Rumo à conversão ecológica, contam os passos individuais e os feitos em conjunto

Luciney Martins/O SÃO PAULO

Caminho indispensável para a Eco­logia Integral – tema da Campanha da Fraternidade de 2025 –, a conversão ecológica envolve “passar da lógica ex­trativista, que contempla a Terra como um reservatório sem fim de recursos, do qual podemos tirar tudo aquilo que quisermos, como quisermos e quanto quisermos, a uma lógica do cuidado” (Texto-base da CF 2025, 8). Ela também supõe uma mudança do nosso modo de ser, pensar e agir, como pessoas e comu­nidade, em busca de um viver mais inte­grativo entre Deus, os seres humanos e toda a criação, em que a cultura do amor e da paz tenha a primazia” (cf. CF 56).

“A conversão ecológica é trazer para o corpo e para a alma ações, formas de viver, que nos ajudam a integração naquilo que Deus criou. Envolve des­de rezar, para que você consiga trazer tudo isso para a sua alma e no relacio­namento com as pessoas, até as peque­nas ações do dia a dia, como não jogar alimento fora, nem consumir excessiva­mente, tampouco fazer uso de energia para além do necessário. É um voltar ao Gênesis, em que Deus nos coloca como cuidadores de tudo que Ele criou”, deta­lhou, ao O SÃO PAULO, o Frei Marx Rodrigues dos Reis, OFM, Pároco da Paróquia Santa Cruz, na Região Brasi­lândia, e responsável pelo Serviço Inter­franciscano de Justiça, Paz e Ecologia (Sinfrajupe).

VIVÊ-LA PELA ESPIRITUALIDADE CRISTÃ

Na encíclica Laudato si’ (LS), o Papa Francisco aponta várias convicções da fé cristã que ajudam no processo de con­versão ecológica, como “a consciência de que cada criatura reflete algo de Deus e tem uma mensagem para nos transmitir, ou a certeza de que Cristo assumiu em Si mesmo este mundo material e agora, ressuscitado, habita no íntimo de cada ser, envolvendo-o com o seu carinho e penetrando-o com a sua luz; e ainda o reconhecimento de que Deus criou o mundo, inscrevendo nele uma ordem e um dinamismo que o ser humano não tem o direito de ignorar” (LS 221).

No ponto 218 da encíclica, o Pontí­fice indica que o relacionamento do ser humano com a criação pode, por vezes, ser predatório – pecaminoso –, o que exigirá “reconhecer os próprios erros, pecados, vícios ou negligências, e arre­pender-se de coração, mudar a partir de dentro. A Igreja na Austrália soube expressar a conversão em termos de re­conciliação com a criação: ‘Para realizar esta reconciliação, devemos examinar as nossas vidas e reconhecer de que modo ofendemos a criação de Deus com as nossas ações e com a nossa incapacidade de agir. Devemos fazer a experiência de uma conversão, de uma mudança do co­ração’ [Conferência dos Bispos Católicos da Austrália, A New Earth The Environ­mental Challenge, 2002]”.

A CONVERSÃO COMUNITÁRIA

Taíse Cortês

Francisco também indica que “não basta que cada um seja melhor. Os in­divíduos isolados podem perder a ca­pacidade e a liberdade de vencer a lógi­ca da razão instrumental e acabam por sucumbir a um consumismo sem ética nem sentido social e ambiental. (…) A conversão ecológica, que se requer para criar um dinamismo de mudança duradoura, é também uma conversão comunitária” (LS 219).

Assim, a conversão ecológica não é um chamado apenas aos cristãos, mas a toda a humanidade. “Se cremos que tudo o que existe é de Deus, não há por que em um projeto que cuida das coisas de Deus, estarmos divididos. Ninguém deve ficar de fora deste pro­jeto maior. Sozinho você não vai lim­par um rio, nem conseguir trazer pão para a mesa de todo mundo ou fazer com que as pessoas vivam sem preci­sar consumir tantas coisas”, ressaltou Frei Marx.

Gestos concretos no dia a dia

Dos pontos 155 a 160 do Texto-Base da CF 2025, são listadas uma série de ações concretas, em três âmbitos, para realizar a ecologia integral a partir da conversão ecológica

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INICIATIVAS PESSOAIS

  • Tomar parte em práticas sistemáticas de educação ambiental nas comunidades, escolas e igrejas, para que possam ser vivenciados processos profundos de consciência planetária e da condição do ser humano na Ecologia Integral;
  • Adotar um estilo de vida afastado do consumismo e mais focado em valores duradouros e definitivos;
  • Incluir em suas atividades e ações a oração e a con­templação, permitindo-se experienciar momentos de reflexão sobre nossa relação com Deus, com os ou­tros e toda a criação;
  • Escolher alimentos saudáveis e sustentáveis;
  • Optar por formas de transporte mais sustentáveis;
  • Substituir o uso de descartáveis por utensílios reutilizáveis;
  • Destinar adequadamente os resíduos à coleta seletiva a partir da sua correta separação;
  • Reduzir o desperdício de água, praticar o reúso e cap­tar a água da chuva para o uso doméstico;
  • Praticar alguns dias de jejum e abstinência de carne e destinar o recurso economizado para os mais neces­sitados e à Coleta Nacional da Solidariedade.

ATITUDES DE ÂMBITO COMUNITÁRIO

  • Contemplar a Ecologia Integral como questão trans­versal que perpassa toda a ação eclesial nos planos diocesanos, paroquiais e comunitários;
  • Criar grupos de estudos sobre a Ecologia Integral, a partir da encíclica Laudato si’ e da exortação apostó­lica Laudate Deum;
  • Organizar retiros, caminhadas e via-sacras ecológi­cas, para despertar a consciência socioambiental;
  • Criar hortas comunitárias agroecológicas, incenti­vando a partilha dos alimentos produzidos, benefi­ciando os mais pobres;
  • Apoiar a coleta seletiva e a reciclagem nas comuni­dades e paróquias, com as cooperativas de catadores, para promover educação ambiental e apoiar a econo­mia circular;
  • Assumir ações comuns, tais como a utilização de energia solar, a reutilização da água da chuva, o plan­tio de mudas de árvores nativas e/ou a abolição do uso de descartáveis nas comunidades e paróquias;
  • Que as comunidades religiosas e as instituições de ensino católicas façam atividades educativas e pasto­rais sobre o tema da CF 2025.

AÇÕES SOCIAIS E NO ÂMBITO DA BOA POLÍTICA

  • Realizar audiências públicas e debates sobre as cau­sas da crise climática, as falsas soluções, a urgência da mudança dos hábitos de vida e o reconhecimento da natureza como sujeito de direitos;
  • Identificar a apoiar as comunidades atingidas por ca­tástrofes naturais – tempestades, furacões, ciclones, enchentes, secas prolongadas – e as vítimas dos cri­mes ambientais;
  • Fomentar iniciativas de formação contínua sobre os biomas e os ecossistemas locais, para ampliar a com­preensão das dinâmicas biológicas e dos desafios enfrentados;
  • Planejar estratégias para a proteção dos biomas e para a preservação das espécies e a mitigação dos efeitos das mudanças climáticas;
  • Promover e apoiar nas esferas públicas ações efeti­vas que visem à mudança do modelo econômico que ameaça a vida na Casa Comum;
  • Realizar audiências públicas e outras propostas legis­lativas que promovam a Ecologia Integral;
  • Tomar parte na Semana Laudato si’, que acontecerá mundialmente de 18 a 25 de maio.

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