Uma congregação nascida na Itália e desenvolvida com os imigrantes no Brasil

Irmãs scalabrinianas completam 125 anos de atuação ao lado dos mais vulneráveis e daqueles que deixaram suas terras de origem

Assim como a Beata Assunta Marchetti, cofundadora da congragação, scalabrinianas mantêm atenção aos mais vulneráveis em 28 países (foto: Luciney Martins/O SÃO PAULO)

A busca por melhores condições de vida levou muitos italianos a imigrar para o continente americano na década de 1890. Um dia, ao passar pela estação ferroviária de Milão, de onde as famílias seguiam de trem até o Porto de Gênova e de lá partiam para países como o Brasil, Dom João Batista Scalabrini, então Bispo de Piacenza, questionou-se como eles manteriam a prática da fé cristã em novas terras. Desde então, passou a convidar sacerdotese religiosos para ser missionários na América do Norte e do Sul e encontrou o “sim” do Padre José Marchetti, que já percebera que muitos de seus paroquianos na Arquidiocese de Lucca partiam para o outro lado do Atlântico.

Em uma das viagens do Padre Marchetti ao Brasil, uma mulher faleceu no navio, deixando a filha e o esposo, que, desesperado, disse que se jogaria ao mar. Prontamente, o Sacerdote o consolou e lhe prometeu que o ajudaria acuidar da criança. Na chegada a São Paulo, ele buscou ajuda e construiu um orfanato na colina do Ipiranga, na zona Sul. Tempos depois, em uma de suas viagens à Itália, pediu que sua irmã, Assunta Marchetti, então com 24 anos, discernisse sobre a possibilidade de viver como religiosa e ser a “mãe dos órfãos no Brasil”.

Os fatos remontam às origens da Congregação das Irmãs Missionárias de São Carlos Borromeo, as scalabrinianas, fundada em 25 de outubro de 1895, em Piacenza, pelo Beato João Batista Scalabrini, tendo como cofundadores o venerável Padre José Marchetti e Madre Assunta, beatificada em 2014 pelo Papa Francisco.

“A congregação foi gerada na Itália, mas se desenvolveu no primeiro mês dentro de um navio com os imigrantes a caminho do Brasil”, disse ao O SÃOPAULO a Irmã Leocádia Mezzomo, scalabriniana e postuladora da causa de canonização da Beata Assunta Marchetti.

Passados 125 anos, hoje cerca de 650 irmãs scalabrinianas estão em 28 países na Europa, Ásia, África, América do Norte e América Latina, a maioria no Brasil, com ações em favor dos migrantes, refugiados e famílias em situação de vulnerabilidade social.

Em São Paulo

O orfanato criado no Ipiranga para receber os órfãos de imigrantes italianos, com o tempo, também passou a acolher crianças de outras nacionalidades e filhos de escravos abandonados, um trabalho que prosseguiu mesmo após a morte do Padre Marchetti, em 1896, aos 27 anos de idade, vítima da epidemia de tifo. Outra casa, apenaspara meninas, o Orfanato Cristóvão Colombo, foi criada na Vila Prudente, na zona Leste, onde hoje está a Casa Madre Assunta Marchetti, local em que a religiosa faleceu em 1948, aos 76 anos, após ter atuado, ainda, em missões no interior paulista e no Rio Grande do Sul.

“Desde a fundação, continuamos a ser uma presença especial para as crianças; hoje não somente as órfãs, mas todas as necessitadas, aquelas cujos pais trabalham e não têm com quem deixar”, disse a IrmãLeocádia, ao recordar que 130 crianças são atendidas no contraturno escolar na Casa Madre Assunta, onde participam de atividades lúdicas, aulas de instrumentos musicais, dança e artes manuais, momentos de oração, além de receberem alimentação.

As atividades presenciais com as crianças estão suspensas em razão da atual pandemia, mas aquelas que precisam de assistência psicológica têm recebidoapoio. Além disso, por mês, de 80 a 120 cestas básicas são doadas a famílias em situação de vulnerabilidade social.

Como em outras casas das scalabrinianas pelo mundo, a da Vila Prudente tem recebido migrantes: desde 18 de setembro lá estão seis famílias de venezuelanos, com 33 pessoas ao todo. “No ano passado, acolhemos 12 famílias. Temos seis apartamentos e fornecemos tudo até que eles consigam trabalho e o dinheiro para alugar uma casa”, detalhou a Irmã.

A serviço dos irmãos mais necessitados

Em ação de graças pela congregação, uma missa foi realizada na capela da Casa Madre Assunta Marchetti, na Vila Prudente, na tarde do domingo, 25, presidida por Dom Luiz Carlos Dias, Bispo Auxiliar da Arquidiocese na Região Belém.

“Louvamos a Deus pelos 125 anos de uma belíssima história, um trabalho importantíssimo aos irmãos imigrantes e, de maneira especial, pela obra aqui no Brasil. Vamos também louvar pelos seis anos de beatificação da Madre Assunta Marchetti, realizada nessa data, em 2014, pedindo a Deus que o exemplo dela nos ajude cada vezmais a estar a serviço dos nossos irmãos mais necessitados e, de maneira especial, aos migrantes”, afirmou o Bispo, no início da missa.

Dom Luiz Carlos, na homilia, lembrou que o amor de Deus pela humanidade é incondicional – “Ele não impõe exigências para que a pessoa seja amada” – e que é impossível desvinculá-lo do amor ao próximo.

“Vivemos um tempo em que somos chamados a nos abrir para as interpelações dos nossos irmãos, especialmente dos mais necessitados, entre estes os que estão em processo migratório. E há belíssimos trabalhos da Igreja, como este que a congregação scalabriniana faz. Ela nasceu no contexto de migração dos europeus, em um momento economicamente difícil naqueles países, em que as pessoas buscavamnovas possibilidades, e a Igreja se fez próxima delasfez-se migrante com os imigrantes”, disse, recordando que também hoje, por necessidades diversas, muitos migram de seus países de origem, mas nem sempre são bem-aceitos nos locais para onde vão.

‘O migrante é para nós o Cristo’

E é nas diferentes realidades encontradas pelos migrantes que as scalabrinianas lhes estendem a mão. “Procuramos ser uma presença do amor de Deus para quem está em situação de mobilidade humana, como os migrantes e refugiados. Temos no México, por exemplo, uma casa de acolhida para mulheres latino-americanas que foram deportadas ou que queriam ir para os Estados Unidos, mas não conseguiram. Elas permanecem com as crianças em uma de nossas casas”, disse Irmã Leocádia.

“Como nos ensinou o beato fundador, Dom João Batista Scalabrini, o migrante é para nós o Cristo que espera uma resposta – ‘Eu era imigrante e você me acolheu’. Gostaríamos de poder responder a todos esses chamados de Deus, hoje. Eu fiquei muito feliz quando as minhas irmãs scalabrinianas foram para a Grécia, onde hoje há muitos refugiados. Existem tantos campos para sermos a presença de Deus, e sempre fazemos aquilo que podemos”, concluiu.

(Colaborou: Jenniffer Silva)

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