Aumenta a nossa fé!

Já se disse que, em nossos dias, há muita religião, mas pouca fé. Será assim mesmo? Também se disse que as confusões religiosas, a instrumentalização da religião para muitos fins, inclusive ideológicos, econômicos e políticos, decorrem da falta de fé verdadeira. Fala-se da fé como de um desejo ou expectativa humanos em relação àquilo que pode vir a acontecer, ou se deseja que aconteça: “Tenho fé que vou ganhar na loteria”… “Tenho fé que vou passar no exame”… Essa poderia ser uma espécie de “fé humana”, mas não é essa a fé a que nos referimos aqui. 

No entendimento da Igreja Católica, a fé religiosa é uma das três virtudes teologais recebidas graciosamente no Batismo, junto com a esperança e a caridade. Ela é um dom sobrenatural dado por Deus, e não simples conquista humana, embora necessite da participação e da correspondência humanas. Ela nos é dada em gérmen, como semente, e precisa ser acolhida e cultivada de maneira consciente, para que se torne pessoal, se desenvolva e dê frutos. Caso contrário, ela permanece uma capacidade não desenvolvida e infrutífera. 

A fé é a capacidade de reconhecer e acolher pessoalmente a Deus em nossa vida e de desenvolver com Ele uma relação pessoal, confiante e perseverante. A fé sobrenatural é a abertura a Deus, o reconhecimento e a adesão a Deus, que se traduzem na exclamação: “Eu creio!”. Pela fé, aprendemos o santo “temor de Deus”, capacidade que o Espírito Santo nos dá para respeitarmos a Deus, sua soberania, sua vontade e seus desígnios sobre nós e sobre o mundo. Pela fé, aprendemos a obedecer a Deus, a ouvir e acolher sua palavra e seus mandamentos, superando nossa soberba autossuficiência. Pela fé, tornamo-nos capazes de rezar, de falar com Deus, de adorar, louvar, bendizer e amar a Deus, de reconhecer nossa insuficiência, de confiar em sua misericórdia e pedir perdão pelos nossos pecados. Sem a fé, nada disso seria possível. 

A fé não equivale a uma “prova científica”, mas a uma certeza interior, que nos vem da adesão ao Deus veraz, justo e fiel, digno de ser crido e amado. As explicações humanas sobre as verdades da fé são importantes, mas não são essas explicações que nos fazem exclamar: “Eu creio!” A nossa fé, mais que a afirmação de verdades elaboradas e ideais, é adesão ao Deus pessoal, fruto de uma experiência interior muito pessoal. Essa experiência primeira e forte vai se explicitando na adesão às verdades sobre Deus, proclamadas pela comunidade de fé. Por isso, a fé nasce, sobretudo, da experiência da oração e do amor de caridade, vivida na comunidade de fé. Com razão, a Igreja ensina a quem busca a fé: reze, peça com insistência e humildade, e ela lhe será concedida certamente. Deus não nega esse dom a quem o pede e procura sinceramente. 

A fé sobrenatural nos faz capazes de ir além das certezas meramente humanas. Em certa passagem do Evangelho segundo São Lucas, Jesus fala da necessidade de perdoar sempre ao próximo que nos ofende. Os apóstolos ficam perplexos, bem sabendo que isso, humanamente, é muito difícil. E, então, pedem a Jesus: “Aumenta a nossa fé!” (cf. Lc 17,3- 5). É o mesmo que admitir: somente com a força da fé sobrenatural é possível perdoar sempre. Outra situação que coloca à prova a fé é o sofrimento, a maldade e a violência contra o justo e o inocente, ou as provações que alguém precisa enfrentar, sem saber o motivo. A muitos vem a tentação de descrer e abandonar a fé ou de interpelar a Deus, perguntando: por qual motivo devo sofrer? Por que me acontece isso? Questionar é próprio do homem, e esse não é o problema. Mas o abandono da fé no meio das provações seria como apagar aquela pequena chama que ainda nos pode iluminar e guiar no meio de uma escuridão profunda. 

As provações da fé são comuns na vida de todas as pessoas. Os santos também as enfrentaram e, por vezes, foram muito difíceis e prolongadas. Quem procura apenas as consolações da fé pode ainda se encontrar numa etapa infantil e pouco consolidada no seu caminho de fé. A perseverança na fé, mesmo nas provações, pode ser um problema, sobretudo quando temos ainda uma fé muito centrada em nós mesmos, nos nossos desejos e satisfações, em vez de ser Deus mesmo o “objeto” de nosso ato de fé. As provações nos ajudam a crescer e amadurecer na fé, para nos tornarmos mais fiéis e generosos na vivência da fé. 

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