Home office: um benefício para a família?

Uma das mudanças mais marcantes nos últimos meses tem sido o novo local de trabalho para um número cada vez maior de pessoas: a própria casa, ou home office. Com o mantra #FiqueEmCasa, as pessoas foram adaptando o trabalho profissional a partir do próprio domicílio. Alguns já afirmam ser um caminho sem volta. Existem os que pensam, até mesmo – e alguns já o fizeram –, em mudar de endereço, levando em consideração que trabalhando em casa podem morar em qualquer lugar. Outros se animam e afirmam que podem conviver mais com a família. O home office chegou para todos? A palavra home está fortemente vinculada ao lar, família. Isto implica realmente uma alternativa favorável?

A análise é maior do que o espaço deste artigo, porém a melhor saída é a resposta que cobre quase todas as perguntas: “depende”. Depende do quê? No conceito home (em casa) e office (trabalho, serviço, escritório) está o primeiro grande divisor de águas. Nem todo trabalho pode ser realizado em casa, pelo menos dentro dos recursos atuais conhecidos. Assim está a enorme categoria de operários de indústrias, de trabalhadores da construção civil, das funcionárias domésticas, dos motoboys (categoria que cresceu com o home office dos outros), várias categorias de profissionais da saúde, do padeiro, do pintor, do motorista, enfim, a lista é interminável. Para estes, que compõem a grande maioria da sociedade, não há home office. Fica essa modalidade nova de estilo de trabalho, principalmente para atividades predominantemente intelectuais, incluindo uma gama de profissionais que atuam desde a área de criatividade, comercial, comunicação, educação, gestão, administrativa etc., nas quais a participação presencial pode ser substituída pela participação a distância.

Para quem pode atuar em home office, surgem novas questões. Qual a condição de vida do profissional? Solteiro ou casado, com filhos ou sem, pequenos ou maiores, trabalham os dois cônjuges em atividade profissional externa ou só um… Quais as condições da moradia: acomoda um espaço privativo ou não. Atividades com os filhos: escola, cursos, passeios… Tem filhos que merecem atenção permanente? Como são distribuídas as tarefas da casa, já que também se trabalha lá. O risco do “jaque”: já que você está aí, não pode fazer isto ou aquilo?… Como as crianças pequenas se adaptam ao ver os pais em casa e não poder permanecer brincando com elas, porque estão trabalhando!?

Para famílias com filhos pequenos, a diversidade de situações é grande, e o home office pode surgir como cavalo de Troia. Os ganhos aparentes no tempo de deslocamentos ficam muito reduzidos quando comparados com as interferências que o trabalho leva para casa. A maioria dos domicílios não tem um lugar privativo adequado. Não é raro associar as tarefas da casa e do trabalho ao longo do dia. As adaptações “provisórias-permanentes”, que misturam documentos com brinquedos, podem levar à irritabilidade e à falta de paciência com o cônjuge e filhos… Não é raro que a fumaça do trabalho profissional permaneça na atmosfera do lar durante as 24 horas do dia, “poluindo” assuntos familiares que possam parecer de menor importância. A proposta não é igual em todos os lares. Exige condições de moradia. Limitar o começo e o término do expediente. Controle emocional. Uma disciplina virtuosa com divisão de tarefas e horários claros, que podem ser surpreendidos por pequenos acidentes de percursos, frequentes em famílias com crianças, e que merecem atenção generosa.

Para muitos, já se tornou uma realidade bem adaptada e proveitosa, que deve levar o profissional a saber valorizar o tempo de “sobra”, em atividades que favoreçam o seu desenvolvimento pessoal, inclusive na doação de parte deste “tempo livre” em atividades que olhem para o próximo, maior participação na família e ajuda aos amigos. Alguns dias de home office na semana são uma alternativa vantajosa em determinadas situações. A proposta que se fortalece na sociedade, porém, está longe de ser considerada um caminho para a maioria.

Saber que, terminado o trabalho do dia, se volta para casa, é um desejo forte em todos os que estiveram longe do lar, e querem estar com os seus em outro clima. Recordo, ainda criança, quando um velho engenheiro, diante da proposta do meu pai para fazer um escritório em casa, disse- -lhe: “O senhor não deve levar serviço para casa. Lá é para estar com a família”. São quase 60 anos desde então. Precisamos nos adaptar aos tempos, mas ainda continua a ser um conselho interessante a ser considerado.

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