permanente e a dificuldade do clero para aceitá-lo, mas também sobre a questão econômica.

Em uma perspectiva meio ambiental, ecológica, Felício Pontes, procurador da República, ressaltou os aportes dos bispos da Amazônia nesse campo. Ele citou as palavras do Papa Francisco na Laudate Deum: “E o mesmo disseram, em poucas palavras, os bispos presentes no Sínodo para a Amazônia: ‘Os ataques à natureza têm consequências negativas na vida dos povos’”. Uma ideia que já aparece em Laudato Si´, que afirma que a ecologia e a justiça social estão intrinsecamente ligadas. Ele refletiu sobre o modelo predatório de desenvolvimento, combatido desde Santarém 1972, que se concretiza na exploração de madeira, na pecuária, na mineração, na monocultura e na infraestrutura, que tem levado a um 20% de desmatamento, considerando o direito a terra como causa dos conflitos.

No caminho sinodal da Igreja da Amazônia foi destacado o papel da Rede Eclesial Pan-Amazônica (REPAM) e a Conferência Eclesial da Amazônia (Ceama), organismos que expressam a vida da Amazônia, que são duas faces de uma mesma moeda, segundo o presidente da CEAMA, Cardeal Pedro Barreto. Um caminho iniciado no Concílio Vaticano II e que foi dando passos ao longo dos anos, em Medellin, Santarém, Aparecida, o Sínodo para a Amazônia, que desafia a Igreja da Amazônia a ser “um caminho trilhado por todos nós”, segundo a vice-presidenta da Ceama, Ir. Laura Vicuña Pereira Manso. Um Sínodo que “nos deu uma consciência pan-amazônica”, afirmou o bispo auxiliar de Manaus e vice-presidente da Ceama, Dom Zenildo Lima.

Fonte: Vatican News e CNBB Norte 1

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