Nos últimos anos, os conflitos armados vêm se multiplicando por todo o planeta. Junto com casas, edifícios e construções em geral, eles reduzem a cinzas, de forma brutal e vertiginosa, equipamentos bélicos e munição. Nessa perspectiva, a indústria da guerra – produção, venda e consumo – continua trabalhando a todo o vapor. Fecha-se, desse modo, o círculo vicioso e maldito da violência. Em uma palavra, só ganham com a guerra os que fabricam e os que comercializam armas e munição. E tanto mais faturam quanto mais estreito se faz o círculo. Ao contrário, do ponto de vista socioeconômico, guerra e fome andam de mãos dadas.
Em meio aos escombros e ruínas, ficam os cadáveres insepultos, os mutilados disformes, as viúvas e os órfãos. Pelas estradas e pelas fronteiras, perambula a grande multidão dos refugiados. Como fugir do bombardeio implacável? Onde buscar abrigo e refúgio? Será possível encontrar uma nova pátria? Perguntas urgentes que não podem esperar, requerem respostas imediatas. Com efeito, diferentemente do migrante, o refugiado é aquele que não pode retornar sobre os próprios passos. Tem que seguir adiante. Atrás ficou o estigma da maldição gravado a ferro e fogo, um espectro de sombras e fantasmas. Concretamente, o risco de perseguição, prisão e morte.
Segundo os dados do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (Acnur), o número destes últimos, em todo o mundo, ultrapassa a casa dos 120 milhões de pessoas, e no Brasil, no final de 2024, chegava a mais de 150 mil. Se a esses fugitivos da guerra acrescentarmos as vítimas das mudanças climáticas, então teremos toda uma grande nação à deriva: sem raiz, sem rumo e sem lugar seguro. Cumpre recordar, por outro lado, que a produção e o comércio das armas, de uma parte, e as catástrofes climáticas, de outra, geram lucros fabulosos para um punhado de milionários e bilionários. São os “ricos cada vez mais ricos à custa de pobres cada vez mais pobres”, nos termos de São João Paulo II, em visita ao México.
Mas a indústria da guerra e as mudanças climáticas geram, aos milhares e milhões, vítimas que não têm para onde ir. Pelos mares, por trilhas inóspitas e pelas fronteiras cerradas, batem e rebatem o caminho da fuga, cruzam e recruzam com outros rostos anônimos igualmente desenraizados. Todos constituem, em conjunto, os “abortos” de uma humanidade obcecada pelo lucro e a ambição, ao mesmo tempo que cega, surda e indiferente aos feridos pelos estilhaços dessa política econômica globalizada que “exclui, descarta e mata”, como alertavam com insistente frequência as palavras proféticas do Papa Francisco.
Seu sucessor, Leão XIV, por sua vez, apontou desde logo para a necessidade de “uma paz justa e desarmada”. Anseio que, de resto, já se encontra com grande ênfase na encíclica Populorum Progressio (1967), em que São Paulo VI, ao cunhar a expressão de que “o desenvolvimento é o novo nome da paz”, sublinha a necessidade de um crescimento justo, integral, inclusivo e sustentável. Nesse sentido, não basta acompanhar apenas os indicadores econômicos, como o PIB e a taxa de câmbio ou de juros, mas também os indicadores sociais, como terra e trabalho, educação e moradia, saúde e infraestrutura, alimento e vestuário, e assim por diante. O certo é que, além de vítimas fatais e imediatas, a guerra produz vítimas potenciais. A devastação bélica deixa um rastro de pobreza e desigualdade social, assimetria que, cedo ou tarde, às vezes a conta gotas, causa a morte de não poucas pessoas.