‘Assim, vos tornareis filhos do vosso Pai celeste’

Deus é Pai em vários sentidos. É Pai enquanto criador de todas as coisas: “não temos todos um único Pai, um único Deus que nos criou?” (Ml 2,10). Ele fez, mantém e governa tudo o que existe por meio de sua Providência. De um modo especial, Deus é Pai dos seres humanos, as únicas criaturas da terra que Ele quis por si mesmas. Criou diretamente nossas almas à sua imagem, para que o conheçamos, amemos e sirvamos. 

De um modo ainda mais profundo, Deus é o Pai dos cristãos. Além da filiação natural, por meio da fé em Jesus Cristo tornamo-nos “filhos no Filho”. Deus Pai olha para cada um de nós como se fôssemos o próprio Cristo. De um modo semelhante a como dissera de Jesus no Jordão, o Pai diz-nos também sobre nós “este é meu filho amado no qual pus minha afeição” (Mt 3,17). Pelo Batismo, ungiu nosso corpo e alma com o Espírito Santo, tornando-nos agradáveis a Ele.  

São Paulo menciona essa paternidade sobrenatural: “Não recebestes um espírito de escravos, mas de filhos adotivos, pelo qual clamamos Abba! Pai!” (Rm 8,15). Também São João se refere à filiação dos cristãos: “a todos que o receberam deu o poder de se tornarem filhos de Deus, aos que creem no seu Nome” (Jo 1,12). A filiação divina sobrenatural consiste numa semelhança com Deus por meio da fé e da caridade; numa participação na filiação de Cristo; numa união profunda com a Santíssima Trindade. A nós se aplicam estas palavras: “o santuário de Deus é santo, e vós sois esse santuário” (1Cor 3,17). 

O Evangelho deste domingo afirma que tal condição de filhos adotivos se manifesta concretamente, entre outras coisas, pelo amor aos inimigos. Se somos filhos de Deus, foi-nos dada a capacidade de amar como o Filho Jesus: “amai os vossos inimigos e rezai por aqueles que vos perseguem! Assim, vos tornareis filhos do vosso Pai que está nos céus” (Mt 5,44s). Isso não é fruto da “boa vontade” dos homens, mas uma graça concedida por Deus. 

Mesmo pecadores são capazes de amar os próprios filhos, namoradas, amigos de diversão e animais de estimação. Até os maus são capazes de sentimentos de compaixão, afeição e mesmo de lealdade. Porém, perdoar ofensas graves, orar por quem nos prejudicou e querer a salvação de quem nos quer o mal é algo sobrenatural, possível com a ajuda de Deus. 

Não se trata de ser indiferente, ou fazer de conta que o mal não existe. O pecado custou o Sangue de Cristo derramado por nós! Mas Jesus expiou nossos pecados, perdoou os que o crucificavam, e nos pede uma generosidade semelhante à do Pai, que “faz nascer o sol sobre maus e bons” (Mt 5,45). Propõe-nos uma caridade de autênticos filhos: “sede perfeitos como o vosso Pai celeste é perfeito” (Mt 5,48). 

Esse amor não é um sentimento; é um ato da vontade sustentada pela graça. Para que seja possível, a oração é o primeiro passo. Rezemos pelos que nos prejudicaram ou nos querem mal! Peçamos a Deus que nos faça “querer” bem a todas as pessoas? Isso é já começar a amar. 

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