Cidade de São Paulo, conhece-te a ti mesma!

No próximo dia 25, a nossa cidade celebrará seu aniversário de 468 anos. Mas, se nos fosse permitido viajar no tempo até aquela manhã de 25 de janeiro de 1554, o que poderíamos observar no então chamado Planalto de Piratininga pareceria, à primeira vista, não guardar relação com a atual megalópole de 12 milhões de habitantes… Veríamos, de fato, um punhado de jovens missionários com suas batinas negras puídas de andar na mata fechada, vindos da costeira Vila de São Vicente a fazer o primeiro ato público de fundação de uma nova Vila: a celebração de uma Santa Missa.

Os religiosos eram da incipiente Companhia de Jesus – recém-fundada menos de 15 anos antes por Santo Inácio –, e haviam renunciado aos confortos da Europa Renascentista para trazer a fé católica aos povos gentios do Novo Mundo. A data escolhida para a fundação da Vila e Colégio não foi fortuita: no calendário litúrgico, celebra-se em 25 de janeiro um evento que mudou a história do Cristianismo e do mundo – a Conversão de São Paulo, o Apóstolo das Gentes. Participando do Santo Sacrifício estava o jovem Irmão José de Anchieta, então com 19 anos, que na flor da mocidade dava ao celebrante as respostas do acólito, ecoando o salmista: “Subirei ao altar do Senhor, do Senhor que me alegra a juventude!”.

A Vila, batizada de São Paulo de Piratininga, foi gradualmente crescendo ao redor do colégio então fundado (que ainda hoje, no atual Pateo do Collegio, conserva algumas das paredes de taipa originais) – mas restaria porventura algum laço de continuidade entre este vilarejo de 1554 e nossa megalópole atual?

Ora, por acaso uma pessoa deixa de ser quem é, ao longo de sua trajetória de vida? Se o ancião assopra as velinhas para comemorar seu aniversário de 80 anos, ele o faz porque enxerga que, apesar dos desenvolvimentos de corpo e caráter por que passou ao longo de sua trajetória de vida, há ali uma identidade humana única e irrepetível, que existe desde o primeiro momento de sua concepção, e que permanece a mesma ao longo do caminho. Também para a nossa São Paulo é assim: quem comemora 468 anos deseja, implicitamente, preservar um nexo de continuidade, um “DNA”, que se estende desde nossos dias até aquele primeiro 25 de janeiro!

E que DNA, que identidade é essa? Em seu célebre Encontro com o mundo da cultura, no Collège des Bernardins de Paris, o Papa Emérito Bento XVI dizia que, para entendermos o monaquismo ocidental, precisamos nos perguntar sobre “a motivação que levava as pessoas a se reunirem nestes lugares: que intenções tinham? Como viveram?”. Apliquemos este raciocínio a nossos jesuítas, e ouviremos o próprio Anchieta rememorando, anos depois:

“A casa de São Paulo de Piratininga, como foi princípio da conversão, assim também o foi dos Colégios do Brasil”. Colégio e Missão! Iluminar as inteligências com a sabedoria humana, e mover os corações com a sabedoria divina: este, e não outro, foi o germe implantado em nossa São Paulo por seus fundadores.

Felizes de nós, se pudermos ainda dizer que as escolas de São Paulo têm por propósito instigar nos alunos o amor pelo bom, pelo belo e pelo verdadeiro, e assim transformar meninos em homens livres! Fe- lizes de nós, se nossos jovens, como aqueles primeiros heróis, tiverem seus corações inflamados pelo amor de Cristo, e assim desejarem doar suas vidas, rebaixando-se em socorro dos mais vulneráveis! Se assim educar seus jovens, nossa São Paulo poderá se defrontar serena com aquela provocação filosófica do templo de Delfos: São Paulo, conhece-te a ti mesma!

guest
0 Comentários
Inline Feedbacks
Veja todos os comentários