Alain Delon e o Papa Emérito Bento XVI

Sergio Ricciuto Conte

Publicou-se nos últimos dias mais uma notícia que me deixou triste. O ator francês Alain Delon, amparado pelas leis da Suíça, país onde mora, declarou que vai realizar o suicídio assistido. Poderá ingerir ou inocular nele mesmo, por ação própria e com o amparo da lei do país, uma substância química mortal, droga que induz a inconsciência e após alguns minutos leva a morte.  Ainda, pelo noticiado, ele sofreu um derrame cerebral em 2019, teria se recuperado bem e está lúcido o suficiente para manifestar aos filhos o desejo de interromper a vida. 

Não quero e não devo julgar a pessoa de Alain Delon. O episódio, porém, pôs na pauta da mídia um assunto frente ao qual eu não quero me calar, o suicídio assistido. Estou convicto de que é injusta uma lei que possibilite tal atitude pois, em vez de ajudar a eliminar as causas do problema, incentiva e favorece a eliminação da pessoa que sofre; causa morte em vez de fortalecer a vida.

Para entender meu ponto de vista, proponho uma pergunta: por que uma pessoa pede para morrer? Porque está sofrendo muito. Pode ser um sofrimento devido a uma dor física, neurológica ou dor psicológica ou ainda dor por perda do significado ou sentido da própria vida. 

Frente à dor física, existem tratamentos com medicamentos que podem diminui-la ou mesmo eliminá-la; mas para tanto a pessoa precisa ter acesso a esses recursos, podendo comprá-los ou recebendo-os de serviços públicos. Quando a dor é psicológica, existem profissionais, técnicas e medicamentos que são de grande ajuda, mas também aqui pode ser que quem sofre não tenha acesso a esses recursos. Num caso e em outro, estamos frente a injustiças sociais devido à precariedade de políticas de saúde que garantam os benefícios terapêuticos a que cada pessoa humana tem direito, independentemente da sua condição social.

Quadro que não se resolve com leis que autorizem, por exemplo, o suicídio assistido. Ao contrário, devemos ter leis e políticas públicas que garantam a todos o acesso a esses recursos terapêuticos. É, portanto, ação de responsabilidade dos legisladores e governantes; e deles devemos cobrar políticas nesse sentido.

Entretanto, quando o sofrimento se deve à perda do significado ou sentido da vida, além de suporte psicológico especializado, o que está faltando para a pessoa em desespero é a ajuda de outras pessoas para que ela não se sinta só, uma amizade em que se possa compartilhar as dúvidas e incertezas da vida, uma companhia que ajude em questões de busca de sentido ou mesmo da solução de questões práticas da vida, como as dificuldades financeiras, de moradia etc. Tal sofrimento, devido à solidão e abandono, se supera no encontro de uma companhia de pessoas dispostas a ajudar. E vejam que esse tipo de ajuda é responsabilidade de cada um de nós e não só do Estado.

Por outro lado, a mídia nos oferece notícias revigorantes. Publicou-se alguns comentários do Papa Emérito Bento XVI a respeito da sua perspectiva frente aos sofrimentos e limitações impostas pela idade avançada e consequente finitude da própria vida. Em suas palavras: “Só posso dizer que, na lenta diminuição das forças físicas, estou interiormente em peregrinação para Casa (do Pai). Para mim, neste último trecho do caminho, às vezes um pouco esgotador, é uma grande graça estar rodeado de amor e bondade tamanhos que eu não poderia ter imaginado”.

Não queremos antecipar a morte, mas peregrinar com dignidade até ela. Cada um de nós é chamado a refletir sobre nossa particular responsabilidade frente a essas provocações.

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João Guilherme M. Barbuto
João Guilherme M. Barbuto
2 anos atrás

Gostei do artigo. Diria apenas, a título de colaboração, que o Estado tenderá a preferir o suicídio assistido, tal como já vem fazendo, diante do menor custo que ele representa. O suporte, que o autor considera como medida de justiça, somente será justiça se houver a crença direitos que requerem um Deus Pai Todo Poderoso. Caso contrário, a lógica deste mundo dirá que é melhor gastar dinheiro em causas ainda com esperança para esta vida (educação, saneamento básico, saúde preventiva, etc.) do que com doentes desenganados. Sem a crença corajosa em um Deus que se deixou matar, a humanidade continuará dividida entre senhores e escravos, nas sábias e descrentes palavras do filósofo grego. Assim em vez de esperar ações do estado descrente é melhor que os crentes se organizem séria e responsavelmente para enfrentar essas inevitáveis dificuldades e estejam presentes para ajudar. Cordialmente. João Guilherme