Democracia é diálogo

A convivência política não é fácil em nenhuma sociedade, por mais perfeita que possa parecer.

Governos autoritários oprimem seus dissidentes e pouco se preocupam com o bem comum. Mostram-se totalmente injustos para seus opositores, enquanto são justificados e legitimados por seus apoiadores.

Governos democráticos se caracterizam por uma alternância de grupos no poder e numa estrutura legal e normativa que – em tese – respeita os direitos de todos e se orienta para o bem comum. Nem por isso deixa de haver, nas democracias, excluídos e ressentidos que, por motivos justos ou injustos, não se sentem reconhecidos e respeitados na ordem vigente.

Diante dessas dificuldades, o magistério da Igreja apresenta uma inequívoca “simpatia” pelos sistemas democráticos, como diz São João Paulo II, na encíclica Centesimus annus (cf. CA, 46-47). Ao longo desse texto, mostrou como a reconstrução de sociedades democráticas, voltadas à realização do bem comum, foi a melhor opção tanto para a reconstrução da Europa devastada pela Segunda Grande Guerra e pelas ditaduras de direita, quanto para os países que saíram do comunismo, no final do século XX (cf. CA, 19-29).

Tanto o ensinamento de São João Paulo II quanto o de seus sucessores evidencia que uma verdadeira experiência democrática só é possível ancorada numa reta concepção de pessoa, que respeita os direitos humanos, buscando a consecução do bem comum e combatendo a corrupção (cf. CA, 47-48, Sollicitudo rei socialis, SRS, 44).

No entanto, o que fazer quando nos sentimos descontentes com o governo, mal representados por nossos políticos, impotentes diante dos desmandos dos poderosos?

O Papa Francisco, ao visitar o Brasil em 2013, deu uma resposta clara a essa pergunta: “O diálogo construtivo. Entre a indiferença egoísta e o protesto violento, há uma opção sempre possível: o diálogo. O diálogo entre as gerações, o diálogo no povo, porque todos somos povo, a capacidade de dar e receber, permanecendo abertos à verdade […] É impossível imaginar um futuro para a sociedade sem uma vigorosa contribuição das energias morais numa democracia que permaneça fechada na pura lógica ou no mero equilíbrio de representação de interesses constituídos” (Discurso no Encontro com a classe dirigente do Brasil).

O diálogo pode unir os diferentes, que não precisam abdicar de suas posições para encontrar um consenso mínimo que permita a construção do bem comum. Não é um caminho fácil, bem o sabemos. É, porém, o único caminho viável.

Todos os países que hoje gozam de uma qualidade de vida e de um respeito à liberdade e à dignidade dos cidadãos à qual almejamos tiveram que passar por esse caminho de diálogo e consenso. Os atalhos e rupturas institucionais não aceleram essa caminhada. Pelo contrário, atrasam. E mesmo países que parecem à nossa frente nesse percurso também enfrentam seus problemas, pois o bem comum está sempre em construção.

Apesar das dificuldades, o Papa Francisco lembra que “fazer um povo precipitar no desânimo é o epílogo de um perfeito círculo vicioso: assim procede a ditadura invisível dos verdadeiros interesses ocultos, que se apoderaram dos recursos e da capacidade de ter opinião e pensamento próprios” (Fratelli tutti, 75).

“Quem ama e deixou de entender a política como uma mera busca de poder está seguro de que não se perde nenhuma das suas obras feitas com amor, não se perde nenhuma das suas preocupações sinceras com os outros, não se perde nenhum ato de amor a Deus, não se perde nenhuma das suas generosas fadigas, não se perde nenhuma dolorosa paciência” (FT, 195).

Com essa confiança e essa esperança, lancemo-nos com amor na construção de uma democracia sempre melhor para o Brasil.

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