O escritor israelense Amós Oz publicou um livro chamado “Contra o Fanatismo”, resultado de três conferências proferidas em 2002, na Alemanha. Falecido em 2018, dizia que “não escrevia para entreter, mas sim para que os leitores se fizessem perguntas”. Procuro seguir o mesmo espírito; escrevo para que os leitores se façam perguntas.
O fanatismo, escreve Amós Oz, “é mais antigo que o Islã, mais velho que o Cristianismo, que o Judaísmo, que qualquer Estado, governo ou sistema político, que qualquer ideologia ou fé no mundo. O fanatismo é, infelizmente, um componente onipresente da natureza humana, um gene do mal, se quiserem chamá-lo dessa forma”. Logo, não é uma característica de uma raça, de uma etnia, de uma dada nação ou comunidade. É algo próprio da natureza humana, pessoal.
Para Amós Oz, a reivindicação típica dos fanáticos é a seguinte: “Se julgo mau, elimino-o, junto com os seus vizinhos”. E, ainda, “a essência do fanatismo reside no desejo de forçar as outras pessoas a mudar. […] O fanático é uma criatura generosa. É um grande altruísta. Frequentemente, o fanático está mais interessado em você do que nele próprio. Ele quer salvar sua alma, quer redimi-lo, quer libertá-lo do pecado, do erro, do fumo, de sua fé ou de sua falta de fé, quer melhorar seus hábitos alimentares ou curá-lo de seus hábitos de bebida ou de voto”. Se olharmos em um espelho, ou ao nosso redor, é possível encontrarmos alguns fanáticos, ainda que em graus distintos.
Na conferência, “Como curar um fanático?”, Amós Oz, em um dado momento, questiona: “Como lidar com pessoas que são, na realidade, bem mais que pontos de exclamação ambulantes? O fanatismo é, com frequência, intimamente relacionado a uma atmosfera de desespero profundo. Em um lugar em que as pessoas sintam que não há nada além da derrota, humilhação e indignidade […]. A única maneira de repelir o desespero é gerar e disseminar esperança – talvez não entre os fanáticos, mas entre os moderados”, responde.
É preciso esclarecer, diz Amós Oz: “Que seja instaurada uma esperança concreta de condições melhores e da resolução dos problemas, para que os moderados saiam de seus refúgios e se imponham aos fanáticos. Só então a desesperança e o desespero podem recuar e o fanatismo ser contido”. Obviamente, atuar para dissipar essa atmosfera é muito importante e necessário, mas não basta!
Interessante notar como Deus tem seus caminhos. É possível encontrá-lo nos textos de Amós Oz, esse escritor fantástico e artífice da paz em seu país, ainda que não professemos a mesma fé.
Se para Amós Oz as pessoas carregam em sua natureza humana um gene do mal; para nós, católicos, todos nascemos com uma natureza humana decaída e manchada pelo pecado original. Se para Amós Oz é preciso que seja instaurada uma esperança concreta contra o desespero; para nós, católicos, a esperança é a certeza de saber-se filhos de Deus, oposição radical ao desespero profundo. Se para Amós Oz, a essência do fanatismo reside no desejo de forçar as outras pessoas a mudar; para nós, católicos, é tocar o coração do outro com amor e profundo respeito a sua liberdade pessoal.
Contra o fanatismo, em especial o religioso e o político, nós, católicos, aprendemos, também, com o Papa Bento XVI, em sua magistral aula magna na Universidade de Regensburg, em 2006: “Deus não se compraz com o sangue; não agir segundo a razão é contrário à natureza de Deus. A fé é fruto da alma, não do corpo. […] Para convencer uma alma racional, não é necessário dispor do próprio braço, nem de instrumentos para ferir”. A violência não pode ser uma ferramenta do amor, tampouco a indiferença.
O fanático está mais interessado em você do que nele próprio”, nos diz Amós Oz. Há quem entenda que nós, católicos, também somos assim. Nada mais falaz, pois Cristo nos disse: “Amarás o teu próximo como a ti mesmo”. Ou seja, somente quando Deus torna-se o centro e raiz de nossas vidas, é que “amar como a si mesmo” torna-se possível. Quem não estiver em paz consigo mesmo não será capaz de amar ao próximo como Ele nos amou.
Ale, muito próprio e muito bom. Gostei bastante do texto. Obrigado.